Discurso de Maduro evitou episódios de violência

Para especialista, tom do presidente foi essencial para evitar que grupos radicais chavistas saíssem às ruas para protestar

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Por Felipe Corazza e VENEZUELA
Atualização:

Contrastando com um início de jornada eleitoral tranquilo, as últimas horas que antecederam a divulgação dos resultados da votação de domingo na Venezuela foram de grande tensão. A deterioração do clima começou ainda antes do horário previsto para o fechamento das urnas, quando o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) anunciou que cassaria as credenciais de observadores internacionais informais convidados pela oposição.

Maduro admite derrota de seu partido e adota tom conciliador Foto: Reuters

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Pouco depois, começou a pressão da coalizão opositora Mesa da Unidade Democrática (MUD) pelo encerramento da votação na hora prevista, 18 horas (horário local). O CNE, no entanto, reafirmava a decisão de manter as seções eleitorais abertas enquanto houvesse cidadãos aguardando nas filas. A oposição atribuiu o atraso a uma manobra chavista para tentar melhorar seus números.

Enquanto os líderes políticos trocavam declarações e acusações, boatos de violência começaram a se espalhar. Militantes afirmavam em rede sociais que grupos de “motorizados” - motoqueiros organizados pelo chavismo e, normalmente, armados – já se preparavam para aterrorizar redutos da oposição. Em algumas regiões de Caracas, houve mobilização de policiais e militares. Disparos foram ouvidos em algumas das áreas da cidade.

Quando a presidente do CNE, Tibisay Lucena, encerrou a leitura do primeiro boletim, imediatamente, o presidente Nicolás Maduro surgiu ao vivo na TV para reconhecer a derrota do chavismo e pedir à população – em particular, a seus correligionários – que permanecesse em paz e entrasse em período de “reflexão”. Apesar de alguns episódios isolados – a reportagem presenciou, por exemplo, o momento em que um chavista desceu de uma moto e, brandindo uma pistola semiautomática, discursou sobre como “os pobres agora estão f...”, a madrugada seguiu calma.

Na avaliação do analista político José Rafael Mendoza, o tom adotado por Maduro foi essencial para evitar que grupos radicais chavistas saíssem às ruas de forma violenta, inconformados com a perda da maioria. Elemento “essencial” do discurso, na visão do professor, foi o reconhecimento claro e imediato da derrota.

“Foi essencial porque fortalece o sistema democrático, o respeito às leis e à autoridade eleitoral”, afirmou em entrevista ao Estado. “Traz um clima de estabilidade e paz à população e aos setores mais radicais do chavismo, que teriam possibilidade de manifestar qualquer reação violenta.”

Além de esfriar os ânimos exaltados, Mendoza acredita que o discurso foi uma mensagem clara aos grupos políticos que formam o Grande Pólo Patriótico, coalizão governista. “O chavismo, pela primeira vez em 17 anos, se converte em minoria. Ainda que mantenha o governo central, mantenha o peso da institucionalidade, do ponto de vista político já não é maioria do país. E isso demanda profundos ajustes sobre a organização política de seus quadros.”

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Após reconhecer o mau resultado para seu grupo, Maduro voltou a falar sobre os efeitos de uma “guerra econômica” que seria travada desde o exterior contra a Venezuela, explicação repetida à exaustão pelos chavistas sobre a atual crise do país. Para Mendoza, o uso do argumento é uma falha.

Para ele, ainda que fatores externos possam existir, as falhas do governo foram os principais combustíveis do problema. A autocrítica, segundo o analista, precisa ter como pontapé inicial uma renúncia coletiva do gabinete da área econômica. “Os ministros precisam colocar os cargos à disposição e o presidente, reformar o gabinete econômico.” 

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