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Os Hermanos

Videla e sua "Nova Era", o Gato e as torturas e o réquiem pelo pai do rock argentino

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Por arielpalacios
Atualização:

O ex-ditador e general Jorge Rafael Videla volta a causar polêmica: em declarações à imprensa espanhola, afirma que julgamento dos militares envolvidos em crimes durante a ditadura não passa de "vingança". O militar também sustentou que seu golpe, em 1976, deu início a uma "Nova Era" na Argentina.

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Caros comentaristas e leitores, volto hoje à labuta depois de plus-que-merecidas férias! Neste período de tentativa de relax e repouso aconteceu uma saraivada de assuntos na Argentina e região. Alguns deles saíram temporariamente da agenda (o caso dos conflitos comerciais Brasil-Argentina, que logo logo voltarão), outros permanecem diariamente (os crescentes qüiproquós sobre as ilhas Malvinas, a pancadaria desatada da polícia sobre manifestantes, protestos em cidades com mineradoras multinacionais). E alguns marcaram alguns dias, como o caso da morte do roqueiro Alberto "El Flaco" Spinetta.

Nesta quarta-feira, último dia das férias, o general Jorge Rafael Videla, ditador da Argentina entre 1976 e 1981 (a ditadura, com outros generais, durou até 1983), preso há vários anos, condenado à perpétua por crimes contra a Humanidade, causou polêmica ao fazer as primeiras declarações à imprensa desde o fim do regime militar.

Videla, em entrevista à revista espanhola Cambio 16, afirmou que não se arrepende do golpe militar que protagonizou há três décadas e meia e acusa a presidente Cristina Kirchner de procurar "vingança" em vez de "justiça" com o julgamento dos militares envolvidos na ditadura argentina.

"São todos julgamentos políticos", disparou Videla, que nos anos 70 era conhecido como "a pantera cor de rosa", por seu jeito similar de caminhar e a sorte para escapar incólume de atentados. "É parte de uma vingança, dessa revanche, como parte de um castigo coletivo com o qual pretende castigar todas as forças armadas", disse.

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Segundo o ex-ditador, o governo mostra os militares como os "maus" e "responsáveis dos crimes contra a Humanidade", enquanto que - sustenta Videla - os "terroristas" são exibidos como os "bons".

O ex-ditador justificou a necessidade do golpe e da implantação da ditadura militar, indicando que o país estava sob o perigo da "anarquia imediata" e do terrorismo (no entanto, os próprios militares afirmavam meses antes que a guerrilha havia sido debelada). Segundo Videla, com o golpe começava uma "Nova Era" para o país (os generais pretendiam que a ditadura, a princípio, durasse até 1990...mas o fracasso na Guerra das Malvinas precipitou o fim desses planos).

AS INSTITUIÇÕES, SEGUNDO O HOMEM QUE DEU O GOLPE - Videla também disparou contra os senadores e deputados argentinos. Segundo o ex-ditador, o Parlamento (que ele próprio fechou em 1976), "está composto por ambiciosos que temem ficar sem seus postos e se vendem a quem paga mais".

Segundo Videla, a situação institucional atual é "pior" do que na época de Maria Estela Martinez de Perón, mais conhecida como "Isabelita", a presidente que o general depôs no dia 24 de março de 1976.

O ex-ditador, que violou a Carta Magna há quase 36 anos, sustenta que atualmente "as instituições estão mortas" na Argentina.

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Videla, que durante o julgamento das juntas militares em 1985 havia jurado que não haviam ocorrido assassinatos de civis por parte da ditadura, na entrevista admite a existência de 7 mil desaparecidos (número inferior aos 30 mil desaparecidos alegados pelos organismos de defesa dos direitos humanos e dos 10 mil verificados pela Comissão Nacional de Desaparecidos, a Conadep).

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Na entrevista Videla coloca em problemas a Igreja Católica ao afirmar que o clero manteve uma relação "cordial" e "muito sincera" com o regime militar. "Nós tínhamos capelães militares dando assistência para a gente. Nunca foi quebrada essa relação de colaboração e amizade".

Durante a ditadura a Igreja esteve intensamente alinhada com os militares. Padres católicos presenciaram torturas realizadas nos centros clandestinos de detenção e pressionaram os prisioneiros a delatar, com o encobrimento da confissão, o nome de militantes políticos que haviam conseguido escapar. Um dos clérigos envolvidos nas ações do regime militar, o capelão Christian Von Wernich, além de presenciar, protagonizou torturas nos centros clandestinos na província de Buenos Aires. Em 2007 Von Wernich foi condenado à prisão perpétua por 34 sequestros, 31 casos de torturas e sete homicídios.

DITADURA ARGENTINA FOI FRACASSO MILITAR E ECONÔMICO - No dia 24 de março de 1976 uma junta militar derrubou a presidente civil Isabelita Perón. A ditadura, que duraria sete anos - considerada a mais sanguinária da História da América do Sul - teria um saldo estimado pelas organizações de defesa dos direitos humanos de 30 mil civis assassinados nos centros clandestinos de detenção. A ditadura também sequestrou 500 bebês, dos quais somente 105 recuperaram sua identidade até hoje.

O saldo econômico do regime também foi desastroso. Em sete anos de ditadura a dívida externa disparou de US$ 8 bilhões para US$ 45 bilhões. A inflação aumentou de 182% anual para 343%. Além disso, a pobreza cresceu de 5% da população para 28%. De quebra, a ditadura implantou uma ciranda financeira que intensificou o caos econômico.

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Na área militar a ditadura implementou uma corrida armamentista com o Chile em 1978. Os dois países, que disputavam o canal de Beagle, quase entraram em guerra. A invasão argentina foi detida graças à mediação do papa João Paulo II.

Quatro anos depois, o ditador Leopoldo Galtieri ordenou uma improvisada invasão das ilhas Malvinas, sob controle britânico, desafiando a primeira-ministra Margareth Thatcher a enviar tropas. A guerra terminou com a estrepitosa derrota da ditadura em dois meses e meio.

"Excelente goleiro!", afirmam seus colegas e admiradores. "Mas, péssima e sórdida pessoa", complementam.

GATO E TORTURAS - A Justiça da província de Santa Fe declarou que Edgardo "El Gato" Andrada não será levado a julgamento pela suposta participação do assassinato de civis durante a ditadura argentina. Segundo o juiz Carlos Villafuerte Ruzzo, não existiam provas suficientes para levar Andrada ao banco dos réus no momento.

Andrada - que morou no Brasil entre 1969 e 1976 - tem um passado peculiar: no dia 19 de novembro de 1969 teve o prestígio de levar o gol número 1.000 de Pelé como goleiro do Vasco da Gama, onde trabalhava na época. Na Argentina Andrada também é recordado, mas por questões pouco esportivas: ele colaborou ativamente com a Ditadura Militar. E, segundo diversas denúncias é um dos responsáveis pelo sequestro de duas pessoas em maio de 1983, poucos meses antes que a Ditadura terminasse.

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Andrada, segundo as denúncias, trabalhava para o serviço de inteligência do Exército na cidade de Rosario, e integrava as "patotas" (gíria que na Argentina refere-se a grupos de caras violentos, jagunços, que capturavam, torturavam e assassinavam civis que se opunham ao regime militar).

Ao longo dos últimos três anos Andrada foi processado na Justiça pelo sequestro realizado em um bar em pleno centro da cidade de Rosário. Os dois civis apareceram mortos dois dias depois. Na época, o governo militar anunciou que as duas pessoas haviam sido mortas em um combate com forças do exército. Mas, a autópsia indicou que eles haviam sido espancados, torturados com choques elétricos e posteriormente baleados a queima-roupa.

                                     Andrada era chamado de "El Gato", por seu jeito de "felino"

Andrada nega os crimes. Ele admite que estava dentro da estrutura do Exército, mas, misteriosamente, nega-se a explicar qual era seu trabalho específico.

Os advogados dos parentes dos civis mortos afirmam que vão recorrer na Justiça, de forma a reverter a decisão do juiz Ruzzo.

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Além de Andrada, outros ex-jogadores e técnicos também são suspeitos de terem participado do sequestro de civis. Em vários desses casos as vítimas eram seus próprios colegas jogadores, que foram detidos e torturados por criticar a ditadura militar.

Uma dessas histórias, a do jogador Claudio Tamburrini, virou filme, o "Crônica de uma fuga", do diretor Adrián Caetano.

Tamburrini foi detido e enviado ao centro de torturas "Mansão Serré". Mas, depois de seis meses preso ali, conseguiu fugir com outros três prisioneiros. É o único caso de sucesso de uma fuga de um centro de tortura da Ditadura.

Luis Alberto Spinetta, a.k.a. "El Flaco". Ou, "pai do rock argentino".

DA GUITARRA À HARPA, UM ÍCONE PARTE - Um dos expoentes do rock nacional, Luis Alberto Spinetta, morreu em sua casa, rodeado de seus seres queridos há poucos dias, na quarta-feira dia 8 de fevereiro. "El Flaco" (O Magro), como era chamado carinhosamente, tinha câncer de pulmão.

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Spinetta foi integrante da banda Almendra, que junto com Manal e Los Gatos, integram o trio de grupos fundadores do rock nacional argentino. Ele também participou da banda Pescado Rabioso, entre outras. Spinetta é considerado o "pai do rock argentino".

Ao longo de sua carreira Spinetta cantou com outros pesos-pesados do rock nativo, como Charly García e Fito Paez.

Em junho passado Spinetta fez sua última apresentação, no Chile. Uma semana depois soube que tinha câncer.

Os admiradores de Spinetta afirmam que ele foi para o Paraíso dos roqueiros. Portanto, sustentam, ele largou a guitarra e passou para a harpa.

"Obrigado, gosto muito de vocês" foi a frase que "El Flaco" destinou a seus fãs em seu último comunicado público, pouco tempo antes de morrer.

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Aqui, a modo de réquiem, algumas de suas obras:

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E aqui, uma composição de um colega de Spinetta, Charly García, que compôs "Canción para mi muerte" em 1972.

Os especialistas a definem como uma "balada com um touch tangueiro, pessimista e nostálgico" que retoma o espírito de "Volver", de Carlos Gardel.

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Em 2009 "Os Hermanos" recebeu o prêmio de melhor blog do Estadão (prêmio compartilhado com o blogueiro Gustavo Chacra).

 
 

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