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Análise: Kim Jong-un lança uma ofensiva de charme olímpica

Anúncio de que o Norte participaria dos Jogos, na cidade sul-coreana de Pyeongchang, e de que as duas Coreias conversariam para diluir as tensões, foi recebido no Sul como um alívio depois de um ano tenso

Por Choe Sang-hunjan
Atualização:

O líder da Coreia do Norte, Kim Jong-un, passou 2017 irritando o mundo com testes nucleares e mísseis de longo alcance. Agora, 2018 lhe trouxe a oportunidade ideal para uma ofensiva de charme: a Olimpíada de Inverno. O anúncio de que o Norte participaria dos Jogos, na cidade sul-coreana de Pyeongchang, e de que as duas Coreias conversariam para diluir as tensões, foi recebido no Sul como um alívio depois de um ano tenso. Poucos, porém, acreditam que Jim esteja mesmo motivado pelo espírito olímpico. “A prioridade de Kim é se esquivar da ameaça de Donald Trump e suavizar o impacto das sanções”, disse Paik Hak, analista do Instituto Sejong, da Coreia do Sul. “Os Jogos são a oportunidade perfeita.”

Coreia do Norte alerta sobre 'declaração de guerra' caso EUA imponham bloqueio marítimo na península. Foto: AFP PHOTO/KCNA VIA KNS

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A estratégia de Kim pode ser encontrada em seu discurso de ano-novo, durante o qual ele propôs que as Coreias enviassem uma delegação aos Jogos. Kim mostrou confiança de que as armas nucleares impeçam que os EUA iniciem uma guerra, vangloriando-se do “botão nuclear” em sua mesa. Mas ele disse a seu povo que se preparasse para os efeitos das sanções da ONU, que teriam começado a aparecer. Então, ele estendeu a mão a Seul, afastando a Coreia do Sul de Washington na questão das sanções. Ele pediu que os “compatriotas” trabalhassem juntos pela paz, um apelo que repercutiu com muitos progressistas sul-coreanos.

Logo após o discurso, Pyongyang restabeleceu uma linha direta entre as duas Coreias. No fim da semana, os dois lados concordaram em realizar negociações na aldeia de Panmunjom e o diálogo foi retomado. Koh Yu-hwan, professor da Universidade Dongguk, de Seul, disse que a ofensiva de Kim é o primeiro passo para o alívio das tensões. Kim pode ter cedido em razão das sanções, das ameaças de Trump ou porque está satisfeito com seu avanço nuclear. Mas, se ele queria afastar a Coreia do Sul dos EUA, apelando ao nacionalismo sul-coreano, não poderia ter escolhido um modo melhor do que pelo esporte.

+Para entender: Panmunjom, o ponto de encontro de soldados e negociadores coreanos

Apesar da inimizade, os sul-coreanos torcem pelos atletas do Norte em competições internacionais. Em 1964, as duas Coreias discutiram formar uma equipe olímpica única, ideia que sempre ressurgiu, mas quaae nunca deu certo. Em 2000, quando as Coreias realizaram a primeira reunião de cúpula, atletas dos dois países marcharam juntos na abertura dos Jogos de Sydney. Fizeram o mesmo em Atenas, em 2004, carregando a bandeira de uma Coreia unificada. 

Kim encontrou no presidente sul-coreano, Moon Jae-in, um entusiasmado parceiro. Durante meses, ele pediu o diálogo e estimulou sua participação na Olimpíada, ao mesmo tempo em que se opôs às ameaças de Trump. Para se aproximar do Norte, Moon deixou de realizar os exercícios militares com os EUA durante os Jogos. Para ele, a aproximação não poderia ter chegado em um momento melhor. Seu governo teve problemas para vender ingressos das competições, mas agora espera que uma multidão torça pela Coreia, o que diminuiria a crítica dos conservadores ao diálogo. “Diplomacia esportiva é atraente”, disse Lee Sung-yoon, especialista da Tufts University. “A Coreia do Norte tem todas as razões para animar os Jogos e ser o centro das atenções.”

Moon espera que o degelo leve a negociações mais amplas, envolvendo Washington, para acabar com o programa nuclear do Norte. Mas, como o resto do mundo, ele sabe que não será fácil. “Sul e Norte têm motivos diferentes por trás da ofensiva da paz”, disse Koh. “O Norte quer que o mundo o aceite como um país nuclear e viva em paz com ele. O Sul promove a paz para desnuclearizar o Norte.” / TRADUÇÃO DE CLAUDIA BOZZO

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*É JORNALISTA

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