Democratas tentam conter migração do voto branco da Pensilvânia para Trump

Estado integrante do ‘cinturão da ferrugem’, região que empobreceu e viu milhares de empregos industriais desaparecerem a partir dos anos 80, viu 85 mil eleitores mudarem de filiação partidária e bandearem-se para o lado dos republicanos

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Por Redação Internacional
Atualização:

Cláudia TrevisanENVIADA ESPECIAL / SCRANTON, EUA

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Branco, sem educação superior e convencido de que a classe média a que pertence está encolhendo, Mike Sasso abandonou sua lealdade de duas décadas ao Partido Democrata e se registrou como republicano para votar em Donald Trump nas primárias da Pensilvânia. Eleitores de perfil semelhante são a principal aposta do bilionário para vencer em um Estado que optou por democratas nas últimas seis disputas presidenciais.

Mais conservadores de que os liberais de Nova York ou da Califórnia, eles são conhecidos como "democratas reaganianos", uma referência à onda de deserções que os levaram a votar em Ronald Reagan nos anos 80. Desde o início deste ano, 85 mil eleitores da Pensilvânia mudaram sua filiação partidária de democrata para republicana, quase o dobro dos 31 mil que fizeram o movimento contrário.

Sinalização de fábrica abandonada em Scranton, na Pensilvânia: votos no colégio eleitoral do Estado serão decisivos na eleição de novembro. Foto: REUTERS/Brian Snyder

O número não é significativo quando comparado ao total de 8,3 milhões de eleitores registrados no Estado, mas indica que o entusiasmo em relação a Trump está em alta. Em tese, a Pensilvânia teria um perfil favorável ao bilionário: é um Estado mais branco do que a média americana e habitado por trabalhadores que sofreram o impacto do processo de desindustrialização experimentado pelos EUA nas últimas décadas.

Ao lado de Ohio, Michigan, Illinois e Indiana, a Pensilvânia integra o chamado "cinturão da ferrugem", que viu milhares de empregos industriais desaparecerem a partir dos anos 80 em decorrência da automação e do processo de globalização.

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No fim de julho, pesquisas indicavam que Trump poderia levar a Pensilvânia de volta para os republicanos, depois de duas décadas e meia de domínio democrata. Projeções do site FiveThirtyEight davam ao bilionário uma chance de 47% de conquistar o Estado em novembro, cinco pontos porcentuais a menos que os 53% atribuídos à democrata Hillary Clinton.

No entanto, os erros cometidos por Trump desde sua consagração na convenção republicana, no dia 21 de julho, mudaram esse cenário: a probabilidade agora é de 87% a 13% em favor da ex-secretária de Estado.

O movimento é semelhante ao ocorrido nacionalmente. No fim de julho, o bilionário tinha 50% de chance de vencer a eleição, segundo o FiveThirtyEight. O porcentual agora é de 14%. Com 20 cadeiras no Colégio Eleitoral, a Pensilvânia é um Estado crucial para a obtenção dos 270 votos necessários para suceder Barack Obama na Casa Branca.

"Se você faz parte da classe média, é muito difícil ascender e há um grande risco de retroceder", disse o ex-democrata Sasso, que se aposentou há cinco anos depois de trabalhar três décadas e meia como policial. Na segunda-feira à noite, ele cumpria o ritual semanal de jogar bocha com os amigos em Old Forge, uma cidade de colonização italiana ao lado de Scranton, centro urbano da região.

Sasso não gostou dos ataques de Trump aos pais muçulmanos de um soldado dos EUA morto no Iraque nem de sua afirmação de que Obama é fundador do Estado Islâmico. Ainda assim, mantém a decisão de votar no candidato.

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Dono de uma pequena empresa de seguros, Tony Dibileo é outro democrata histórico que abraçou o Partido Republicano de Trump. "Nós elegemos políticos tradicionais para a presidência há 240 anos. Está na hora de darmos um chacoalhão", observou Dibileo, enquanto esperava a vez de seu time no jogo de bocha.

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Disputa. O encanador Brock Lameo integra a legião de eleitores que não tinha interesse em política e foi atraída para a disputa presidencial pelo fenômeno Trump. "Os democratas não gostam dele e os republicanos não gostam dele. É o meu tipo de cara."

No entanto, as controvérsias em que o bilionário se envolveu afastaram muitos de seus potenciais seguidores na Pensilvânia. Ferroviário aposentado, Leo McLane disse que Trump conquistou simpatizantes com suas propostas econômicas populistas e houve um momento em que parecia possível colocar o Estado na coluna republicana.

"As pessoas estão cheias de Washington e a classe média está diminuindo", observou. "Eu tenho sorte de ter uma boa aposentadoria, mas não há mais empregos como o que eu tinha." Ainda assim, McLane manterá a lealdade ao Partido Democrata e votará em Hillary. "Trump matou suas próprias chances."

O mecânico Joe Delasandro sempre votou no Partido Republicano, por considerar as políticas da legenda mais "fortes" em relação à defesa e à política externa. No entanto, ele não votará em Trump. "Ele é um canhão descontrolado e pode começar uma guerra", afirmou durante espera na fila para o almoço em uma cozinha comunitária de Scranton.

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Homens brancos sem educação superior, como Delasandro, são o principal pilar da candidatura de Trump, que enfrenta dificuldades na conquista do voto feminino, de minorias e de eleitores que frequentaram as universidades. A família de Gilbert Ball é um exemplo da divisão de gênero que marca a atual disputa pela Casa Branca: ele votará no bilionário republicano, enquanto sua mulher, Diane, apoiará Hillary.

Ball também reflete os sentimentos contraditórios despertados pelo estilo belicoso de Trump. Aposentado depois de trabalhar por 52 anos em uma fábrica de rádios, ele não gostou das controvérsias recentes de Trump. Apesar disso, não se entusiasma com as tentativas do candidato de ser disciplinado e ler seus discursos em um teleprompter. "Quando ele faz isso, ele não parece ser ele."

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