MOSCOU - As autoridades da Belarus forçaram neste domingo, 23, um avião comercial civil a pousar em sua capital, Minsk, e prenderam um jornalista da oposição que estava a bordo, um ato que alguns líderes europeus compararam a um sequestro.
A apreensão do voo entre Atenas, na Grécia, e Vilnius, na Lituânia - as capitais de duas nações da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) - teve poucos precedentes recentes, e líderes europeus, que devem se reunir em Bruxelas na segunda-feira, disseram que estão considerando sanções abrangentes contra a Belarus.
Poucos minutos antes de o voo da Ryanair deixar o espaço aéreo belarusso e cruzar para a Lituânia, sua tripulação recebeu uma ordem do controle de tráfego aéreo da Belarus para dar meia-volta por causa de possíveis explosivos a bordo. Um caça MiG-29 escoltou o Boeing até Minsk, embora o destino do avião, Vilnius, fosse muito mais próximo.
A oposição belarussa disse que o alerta sobre uma suposta bomba era apenas um pretexto para o verdadeiro motivo de o homem forte do país, o presidente Alexander Lukashenko, ordenar o desvio do avião: a prisão de Roman Protasevich, um jornalista da oposição que estava bordo.
O ato é o mais recente de Lukashenko para reprimir a dissidência. Lukashenko, que está no poder desde 1994, conquistou uma grande vitória nas eleições do ano passado - um resultado denunciado internacionalmente como fraudulento. Seguiram-se meses de protestos populares contra seu governo, gerando repressões abrangentes que deixaram a maior parte da oposição exilada ou presa.
Com seu regime já em conflito com seus vizinhos ocidentais por causa de seu tratamento duro aos manifestantes, forçar a descida do avião da Ryanair no domingo provavelmente desencadeará um esforço internacional renovado para punir Lukashenko.
O primeiro-ministro polonês, Mateusz Morawiecki, disse que gostaria de discutir sanções imediatas em uma reunião previamente agendada de líderes europeus em Bruxelas na segunda-feira. “O sequestro de um avião civil é um ato de terrorismo de estado sem precedentes. Não pode ficar impune”, escreveu ele no Twitter.
O serviço de notícias do aeroporto de Minsk, capital da Belarus, disse que, embora o voo tenha sido desviado por causa de notícias de que havia explosivos a bordo, não foi encontrada nenhuma bomba no avião, que tinha 123 passageiros. Lukashenko pessoalmente ordenou a escolta de caças, disse a agência de notícias estadual BelTA.
Protasevich, que dirigia o popular canal de mídia social Telegram Nexta, foi detido após o pouso forçado do avião. O jovem, de 26 anos, tinha como destino Vilnius, na Lituânia, onde vive exilado.
Protasevich pode pegar mais de 12 anos de prisão depois que ele e o criador do Nexta, que expôs a brutalidade da polícia belarussa durante manifestações contra o governo, foram adicionados a uma lista de indivíduos supostamente envolvidos em atividades terroristas. Nexta e seu canal irmão, Nexta Live, têm cerca de 2 milhões de assinantes.
Protasevich disse em seu canal no Telegram no domingo, antes de deixar a Grécia, que sentiu que estava sob vigilância.
"O regime forçou a aterrissagem (do) avião da Ryanair em Minsk para prender o jornalista e ativista Roman Protasevich", disse a líder da oposição Svetlana Tikhanovskaya no Twitter, acrescentando que está exigindo sua libertação imediata e apelando à Organização de Aviação Civil Internacional (Icao, por sua sigla em inglês) para que tome uma atitude.
A organização, por sua vez, informou em um comunicado no Twitter que está fortemente preocupada com a aparente aterrissagem forçada de um voo da Ryanair e seus passageiros, o que poderia ser uma violação da Convenção de Chicago. "Esperamos que mais informações sejam oficialmente confirmadas pelos países e operadores em causa."
O voo da Ryanair estava quase na fronteira com a Lituânia antes de fazer um retorno para desviar para Minsk, de acordo com o site Flightradar24.
A Ryanair disse em um comunicado que o controle de tráfego aéreo belarusso notificou sua tripulação de que havia um risco potencial de segurança a bordo e a instruiu a desviar para o aeroporto que disse ser o mais próximo, Minsk. Mas o avião estava muito mais perto do aeroporto de Vilnius do que de Minsk, de acordo com o rastreador.
Nada foi encontrado, disse o comunicado. O voo partiu para Vilnius em seguida. "Isso é sem precedentes", disse um diplomata europeu, falando sob condição de anonimato devido à sensibilidade da situação. O diplomata disse que os legisladores europeus precisam discutir se ainda é seguro voar sobre o espaço aéreo da Belarus.
Os voos no norte e no leste da Europa frequentemente tentam evitar o espaço aéreo russo - incluindo o enclave de Kaliningrado no Mar Báltico - o que significa que, se o espaço aéreo belarusso também for proibido, os voos norte-sul na Europa podem se tornar bastante tortuosos.
Protasevich estava em Atenas tirando fotos durante uma visita de Tikhanovskaya à Grécia, então seu paradeiro seria público para qualquer pessoa interessada. O diplomata sênior observou que não teria sido difícil para as autoridades belarussas obter acesso a informações sobre os planos de viagem de Protasevich.
Enquanto o maior aliado da Belarus, a Rússia, silenciou sobre o incidente, a condenação ocidental foi forte. O presidente da Lituânia, Gitanas Nauseda, disse no Twitter que o avião foi pousado à força e que o regime belarusso está por trás da ação abominável.
O secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, disse que este é um incidente sério e perigoso que requer investigação internacional. O secretário das Relações Exteriores britânico, Dominic Raab, disse que o Reino Unido está coordenando com os aliados. "Essa ação bizarra de Lukashenko terá sérias implicações", disse.
Julie Fisher, a embaixadora dos EUA na Belaruss, disse no Twitter que o regime de Lukashenko mostrou mais uma vez seu desprezo pela comunidade internacional e seus cidadãos.
"Fingir uma ameaça de bomba e enviar MiG-29s para forçar @Ryanair a Minsk a fim de prender um jornalista da @nexta por acusações de motivação política é perigoso e repulsivo", escreveu ela.