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Análise: Eleição venezuelana é uma péssima notícia para a democracia

Antecipação do pleito antes de um acordo com a oposição encerra chance de uma votação legítima

Por Francisco Toro
Atualização:

A notícia de que a Venezuela realizará uma eleição presidencial até o fim de abril trouxe desânimo para os ativistas da democracia no país. Você pode ter boas razões para considerar a frase paradoxal. Mas, se fizer isso, é sinal de que não entende a Venezuela. Por quê? Porque o anúncio foi unilateral. Como tal, colocou um fim brutal em cuidadosa dança diplomática que poderia produzir uma eleição legítima. 

Nicolás Maduro anunciou candidatura à presidência e pediu que trabalhadores se comprometam por escrito a votar nele Foto: Miraflores Palace/Handout via REUTERS

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Nos três últimos meses, governo e oposição negociaram na República Dominicana garantias mínimas para a votação. Apoiados por México e Chile, a oposição pressionou pela criação de um novo Conselho Nacional Eleitoral (CNE), que pudesse realizar eleições livres. Mas, ao anunciar a eleição antes de um acordo, o regime passou a mensagem de que isso não vai acontecer. 

Então, os venezuelanos podem esperar que a próxima votação seja outra farsa na mesma linha das eleições municipais viciadas que o governo realizou no mês passado. Nessas eleições, o governo mal se preocupou em ocultar a compra de votos com alimentos. Foi tão flagrante que, semanas depois, o país ainda estava convulsionado pelos protestos de pessoas furiosas por não terem recebido o tradicional pernil de Natal, que tinha sido prometido em troca de votos.

Uma eleição sem acordo significa também que o CNE continuará nas mãos do chavismo. No ano passado, o órgão declarou um candidato do partido de Maduro vencedor de uma eleição para governador, apesar de evidências claras de que ele havia sido derrotado. Em outra eleição, meses antes, a empresa de TI que administrava as urnas denunciou que o CNE havia feito aparecer um milhão de votos do nada.

Nas negociações na República Dominicana, a exigência da oposição era que o regime permitisse o monitoramento internacional, incluindo uma auditoria na apuração. A decisão do regime de prosseguir com as eleições sem um acordo significa que essa exigência também não será atendida.

Em vez disso, o governo se voltará para o antigo artifício de permitir uma missão de “acompanhamento” cosmética, dirigida por diplomatas de países amigos e ONGs de títeres, para que possa reivindicar que a vitória foi certificada internacionalmente. É estranho que o anúncio de eleições seja recebido como um golpe na democracia. Mas, ao levar adiante eleições nessas condições, Maduro conseguiu exatamente isso. / TRADUÇÃO DE CLAUDIA BOZZO É CIENTISTA POLÍTICO VENEZUELANO

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