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Alerta populista

Eleições na República Checa mostram o avanço fulgurante de partidos da direita anti-UE

Por Gilles Lapouge
Atualização:

Os senhores de Bruxelas não conseguem fazer andar no mesmo passo os 28 cavalos da carruagem europeia. Há pouco mais de um ano, em junho de 2016, o cavalo britânico – um dos mais belos e mais poderosos da tropa –, decidiu se separar do comboio num divórcio que ficou conhecido como Brexit. Em seguida, houve eleições em vários países da UE: primeiro na França, onde o inesperado vencedor, Emmanuel Macron, declarou-se apaixonadamente ligado ao bloco. Evitou-se assim o pior, a vitória da populista da extremista Marine Le Pen. Vergonhosamente derrotada, ela vai lamber por um bom tempo as feridas do fracasso. 

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União contra o abuso

Mais tarde, a infeliz UE entraria novamente em alerta. Um de seus grandes países, a Espanha, viu-se ameaçado de se partir ao meio, pois sua província mais rica, a Catalunha, exigia independência. Não houve, nesse caso, ameaça direta à UE, já que as duas partes, Espanha e Catalunha, se declaram ligadas ao bloco. O perigo é outro. A Espanha, um dos sustentáculos da UE, corre o risco de mergulhar no caos.

Pela mesma época, em 15 de outubro, uma nova inquietação aflorava. As eleições na Áustria, país próspero, situado no coração do continente, tiveram como vencedores um partido conservador, quase neonazista, e um partido antieuropeu. 

Hoje, soa novamente o alarme. As eleições na República Checa mostram o avanço fulgurante de partidos da direita anti-UE. Os populistas acabam de demolir mais uma parte do edifício europeu. Como a vizinha Áustria, a República Checa é um país muito avançado, dotado de uma estrutura industrial antiga e forte e de uma economia saudável. Portanto, a vitória dos populistas gera incertezas. 

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O vitorioso é o chefe do partido Aliança dos Cidadãos Descontentes (ANO), Andrej Babis, um industrial bilionário. O que pensa ele da UE? Difícil dizer. Às vezes, vocifera contra a zona do euro, considerando-a apenas “um novo meio de Bruxelas meter o nariz nos negócios alheios”. Outras vezes, afirma que não pretende sair da UE. Mas seu passado preocupa. No tempo da URSS, foi membro do Partido Comunista e colaborador dos órgãos de segurança, o que dá calafrios. Mais tarde, entrou na política e se tornou ministro das Finanças, enquanto adquiria o principal grupo de mídia do país.

Babis teve uma vitória clara, com 29,7% dos votos. Mas, como não fez maioria, precisará se aliar a outros partidos para governar. Quais? Dois se destacam: o Partido Pirata, que teve 10,8% dos votos e se apresenta como “partido antissistema”, falando aos jovens insatisfeitos; e o Partido Social-Democrata (SPD), dirigido por um checo-japonês, Tomio Okamura, declaradamente xenófobo e antieuropeu, que ficou com 10,6% dos votos. Em seguida, vem o Partido Comunista (7,8% dos votos), que é oficialmente anti-UE e anti-Otan.

Babis luta para tranquilizar Bruxelas. Por um lado, porque no passado ele nunca escondeu sua desconfiança na construção europeia, que visaria “apenas a retirar dos membros da UE parte de sua soberania”. Por outro, porque seus possíveis aliados são ainda mais xenófobos e populistas que ele. Um partidário de Babis disse que ele não se aliará nem aos comunistas nem a Okamura – que, segundo a fonte, não tem outro projeto senão o ódio aos migrantes. Ótimo. Resta saber com quem ele governará.

Um último ponto: a República Checa faz parte do Grupo de Visegrad, que reúne quatro países do Leste Europeu – Polônia, Hungria, República Checa e Eslováquia. Esse grupo é claramente antieuropeu, principalmente no caso de poloneses e húngaros, que flertam com o fascismo. 

Até aqui, a República Checa é, no Grupo de Visegrad, o único aliado estável de Bruxelas e das democracias. Se agora, após as eleições, aderir às posições radicais dos húngaros de Viktor Orban e dos poloneses, haverá uma ruptura entre a Europa Ocidental e a Oriental. E a Áustria, na junção dessas duas Europas, corre o risco de ser tragada na vertigem./ TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ

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É CORRESPONDENTE EM PARIS