Alguns gritam agora que "Trump deveria interferir na Síria e o ataque químico é culpa dele", mas o presidente americano não realizou a ação de ontem em Idlib e deixou claro que não se envolverá na Guerra da Síria (em post ontem comento sobre o ataque especificamente e sobre a culpa ou não de Assad). "Ah, mas Trump deu a entender que a permanência Bashar al Assad no poder não é prioridade dele". E não deve ser mesmo.
O que estas pessoas defendem? Defendem que os EUA enviem centenas de milhares de militares para derrubar Assad, gastem trilhões e permaneçam na Síria por anos para tentar reconstruir o país, como nas fracassadas intervenções no Iraque e no Afeganistão? Ou apenas derrubem Assad e larguem o país como na fracassada intervenção na Líbia contra Muamar Kadafi? Estas pessoas defendem que Trump apoie os jihadistas da oposição síria, muitas vezes ligados à Al Qaeda e responsáveis por atrocidades?
A Guerra da Síria envolve um regime laico sanguinário contra uma oposição jihadista e sanguinária. Além deles, há ainda os grupos curdos e o ISIS, também conhecido como Grupo Estado Islâmico ou Daesh. Assad é péssimo, mas tem capacidade de estabilizar as principais partes do país, abrindo espaço para o foco se concentrar no combate ao ISIS.
E como seria esta operação para derrubar Assad, como queria Hillary com "sua zona de exclusão aérea" e seu patético histórico na intervenção na Líbia? Bom, primeiro teriam de enfrentar uma guerra contra as forças sírias, as russas, as iranianas, o Hezbollah e mais dezenas de milícias pró-governo. Depois, caso obtenham sucesso, verão as forças sírias se pulverizarem em várias milícias com armamentos pesados. Por último, a chance de jihadistas radicais ou mesmo do ISIS se fortalecerem é enorme. A Síria não vai se transformar no Canadá. Mas este é tema para outro post.
E Obama? Obama, basicamente, agia como Trump, apesar da retórica um pouco mais anti-Assad. No começo, até caiu um pouco no conto de Hillary e armou opositores, além de ter dado aquele ultimato bizarro contra o líder sírio. Depois, evoluiu e percebeu que a oposição a Assad, inicialmente legítima, se tornou jihadista. Sua estratégia, corretamente, passou a ser a de lutar contra o ISIS. Trump deve seguir na mesma linha. E, sim, devem continuar condenando as ações de Assad, sem necessariamente defender a queda dele.
Guga Chacra, blogueiro de política internacional do Estadão e comentarista do programa Globo News Em Pauta em Nova York, é mestre em Relações Internacionais pela Universidade Columbia. Já foi correspondente do jornal O Estado de S. Paulo no Oriente Médio e em NY. No passado, trabalhou como correspondente da Folha em Buenos Aires