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FAO alerta que economia da Venezuela pode entrar em colapso em 2018

País chegou a ser elogiado pelo combate à desnutrição, mas crise reverteu o cenário

Por Jamil Chade , CORRESPONDENTE e GENEBRA
Atualização:

GENEBRA - Cinco anos depois de a FAO premiar o governo de Nicolás Maduro pelo combate contra a desnutrição, a Venezuela é considerada hoje como um dos locais de maior risco no mundo em termos de abastecimento. Um informe produzido pela entidade liderada pelo brasileiro José Graziano da Silva, ex-ministro e artífice do Fome Zero, alerta que a economia venezuelana pode entrar em "colapso" em 2018 e que, portanto, os problemas de abastecimento devem perdurar.

+ José Graziano, da FAO, entrega a António Guterres, da ONU, proposta contra a fome

Já em seu relatório de 2016, a Venezuela passou a fazer parte do radar da FAO, diante dos sinais claros de escassez de alimentos. Mas, no atual informe que apresenta a situação da fome no mundo em 2017, o alerta é claro de uma crise instalada. 

Nicolás Maduro (de vermelho) caminha ao lado de outros dirigentes chavistas antes de ato de governo na capital Caracas Foto: EFE/PRENSA MIRAFLORES

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"A segurança alimentar é também uma preocupação na Eritreia, Mianmar, República Democrática da Coreia e Venezuela", indica o documento que mapeia as principais crises de abastecimento no planeta. Mas a FAO alerta que, diante da falta de dados sobre a situação nesses locais, "nenhuma estimativa sobre o número de pessoas que passam fome nesses países pode ser feita". Os dados, tradicionalmente, são fornecidos pelo governo, que tem se recusado a compartilhar informações sobre a real situação do país. 

A situação do país sul-americano ainda não seria a mesma de Iemen ou Síria. No informe, a FAO alerta para a existência de 124 milhões de pessoas que enfrentam níveis elevados de insegurança alimentar pelo mundo. 

Ainda assim, a FAO não deixa dúvidas de que a crise econômica tem sido o principal motivo da fome na Venezuela. "A situação econômica e política na Venezuela se deteriorou em 2017, minando o abastecimento de serviços básicos e afetando de forma severa a segurança alimentar e saúde", reconheceu a FAO. "O risco de um calote sobre a dívida externa, o impasse político e a insegurança provavelmente vão continuar em 2018 a gerar deslocados e aumentar as necessidades por alimentos e saúde", indicou a entidade.

Colapso

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 As previsões da FAO não são otimistas. "As atuais dificuldades em repagar a dívida podem levar a sanções econômicas mais duras e levar a um calote completo, o que poderia levar a economia ao colapso", alertou. "Os desafios econômicos devem continuar a limitar a capacidade do governo de fornecer serviços básicos", reconheceu a entidade. 

Outra preocupação da FAO se refere aos refugiados e imigrantes venezuelanos na região. "A segurança alimentar dos venezuelanos que migram para a Colômbia, Aruba e Curaçao deve ser monitorado", defende. "A situação em La Guajira, na Colômbia, está se tornando complexa diante da chegada de venezuelanos ao longo dos últimos dois anos, o que está colocando pressão sobre a disponibilidade e acesso a alimentos", apontou. 

Se a Venezuela volta ao radar internacional da fome, a constatação das entidades é de que dados confiáveis sobre a crise passaram a ser de difícil acesso. No mês pasado, o governo de Caracas anunciou na ONU que "não existe crise humanitária" no país. 

Ao Estado, um grupo de diplomatas ainda ironizou os alertas sobre a fome, apontando que muitos dos representantes do país na missão diante da ONU estavam "gordos". 

No sistema de organismos que fazem parte da ONU, a falta de dados sobre a Venezuela se transformou em um problema crônico. No site da Organização Panamericana de Saúde, por exemplo, as últimas cifras sobre a mortalidade na Venezuela são de 2013. 

A falta de dados sobre a Venezuela chegou a levar o alto comissário da ONU para Direitos Humanos, Zeid Al Hussein, a questionar : "o que é que vocês estão escondendo ?"

Tanto na FAO como em outras entidades da ONU, os raros dados são obtidos por meio de entidades regionais ou ongs. 

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Um estudo realizado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), por exemplo, indicou que entre cinco a seis crianças morreram por semana na Venezuela por falta de comida em 2017. Ao menos 33% da população infantil apresentou atraso no crescimento. Segundo o presidente da CIDH, Francisco Eguiguren, em média 4,5 milhões de venezuelanos estariam se alimentando uma vez ao dia ou a cada dois dias.

Entidades como a Caritas, Oxfam e outras organizações de cunho humanitário também destacam a realidade da fome no país.