Nos últimos anos, o mundo islâmico estava dividido em quatro grupos no Oriente Médio. 1) o do Irã, formado pelo regime de Teerã, Bashar al Assad, Hezbollah e Iraque; 2) o da Arábia Saudita, formado pelos países do Golfo mais o Egito; 3) o do Qatar, liderado por Doha e com a presença da Irmandade e do Hamas, além de apoio retórico da Turquia; 4) e o do ISIS (Grupo Estado Islâmico ou Daesh). Todos estes grupos são inimigos ou ao menos rivais entre si, embora em alguns casos atuem em coordenação.
O Hamas estava rompido com o grupo do Irã (1) desde quando traiu Assad e decidiu apoiar os rebeldes sírios no início da guerra civil em 2011. A Arábia Saudita, os Emirados Árabes e o Egito (2), no seu combate à Irmandade, decidiram também isolar o Hamas e se aproximar de Israel. O ISIS, por sua vez, enxerga o Hamas como um rival e ligado ao islã político da Irmandade e não ao ideal de estabelecer um califado islâmico.
Havia sobrado, para o Hamas, uma enfraquecida Irmandade Muçulmana, colocada na clandestinidade no Egito e com todos os seus líderes presos depois da queda de Mohammad Morsi, o Qatar e a Turquia. E, mesmo assim, no caso do Qatar, financeiramente, mas jamais militarmente. No da Turquia, apenas retórico do ex-premiê e agora presidente Recep Tayyp Erdogan - o Exército turco possui boas relações com Israel e integra a OTAN.
O Qatar, porém, optou na semana passada por restabelecer relações com a Arábia Saudita. O país desistiu de levar adiante uma política externa independente implementada pelo ex-emir xeque Hamad bin Khalifa al Tani. Seu filho e novo emir, xeque Tamim Hamad bin Khalifa al al Tani, tem uma preocupação maior com a imagem do Qatar no exterior, querendo manter a Copa do Mundo de 2022 como prioridade, além de difundir a imagem de Doha como centro comercial e cosmopolita no golfo, rivalizando com Dubai.
Sem o Qatar e com a Irmandade em colapso, não sobrará ninguém para ajudar oHamas. Alguns falam de uma reaproximação com o Irã. Mas o regime de Teerã possui outras prioridades e problemas - negociações com os EUA e combate ao ISIS na Síria e no Iraque. Sem dúvida, braços das Guardas Revolucionárias mantêm contatos com os grupos palestinos. Mas a preferência será por armar Assad, o Iraque e o Hezbollah.
O problema é que este enfraquecimento do Hamas pode levar tanto a uma moderação como a uma radicalização do grupo. O certo, porém, é que o Qatar passou a integrar a aliança dos países árabes com os mesmos interesses geopolíticos de Israel. Nunca os israelenses tiveram tantos amigos entre seus vizinhos.
A Turquia, por sua vez, evitará atritos com a Arábia Saudita ao mesmo tempo que seguirá com sua boa relação bilateral com o Irã. O apoio ao Hamas será, como sempre, por meio de discursos inflamados de Erdogan. Mas não irá além disso. Israel e Turquia seguirão com a sua aliança militar.
Obs. Texto originalmente publicado na newsletter Rua Judaica
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Guga Chacra, comentarista de política internacional do Estadão e do programa Globo News Em Pauta em Nova York, é mestre em Relações Internacionais pela Universidade Columbia. Já foi correspondente do jornal O Estado de S. Paulo no Oriente Médio e em NY. No passado, trabalhou como correspondente da Folha em Buenos Aires
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