Duhalde entra em ação para não perder rédeas da crise

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Por Agencia Estado
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O aumento da insatisfação popular, o início de um processo de afastamento dentro do seu próprio partido, o Justicialista e o movimento da oposição de começar a apostar na desestabilização do governo levaram o presidente da Argentina, Eduardo Duhalde, a tomar três medidas imediatas e simultâneas para tentar fortalecer sua sustentação política. Ele convocou os três principais jornais do país para suas primeiras entrevistas como presidente, antecipou uma reunião com sindicalistas, empresários, representantes de partidos políticos e de organizações não-governamentais e adiou o anúncio da flexibilização do confisco. "O curralzinho é uma bomba-relógio e é preciso desativá-la. Se explodir, ninguém receberá um peso. É responsabilidade do governo impedir a explosão", repetiu Duhalde aos três jornais para justificar porque não acabou com a restrição aos saques bancários impostos por Fernando de la Rúa e determinou o confisco das aplicações. O cronograma para resgate dos investimentos anunciado na quinta-feira é reprovado por 63,7% dos entrevistados em uma pesquisa do instituto Analogías-Research International, divulgada ontem. E a maioria (61,6%) condena a desvalorização do peso. Mas outra pesquisa, da consultora Ricardo Rouvier & Associados, mostra 38% dos entrevistados a favor da desvalorização e 33,6% contra. Flexibilização - O governo começou a estudar a flexibilização do confisco depois que argentinos saíram às ruas de novo, na madrugada de sexta-feira, para protestar. "Não podemos fazer nada apressadamente, o risco é enorme. Estamos em um vulcão", afirmou Duhalde ao explicar por que as medidas não serão anunciadas logo. O adiamento reduz a relação de causa-efeito entre os protestos e o recuo do governo. Segundo a pesquisa do Research International, 63% dos entrevistados acreditam que os panelaços são úteis para conseguir a flexibilização do "curralzinho". Outra pesquisa do Monitor de Tendências Econômicas diz que 81% dos entrevistados acreditam que os panelaços voltarão a acontecer se a política econômica não der resultados rapidamente. Imagem - Numa campanha para melhorar sua imagem, Duhalde defendeu esse tipo de protesto. Disse que a manifestação de sexta foi "uma reação compreensível" e que é "previsível" que aconteçam outras. "As pessoas têm todo o direito de protestar. Tenho medo é da mistura de panelaço com violência. Existem bandos que crescem devido à fome e à falta de trabalho. E isso pode sair de controle e haver mortes. É o pior que pode acontecer", afirmou. Outra declaração de impacto feita aos jornais foi sobre a possível quebra de bancos devido à pesificação de dívidas e ao aumento do volume de pesos sacados, que deve ser autorizado esta semana. Duhalde disse que que o sistema agüenta "a quebra de alguns bancos". E acrescentou: "Em outras crises se perderam alguns bancos. A questão é que não arrastem junto o sistema, que não se possa mais pagar a ninguém." Para o deputado Carlos Raimundi, da Frepaso (partido que fez parte da Aliança que elegeu Fernando de la Rúa), "Duhalde está trabalhando muito com o curralzinho e pouco com a verdade e a justiça. Existe uma demanda social para resolver a crise econômica, mas existe também uma demanda de justiça muito grande". "O governo ainda não acertou com a solução do problema das pessoas. O corralito afeta o mercado interno. O crescimento desse mercado é a única coisa que pode mudar o humor das pessoas, que estão furiosas", disse o deputado Alfredo Bravo, do ARI. Bravo é o segundo principal político do partido, depois da deputada Elisa Carrió, virtual candidata à Presidência se houver eleições antecipadas. Consenso - Antes de anunciar novos planos e medidas, Duhalde vai tentar chegar ao "consenso". Por isso antecipou a reunião multisetorial, que acontecerá em instalações da Igreja Católica e terá a mediação da Organização das Nações Unidas. O objetivo é criar as bases de um projeto de país que possa se transformar em realidade por meio de iniciativas parlamentares. A proposta oficial é criar um salário de inclusão social de até 200 pesos, lançar um projeto para estimular microempreendimentos e estabelecer um mecanismo de consulta permanente a esses setores. Duhalde disse aos jornais que em dez dias o governo terá condições de lançar um plano social de emergência. Pobres e indigentes - Segundo uma pesquisa do Ministério da Economia, a Argentina terá 700 mil novos pobres e 340 mil novos indigentes se os preços da cesta básica subirem 5%. Um aumento de 30% colocaria mais 3,7 milhões de argentinos na categoria dos pobres e mais 2 milhões na de indigentes. Vários supermercados estão colocando nas prateleiras cartazes denunciando o aumento de preços de alguns produtos, informando o telefone dos atacadistas e pedindo que as pessoas combatam os reajustes comprando outras marcas. Nas entrevistas, Duhalde voltou a repetir seu discurso dos últimos dias. "Vou chegar a 2003 porque o poder político está reconstruído. A governabilidade está garantida". E procurou desqualificar as recentes declarações de Menem sobre a sua capacidade de governar. "Um ex-presidente tem de ser muito prudente com o que diz porque pode afetar o país. Mas há ex-presidentes que não se preocupam com os interesses nacionais." "Se o governo não se restringir ao peronismo e fizer uma administração de salvação nacional, a Argentina poderá sair desta situação", afirmou o deputado Leopoldo Moreau, da União Cívica Radical (partido de De la Rúa). Segundo ele, os grandes partidos do país "sabem que esta é a última chance para que sejam eles os autores das soluções para os problemas do povo".

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