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Trump não entende a política externa dos EUA, diz especialista

Para Renee Buhr, professora de relações internacionais na Universidade de St. Thomas, nos EUA, o magnata pode mudar paradigmas históricos e colocar a segurança do país em risco

Por Redação Internacional
Atualização:

 

Vinicius Neder* ST. PAUL, EUA

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Ao longo da campanha, o candidato republicano, Donald Trump, propôs construir um muro na fronteira com o México, sugeriu a elevação de tarifas de importação, garantiu que acabaria com o Estado Islâmico e criticou a participação americana na Otan. Para Renee Buhr, professora de relações internacionais na Universidade de St. Thomas, em Minnesota, as propostas chamam atenção para um tema que passa quase ignorado nas eleições americanas: a política externa. A seguir, trechos da entrevista com Renee.

Qual a lógica por trás da política externa de Trump? É possível que Trump esteja tomando essas posições porque essa é sua opinião e ele não tem vontade de entender a política externa americana. É comum termos candidatos que não sabem nada sobre política externa, mas estamos acostumados com candidatos que queiram aprender. Trump não parece querer se concentrar nesses assuntos. Então, pode ser que ele quebre um paradigma por não entender do que se trata a política externa.

O candidato republicano, Donald Trump, em New Hampshire. Foto: Scott Eisen/AFP

Pode ser algo deliberado? A história mostra que, antes da 2.ª Guerra, a política externa americana era dominada pelo isolacionismo. Desde então, o consenso é que os EUA devem intervir sempre que necessário, porque a insegurança global é perigosa. Os americanos aprenderam a dizer que ser isolacionista é ruim. Quando questionados sobre isso em pesquisas, eles dizem não. Mas, se você começa a fazer perguntas mais detalhadas, os sinais de isolacionismo aparecem.

Há adesão às ideias de Trump? Sim, existem seguidores. Pode ser que haja mais apoio a uma posição isolacionista entre os americanos do que imaginávamos. Tipicamente, republicanos estão à direita do espectro político e numa posição intervencionista. Trump parece estar se colocando mais ainda à direita e numa posição isolacionista. Há um espaço aberto aí e a questão é quantos eleitores estão nessa posição.

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As trocas no comando da campanha de Trump mudam algo nessa estratégia? A troca foi estranha. Paul Manafort (ex-chefe da campanha, que renunciou na sexta-feira) deveria tentar acalmar a retórica de Trump para torná-lo mais elegível. Essa é a sua especialidade. Ele deveria segurar Trump, mas não conseguiu. Agora, trouxeram (Stephen) Bannon (diretor do site conservador Breitbart News), que vai deixá-lo livre. Não creio que Manafort tenha feito muito para segurar Trump. Não acho que isso fará muita diferença. Trump tem falado o que quer de qualquer forma.

A revelação de conexões entre a campanha e financiadores russos pode tirar votos? Os americanos não conseguem achar a Ucrânia no mapa. E as declarações de Trump variam de um extremo ao outro. É difícil alguém manter o foco numa coisa por tanto tempo. A falta de conhecimento sobre a Ucrânia e de entendimento sobre o que isso tem a ver com a segurança dos EUA evitarão que a eleição seja afetada.

Qual o impacto da vitória dele na política externa dos EUA? São várias dimensões, já que a política externa americana tem tentáculos por toda a parte. Muitas das regras que governam nossa economia, segurança, diplomacia, são forjadas no compromisso com organizações internacionais criadas após a 2.ª Guerra. Elas têm uma estrutura com regras compartilhadas. Se os EUA perderem sua primazia, o próximo país a assumir o posto deve ser um país autoritário, como a China. Essas estruturas se manteriam juntas, com as mesmas regras, evitando um choque na economia e na diplomacia? Essas estruturas poderiam ser muito vulneráveis a Trump, tanto quanto seriam à China.

Há algum outro risco? A corrida armamentista. A defesa da Coreia do Sul depende de haver tropas americanas no Japão. Trump parece não entender isso. Se ele tirar as tropas do Leste da Ásia, poderá haver incentivos para corrida armamentista entre China e Japão. E a Coreia acabaria numa posição desfavorável, porque ela desconfia do Japão em razão da 2.ª Guerra.

E no Oriente Médio? No Oriente Médio, Trump realmente parece pensar que é fácil de lidar com o Estado Islâmico apenas incendiando a área. Nenhum desses problemas é fácil de resolver. Não fazemos aliados matando um grande número de pessoas. O problema seria excesso de intervenção no Oriente Médio e falta de intervenção em outras áreas, como a Ásia. Eu me preocupo com o fato de os militares se oporem a Trump. Um bom número já disse que não seguirá ordens dele. Para onde iríamos a partir daí? Não sei, nunca tivemos uma crise nesse nível nas relações entre civis e militares. *O REPÓRTER DO 'ESTADO' VIAJA COMO BOLSISTA DO WORLD PRESS INSTITUTE

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