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Os Hermanos

Kirchner: deputado, presidente do Peronismo, primeiro-cavalheiro e secretário-geral da Unasul

 

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Por arielpalacios
Atualização:

Esta é a primeira vez na História do mundo que - simultaneamente - uma chefe de Estado (Cristina Kirchner) tem um cônjuge (Néstor Kirchner) no comando de um organismo internacional (foto da presidência da República)

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Personagem: Néstor Kirchner, ex-presidente argentino, esposo da atual presidente argentina (Cristina Kirchner)

Entidade: União das Nações Sul-americanas (Unasul), que reúne doze países da América do Sul (Peculiaridade: a Argentina ainda não aprovou a criação da Unasul). 

Posto: Secretário-geral da Unasul, cargo de dois anos de mandato, teoricamente de dedicação exclusiva. Isto é, teria que abandonar os cargos de deputado federal e de presidente do partido Justicialista (Peronista). Mas, nesta terça-feira à noite, cinco horas após ter sido designado secretário-geral da Unasul, Kirchner participou de uma sessão da Câmara de Deputados.

Requisitos: Capacidade de consenso para lidar com crises internas da América do Sul e aptidão para representar a região perante governos de outras regiões.

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Sede da Unasul: Quito, capital do Equador.  Sede, pero no mucho, já que Rafael Correa, presidente equatoriano, disse que a sede pode ser transferida provisoriamente para Buenos Aires, para facilitar a vida de Kirchner.

Argumento em defesa de Kirchner: "Ele conhece o continente" (presidente Lula)

Argumento contra Kirchner: "Em vez de integrar, vai desintegrar. Sua cultura é a do confronto" (ex-presidente Duhalde)

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva proclamou seu apoio de forma enfática. "Penso que a designação do companheiro Kirchner na Secretaria-geral da Unasul é uma consolidação" para esta entidade, "já que ele conhece o continente", afirmou. "Ele está 100% apto para ser secretário-geral", arrematou.

GUINESS BOOK - Esta é a primeira vez na História do mundo que - simultaneamente - uma chefe de Estado (Cristina Kirchner) tem um cônjuge (Néstor Kirchner) no comando de um organismo internacional. De quebra, a Argentina, além de ficar no comando da Unasul, também estará na chefia do Mercosul, pois a secretaria-geral do bloco do Cone Sul está desde o ano passado nas mãos do argentino Agustín Colombo Sierra.

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O Uruguai havia sido o principal obstáculo para a aprovação de Kirchner nos últimos dois anos. Por trás da resistência uruguaia à essa designação estava o conflito que o país possui desde 2005 com a Argentina, cujo pivô é a fábrica de celulose Botnia, instalada sobre as margens uruguaias do rio Uruguai, na fronteira dos dois países. Para protestar contra a fábrica, manifestantes argentinos - respaldados por Kirchner - realizam há quatro anos piquetes de forma ininterrupta na fronteira que impedem a livre entrada de mercadorias no Uruguai. No entanto, com o intuito de desativar o conflito, o presidente do Uruguai, José "Pepe" Mujica, afirmou que apoiaria a designação de Kirchner, "apesar do alto custo político" que isso lhe causaria no cenário político interno. 

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

Mas, longe de celebrar a designação de um argentino, a eleição de Kirchner foi criticada intensamente por seus próprios compatriotas, entre eles o ex-presidente provisório Eduardo Duhalde (2002-2003) - um dos defensores da criação da Unasul em seus primórdios em 2004 - que sustentam que o temperamental Kirchner só causará mais problemas dentro da região. "Kirchner não vai integrar a América do Sul...ele é um fator de desintegraçao".

Na terça-feira, o tradicional jornal "la Nación" dedicou seu editorial para analisar a eleição de Kirchner para a Unasul. Em alusão aos vários casos de corrupção dos quais o ex-presidente é suspeito, o jornal afirma que "seria triste que o primeiro presidente da Unasul fosse atingido por um escândalo". Em tom fúnebre, o "La Nación" indica que "a unção do ex-presidente argentino será um réquiem para a Unasul".

Aqui vai um link do jornal La Nación, desta quarta-feira, sobre a polêmica da dedicação exclusiva (ou não) de Kirchner à secretaria, aqui.

O presidente chileno, Sebastián Piñera, que debutou em sua primeira cúpula internacional, apoiou a candidatura de Kirchner, mas foi na contra-mão das tradicionais declarações de intenções sobre "sonhos latino-americanos" das cúpulas regionais ao ressaltar que a região deve estabelecer "metas ambiciosas" para intensificar a integração. "É preciso diferenciar sonhos de projetos. Os sonhos não possuem prazos nem metas. Nós precisamos projetos!".

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Segundo ex-presidente Eduardo Duhalde, Kirchner, será fator de desintegração regional . Mapa que mostra como era a região há um século.

ESTILO K: CONFRONTOS E ALERGIA A PROTOCOLO

"Não cheguei ao governo para ficar indo de cocktail em cocktail". A frase foi disparada em 2004 pelo então presidente Néstor Kirchner para explicar suas costumeiras ausências em recepções a presidentes de outros países, reuniões com empresários, além de cúpulas internacionais. Naquele ano recusou-se a ir à reunião de presidentes em Cusco, no Peru, na qual seria criada a Comunidade Sul-americana de Nações, que em 2008 adquiriria o nome de Unasul.

De lá para cá, Kichner continuou exibindo aversão a todo tipo de convescotes presidenciais. Seus assessores, ao longo destes anos, confessaram em diversas oportunidades: "ele não suporta essas formalidades". Paradoxalmente, Kirchner foi eleito secretário-geral da Unasul para propiciar "mais institucionalidade" à essa organização internacional.

Na lista de vítimas da aversão de Kirchner ao protocolo e boas maneiras esteve a Petrobrás, que em 2004 foi alvo de dois adiamentos da assinatura de um acordo de ampliação de um gasoduto. Carly Fiorina, na época a CEO mundial da Hewlett Packard, esperou 40 minutos sentada em um corredor da Casa Rosada por uma reunião com Kirchner até que foi informada - sem maiores explicações - que o encontro havia sido cancelado.

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Presidentes e empresários foram vítimas do desprezo de Kirchner. O então presidente Vladimir Vladimirovich Putin, ou, ???????? ???????????? ????? (no alfabeto de Nikolái Andréyevich Rimsky-Korsakov e de María Yúrievna Sharápova), esperou por Kirchner inutilmente. A culpa do atraso: um quitute tcheco.

Os reis da Espanha - o país que protagonizou os maiores investimentos estrangeiros na Argentina - também foram alvo de Kirchner, que os deixou esperando duas horas na cidade de Rosario.

O presidente chinês, Hu Jintao, em sua única visita à Argentina foi tratado com desprezo por Kirchner, que, no encontro oficial na Casa Rosada, mostrou desalinho, com direito à paletó desabotoado e mocassins sem lustrar.

O presidente do Vietnã, Tran Duc Lueong, em sua visita à Buenos Aires, ficou esperando Kirchner no jantar oficial (que o próprio Kirchner havia convocado). No entanto, não deu as caras. Seus assessores explicaram que estava doente. Mas, fontes do governo confirmaram que Kirchner havia estado trabalhando no palácio presidencial até altas horas da noite. 

Kirchner também protagonizou um desplante com o então presidente Vladimir Putin. O argentino havia pedido um encontro com russo no aeroporto de Moscou, onde faria uma escala técnica entre Praga e Beijing. No entanto, o avião de Kirchner não apareceu na hora marcada. Putin, depois de esperar, voltou - furioso - para o Kremlin.

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A comitiva argentina, na ocasião, alegou que problemas climáticos haviam atrasado o voo entre Praga e Moscou. Mas, os mapas meteorológicos do dia indicam que o trecho entre a capitais tcheca e russa era um "céu de brigadeiro". Extraoficialmente, fontes do governo admitem que o atraso de Kirchner em Praga foi causado pela degustação de quitutes tchecos em um emblemático restaurante da cidade, que o então presidente argentino insistiu em experimentar.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva também  foi vítimas das repentinas mudanças de humor de Kirchner. Esse foi o caso de uma cúpula de presidentes dos países do Grupo do Rio, realizada no Rio de Janeiro. Kirchner foi esperado para a reunião, à qual só comunicou que faltaria no próprio dia do encerramento. Desde que Kirchner chegou ao poder em 2003, os argentinos denominam essa forma de ser de "estilo K".

PRESIDENTE DE UM CLUBE DO QUAL NÃO É SÓCIO

O cômico Groucho Marx dizia que nunca aceitaria pertencer a clube que o aceitasse de sócio. Charge do genial Al Hirschfeld (1903-2003) que mostra, da esquerda para a direita, CW Fields, Charles Chaplin, Buster Keaton e o citado Groucho.

A Câmara de Deputados da Argentina ainda não aprovou como lei o tratado que estabelece a criação dessa entidade regional. "É como ser presidente de um clube do qual ainda não é sócio", disse um diplomata de um país do Mercosul ao Estado, em alusão à insistência de Kirchner em tornar-se secretário-geral da Unasul.

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Tempo para a aprovação houve de sobra, já que o governo remeteu o tratado de formação da Unasul para ratificação parlamentar em setembro de 2008. Em dezembro daquele ano o Senado argentino aprovou o tratado. Mas, ficou pendente a ratificação da Câmara de Deputados.

Maioria para aprovar o tratado também existiu na maior parte desse período, já que entre setembro de 2008 e dezembro do ano passado o governo da presidente Cristina Kirchner - uma enfática defensora da Unasul - contou com maioria na Câmara de Deputados.

Somente quatro dos doze países da Unasul aprovaram o tratado que a cria.

OCIOSAS - Em dezembro de 2004, quando os presidentes da América do Sul reuniram-se em Cusco, no Peru, para formar a Comunidade Sul-americana de Nações (posteriormente denominada de Unasul), o então presidente Kirchner - que na época não concordava com sua criação, preferiu não participar. Uma semana antes da reunião, Kirchner deixou claro o motivo: "só vou a cúpulas que considero importantes". O chanceler de Kirchner, Rafael Bielsa, arrematou o argumento de seu chefe: "algumas cúpulas são um pouquinho ociosas...".

 DA 'CASA' À 'UNASUL'

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A sigla, no início, tornou-se assunto de debate, já que no Brasil foi "CASA", enquanto que nos outros países adotou-se a designação "CSN". Em abril de 2007 os presidentes da região, com a intenção de mostrar mais integração, decidiram mudar seu nome para "Unasul" ("Unasur", para os países hispano-falantes; "Usan" na Guiana, onde fala-se o inglês e "Uzan" no Suriname, onde o idioma é o holandês).

 A Unasul é composta pelos 12 países da América do Sul: a Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai, Venezuela, Bolívia, Colômbia, Equador, Peru, Chile, Suriname e Guiana (a ex-Guiana Britânica). As únicas exclusões da Unsaul na América do Sul são a Guiana Francesa (departamento de além-mar da França) e as Ilhas Malvinas (administradas pela Grã-Bretanha).

A suposta praticidade da Unasul como organização supranacional criada com a intenção de aprofundar a integração econômica, política e  de defesa da região é constante alvo de críticas por parte de partidos da oposição dos vários governos da região, que consideram que este organismo só acrescenta mais burocracia regional.

O tratado de criação da Unasul estipula que a sede do quartel-general será em Quito, Equador. Por outro lado, a sede do futuro "Parlamento da América do Sul" estará na cidade boliviana de Cochabamba, enquanto que o edifício do "Banco do Sul está, por insistência do presidente Hugo Chávez, em Caracas, Venezuela.

Desde sua criação, a Unasul respaldou o presidente Evo Morales para evitar movimentos autonomistas na Bolívia e suavizou as tensões fronteiriças entre a Colômbia e a Venezuela em 2009.

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Em 2009 "Os Hermanos" recebeu o prêmio de melhor blog do Estadão (prêmio compartilhado com o blogueiro Gustavo Chacra).

Gustavo Chacra (Nova York): http://blogs.estadao.com.br/gustavo-chacra/ 

Patricia Campos Mello (Washington) - http://blogs.estadao.com.br/patricia-campos-mello/ 

Claudia Trevisan (Pequim) - http://blogs.estadao.com.br/claudia-trevisan/

Adriana Carranca (Pelo Mundo) - http://blogs.estadao.com.br/adriana-carranca/ 

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