Com sinais de pragmatismo, presidente eleito do Irã encerra era Ahmadinejad

Além de ter vencido a eleição com promessa de diálogo, Hassan Rohani, que toma possa neste domingo, deve nomear gabinete de perfil técnico e com nomes ligados ao campo reformista

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Por Roberto Simon
Atualização:

O governo iraniano deve dar hoje um passo em direção a um maior pragmatismo, com a posse do presidente Hassan Rohani e o fim da era Mahmoud Ahmadinejad. É essa, ao menos, a expectativa em capitais do Oriente Médio e do Ocidente. Além de ter sido eleito com a promessa de diálogo dentro e fora do Irã, Rohani vem emitindo sinais de moderação, incluindo a provável composição de seu gabinete.Ontem, o clérigo educado na Escócia recebeu apoio do líder supremo, Ali Khamenei, e prometeu "moderação". Rohani pediu ainda o fim da luta entre facções e, em defesa da oposição, marginalizada do poder desde 2009, disse que "as portas devem estar abertas a todos os iranianos".Segundo a imprensa iraniana e agências internacionais, o novo presidente tentará trazer ao governo figuras com perfil técnico, na contramão do que fez Ahmadinejad, e majoritariamente ligadas ao campo reformista. Embora no Irã a palavra final em temas estratégicos seja do líder supremo, um governo iraniano menos radical teria grandes implicações para a região - do dossiê nuclear à violência na Síria. As nomeações, porém, não estão confirmadas e, quando ocorrerem, terão de passar pelo Parlamento. "Rohani colocará os profissionais novamente em cena e, com isso, o tom do Irã na arena internacional passará a ser muito mais moderado", disse ao Estado Ali Vaez, analista do International Crisis Group.Um exemplo dessa mudança seria a nomeação de Mohamed Forouzandeh como negociador-chefe do programa nuclear e secretário do Conselho Supremo de Segurança Nacional. Forouzandeh serviu no aparato de segurança de governos reformistas e hoje dirige a principal organização de caridade do país.A principal surpresa, entretanto, seria a designação do ex-embaixador na ONU Mohamed Javad Zarif para o cargo de chanceler (a informação veio à tona na imprensa iraniana e foi confirmada à agência Reuters por uma fonte próxima ao novo presidente). Além de ter servido em Nova York por cinco anos, Zarif fez sua graduação em San Francisco, doutorado na Universidade de Denver e é conhecido da elite política americana. Em 2007, o então senador e atual vice-presidente Joe Biden afirmou que ele "é pragmático e pode ajudar a resolver as diferenças entre EUA e Irã". Na mesma época, Chuck Hagel - hoje secretário da Defesa - elogiou Zarif e disse que o exemplo do diplomata mostrava a necessidade de dialogar com Teerã.Além de boas relações pessoais, o ex-embaixador na ONU tem um histórico de negociação com os EUA. Zarif mediou a libertação de soldados dos EUA no Líbano, nos anos 80, participou da transição no Afeganistão após a queda do Taleban, em 2001, e chegou a discutir com o governo George W. Bush a normalização dos laços entre Teerã e Washington.Outros nomes cotados para integrar o gabinete de Rohani são Bijan Zanganeh, como ministro do Petróleo, cargo que ocupou sob a presidência de Mohamed Khatami, e Ali Jannati, filho de um dos mais importantes clérigos do país, para a Cultura. Jannati é vinculado aos conservadores e demonstraria a vontade do presidente de montar um governo de consenso."A ideia de Rohani parece ser nomear pessoas por sua capacidade técnica, mantendo um certo equilíbrio político e boas relações com Khamenei. Duvido que ele traga algum líder do movimento verde (que liderou os protestos de 2009)", afirma Mohsen Milani, da Universidade do Sul da Flórida.Apesar da mudança de imagem, muitos inimigos do Irã duvidam que Rohani representará uma mudança objetiva. A polêmica em torno de uma declaração sua, na sexta-feira, em que ele chamou Israel de "ferida no corpo do mundo islâmico" acirrou os ânimos e levou o premiê de Tel-Aviv, Binyamin Netanyahu, a afirmar que "a verdadeira face" do presidente iraniano havia sido exposta. "A imagem do Irã mudará muito de Ahmadinejad para Rohani, mas isso, em si, não resolverá questões como o programa nuclear. A chave é saber se o presidente desejará e terá poder para chegar a um compromisso com o Ocidente", afirma Milani.

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