Nicolás Maduro corre o risco de ter de administrar uma crise dentro da crise: além dos 13.800% de inflação, ele terá pela frente a insatisfação dos militares, ou ao menos de parte da oficialidade – 30% dos chefes da tropa composta por 115 mil homens e mulheres. O presidente ainda tem o apoio dos 70% dos promovidos e formados nas escolas das armas depois da tentativa de golpe de 2002, contra Hugo Chávez.
Há 15 anos, após o golpe frustrado, o governo chavista iniciou um expurgo nas três forças, afastando a classe média dos comandos e indicando para os postos apenas o pessoal alinhado com o regime. “Boa parte desses quadros não teve a formação adequada”, diz um cientista social venezuelano que deixou o país em 2017 e vive em Brasília. Ele espera uma decisão sobre seu pedido de asilo.
+Brasil, EUA e mais 13 países não reconhecem resultado das eleições na Venezuela
Para o especialista, essa condição criou uma obediência cega. “Ninguém quer correr o risco de perder privilégios.” As vantagens seriam muitas, como a estabilidade no emprego, o acesso aos cada vez mais raros bens de consumo e a assistência médica ou a linhas de crédito imobiliário subsidiado.
Maduro está transferindo para funções administrativas os oficiais dissidentes. São removidos das unidades operacionais, com poder de fogo e equipamentos avançados. As divergências têm sido duramente reprimidas. O Serviço Bolivariano de Inteligência Nacional (Sebin) ganhou imunidade jurídica e não é mais obrigado a fornecer informações à Justiça.
Sua sede em Caracas, um prédio sinistro, é conhecido como “O Túmulo”. Os oficiais descontentes trocam informações pela internet. Usam um código que muda sempre, com base em emojis, sinais de astrologia e boletins meteorológicos. Ontem, o acesso era por meio do signo de Touro e a previsão era de “céu nublado”.
*É JORNALISTA