Com o revés nas eleições britânicas, como ficam as negociações do Brexit

Ao perder maioria absoluta no Parlamento, Theresa May semeou incerteza sobre sua capacidade de se impor nas discussões com Bruxelas

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Atualização:

LONDRES - O revés infligido à premiê Theresa May nas eleições legislativas britânicas de quinta-feira 8 pode mudar a situação referente às negociações do Brexit - saída do Reino Unido da União Europeia (UE) -, assunto que ela abordará em posição enfraquecida.

Ao perder a maioria absoluta no Parlamento, a chefe do governo conservador não só perdeu a chance de reforçar a sua autoridade, como semeou a incerteza sobre a sua capacidade de se impor nas discussões com Bruxelas, que devem começar dentro de 10 dias, destacam os especialistas.

Resultado das eleições poderia levar o Reino Unido a "adotar um tom menos agressivo" com relação ao Brexit, diz analista Foto: AFP PHOTO / Glyn KIRK

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O resultado poderia levar o Reino Unido a "adotar um tom menos agressivo", em particular sobre a sua reivindicação de um Brexit duro, implicando na saída do mercado único, destaca o professor Simon Hix, da London School of Economics. "O Brexit duro foi parar no lixo esta noite", disse o ex-ministro conservador das Finanças George Osborne.

May convocou as legislativas antecipadas para conquistar uma posição de força. Ao invés disso, "está com um crédito político muito danificado no momento de empreender as negociações", ressalta Keith Featherstone, especialista em política europeia na London School of Economics.

"O resultado deixa dúvidas evidentes para (a chanceler alemã) Angela Merkel, para (o presidente francês) Emmanuel Macron, para todos. Isso muda a dinâmica", afirma o cientista político Paul Kelly.

Caos

O problema para May é duplo. No plano internacional, sua reputação sofreu um forte golpe. "Agora quando apresentar as suas exigências" aos sócios europeus "eles poderão dizer: muito bem, mas vamos ver", assinala Kelly.

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A primeira-ministra terá que impor a sua autoridade em seu próprio campo e corre o risco de depender ainda mais dos eurocéticos conservadores. "Se tivesse obtido um mandato forte, poderia ter mais peso para solucionar questões como a da fatura que Bruxelas reclama a Londres. Mas agora terá que solucionar primeiro os problemas dentro de seu partido e alguns dirão que não devem dar nenhum tostão a Bruxelas", acrescenta Kelly.

O ex-líder do partido eurocético Ukip, Nigel Farage, está preocupado. "O Brexit está em perigo", declarou. "Foi ativado o Artigo 50 e já estamos executando. May colocou tudo em risco. Inclusive (o ministro do Brexit) David Davis começa a fazer concessões", disse ele em sua conta no Twitter.

Os críticos do Brexit tentaram imediatamente aproveitar a ocasião para reivindicar uma mudança na forma de abordar a saída da União Europeia. "Os termos do Brexit devem ser negociados de maneira radicalmente diferente. As pessoas não votaram para sair do mercado único", disse Gina Miller, responsável pela campanha "Best for Britain".

"De início, o Brexit não é colocado em dúvida. Mas as propostas do governo sim, sem falar do calendário. A permanência no mercado único poderia voltar à mesa", considera Paul Goodman, deputado conservador e diretor do site "ConservativeHome".

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Por enquanto, a primeira questão será a do calendário das negociações. Sem uma maioria absoluta, Theresa May deverá tentar formar um governo, o que poderia atrasar os diálogos com Bruxelas. "É um completo caos", destaca o professor Tim Bale, da Queen Mary University de Londres.

Também fica pendente o futuro de May em Downing Street. Mike Finn, pesquisador da Universidade de Warwick, fala de um possível "fim de sua carreira política".

A União Europeia tinha a esperança de escapar de todas essas turbulências. Segundo várias fontes, Bruxelas queria que as eleições britânicas fizessem emergir um líder forte para alcançar o máximo de eficácia nos dois anos previstos de intensas negociações.

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"Em dois anos deveria haver o Brexit", comentou o comissário europeu Pierre Moscovici à rádio francesa Europe 1. Mas "May perdeu a sua aposta" e isso "talvez mude um certo número de coisas", acrescentou. / AFP

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