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Em ano mais quente da história, Trump procura maneiras de tirar EUA de acordo climático

Enquanto Organização Meteorológica Mundial (OMM) alerta para recorde de temperatura no planeta pelo 3º ano seguido, presidente eleito dos EUA tenta romper acordo climático de Paris antes do prazo legal

Por Redação Internacional
Atualização:

Jamil ChadeCORRESPONDENTE / GENEBRA

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Enquanto o presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, procura maneiras rápidas de retirar seu país do Acordo de Paris - uma iniciativa global de combate à mudança climática -, de acordo com informações de uma fonte de sua equipe de transição, a ONU informou nesta segunda-feira, 14, que 2016 será o ano mais quente da história, quebrando pelo terceiro ano consecutivo o recorde de temperatura no planeta. No Brasil, a seca prolongada em algumas áreas é tida pela entidade como uma das provas das mudanças climáticas no mundo.

Com o novo recorde registrado neste ano, a entidade alerta que 16 dos 17 anos mais quentes registrados no planeta ocorreram no século 21. "Mais um ano e mais um recorde", alertou o secretário-geral da Organização Meteorológica Mundial, Petteri Taalas.

Temperaturas acima da média causam inundações em Miami, na Flórida (Joe Raedle/Getty Images/AFP) 

Os dados foram publicados no momento em que mais de 190 delegações estão no Marrocos negociando detalhes sobre o acordo climático, processo ofuscado pela vitória nos EUA de Donald Trump. O presidente eleito chegou a dizer em sua campanha eleitoral que o aquecimento global era uma "conspiração da China" e prometeu forçar uma saída dos EUA do acordo, assinado no ano passado em Paris.

Entre janeiro e setembro, a temperatura média global ficou 0,88 graus Celsius acima da média registrada entre 1961 e 1990. O patamar significa um incremento de 0,11 graus em relação ao recorde atual, de 2015. A nova temperatura média ainda seria 1,2 grau Celsius acima da média do planeta na era pré-industrial.

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Ainda que o ano não tenha terminado, os especialistas apontam que as últimas semanas terão de ser as mais frias do século 21 para evitar que o novo recorde seja batido. Para cientistas da Organização Meteorológica Mundial (OMM), a alta registrada em 2016 não é uma surpresa. A cada década, a temperatura do planeta vem registrando um aumento que varia entre 0,10 graus e 0,15 graus. Mas, desde 2011, o que se observa é um aceleramento dessa tendência. No caso de 2016, o impacto foi ampliado pelo fenômeno do El Niño.

Segundo os dados da OMM, as elevadas temperaturas foram registradas em todos os continentes, mas foram mais acentuadas no Hemisfério Norte. Na Rússia, territórios próximos ao Ártico tiveram um verão com até sete graus acima da média. No Alasca, o ano é o mais quente, superando em um grau o antigo recorde. Na Ásia, o continente também registra seu ano mais quente.

Nos oceanos, a temperatura também é recorde, com impactos severos para barreiras de corais. As coberturas de gelo no Ártico e na Antártica estão abaixo da média.

EUA. Os conselheiros de Trump estão analisando formas de contornar um procedimento que teoricamente levaria quatro anos para abandonar o pacto, segundo a fonte, que trabalha com a equipe de transição a cargo de energia internacional e política climática. "Foi uma irresponsabilidade o Acordo de Paris entrar em vigor antes da eleição", disse a fonte à Reuters.

O pacto parisiense conquistou endosso suficiente para ser colocado em prática no dia 4 de novembro, quatro dias antes da votação nos EUA. No domingo, o secretário de Estado dos EUA, John Kerry, disse na Nova Zelândia que o governo Obama fará tudo que puder para implementar o acordo antes de Trump tomar posse.

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Em seu Artigo 28, o acordo diz que qualquer país que queira se retirar depois de ter assinado precisa esperar quatro anos. Em teoria, a data mais próxima para isso seria 4 de novembro de 2020, aproximadamente na época da próxima eleição presidencial americana.

A fonte disse que o futuro governo Trump está pesando alternativas para acelerar o rompimento: enviar uma carta retirando o país da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC, na sigla em inglês) de 1992, tratado que deu origem ao Acordo de Paris; encerrar o envolvimento dos EUA com ambos dentro de um ano; ou emitir uma ordem presidencial simplesmente apagando a assinatura do país do acordo firmado na capital da França.

Sair do UNFCCC causaria polêmica, em parte porque ele foi assinado pelo ex-presidente republicano George H. Bush em 1992 e aprovado pelo Senado.

Donald Trump afirmou durante campanha que aquecimento global é uma 'invenção da China' (AFP PHOTO / JOHANNES EISELE) 

Seca. Segundo a ONU, uma das consequências desse recorde tem sido períodos de seca acima da média. Isso foi registrado no Leste da África e, especialmente, no sertão no Brasil.

A mudança climática também significou chuvas acima do normal em outras regiões. Na bacia do Rio Yangtze, na China, os registrou apontam para as taxas mais chuvosas em um século, 30% acima da média anual. As inundações geraram mais de 300 mortes apenas em 2016, com US$ 15 bilhões em perdas.

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As enchentes também afetaram a Europa, com Paris registrando em junho sua pior inundação em 30 anos. O Rio Níger, na África, observou seu maior volume de água em 50 anos, contrastando com uma seca de proporções inéditas no Sahel.

"Por conta das mudanças climáticas, o impacto de eventos extremos tem aumentado", alertou Taalas. "Enchentes ou ondas de calor que aconteciam uma vez em cada geração agora são regulares", disse. No Haiti, o furacão Matthew, assim como ondas de calor na Tailândia, África do Sul e no Canadá seriam também provas disso.

De acordo com a ONU, 19 milhões de pessoas foram obrigadas a deixar suas casas e cidades em razão de fenômenos climáticos ou naturais. Esse número é duas vezes maior que as retiradas causadas por conflitos ou pela violência armada.

Emissões. O que também preocupa a entidade é que, mesmo com um acordo global, os dados mostram que a concentração de gases de efeito estufa nunca atingiu proporções como as atuais. Em 2015, a concentração de CO2 e outros elementos bateu um novo recorde. Para a ONU, essa tendência vai deixar o mundo "mais perigoso".

Segundo os cálculos, a concentração de CO2 atingiu pela primeira vez, em 2015, a marca simbólica de 400 partes por um milhão (ppm) e "continua a disparar em 2016". A taxa já havia sido alcançada em algumas partes do mundo em 2015, "mas nunca numa dimensão mundial durante um ano inteiro". Os estudos também revelam que a concentração de CO2 permanecerão "acima de 400 ppm durante todo o ano de 2016 e não serão reduzidas para baixo desse nível durante muitas gerações".

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Segundo a OMM, houve um incremento de 37% do efeito de aquecimento do clima entre 1990 e 2015. Isso foi causado pela longa duração e acumulação de gases como CO2, metano (CH4) e N2O gerados por atividades industriais, agricultura e residências.

"O ano de 2015 inaugurou uma nova era de otimismo e de ação pelo clima com o acordo sobre mudanças climáticas, alcançado em Paris", disse Taalas. "Mas também fará história por haver marcado uma nova era climática, nas quais a concentração de gases alcançaram níveis sem precedentes." / COM REUTERS

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