Imigrantes navegam à deriva pela Ásia

ONU calcula que mais de 25 mil pessoas já tentaram a travessia da Baía de Bengala em barcos precários fugindo de perseguição étnica e religiosa

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Durante décadas os traficantes de pessoas realizaram regularmente um lucrativo comércio nas águas do Sudeste Asiático. Em 10 de maio seus sombrios negócios vieram à tona - e numa praia indonésia. Em pânico, por causa das recentes medidas de repressão adotadas pela Tailândia que tornaram difícil para os traficantes aportarem na região, os criminosos abandonaram 600 imigrantes em barcos nas costas ao norte da Ilha de Sumatra.

Os homens, mulheres e crianças abandonados na praia estavam doentes e exaustos, mas felizes. Cerca de 7 mil estariam presos em barcos na Baía de Bengala e em Andaman. Alguns continuam nas mãos dos contrabandistas, outros à deriva. Uma situação de emergência que os belicosos vizinhos da região parecem não estar bem equipados para resolver.

Mulher da etnia perseguida rohingya se recupera após ser resgatada no mar Foto: Chaideer MahyuddinAFP

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Aproximadamente a metade dos refugiados que se dirigem para o Sudeste Asiático é de imigrantes que fogem da pobreza em Bangladesh. Os demais são membros da minoria rohingya, originários de Bangladesh, mas que atualmente vivem no Estado de Rakhine, no noroeste de Mianmar, onde as autoridades e grande parte da população budista quer se ver livres deles.

Pagamento. Os imigrantes pagam US$ 2.000 por uma passagem para os campos dos traficantes no sul da Tailândia, esperando que, a partir dali, consigam atravessar a fronteira rumo à Malásia, um dos países mais ricos do Sudeste Asiático (e também muçulmano).

É uma jornada longa e perigosa. Alguns sucumbem a doenças ou abusos nos campos tailandeses, onde com frequência ficam presos até que amigos ou a família paguem um resgate. Outros são abordados por mercadores de escravos e forçados a trabalhar em barcos de pesca e camaroneiros tailandeses.

Durante anos o tráfico tem sido feito sob o nariz das autoridades tailandesas, e os responsáveis no mínimo têm feito vista gorda para o que ocorre. Em alguns lugares a polícia e a Marinha chegaram a ajudar os traficantes a prosseguir seu caminho com os clandestinos.

Mas os generais que governam a Tailândia desde o golpe do ano passado intensificaram as medidas para combater o problema. Em 1.º de maio as autoridades encontraram 26 corpos num campo abandonado pelos traficantes na Província de Songkhla, no sul do país, e prometeram fechar os demais campos.

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Os países europeus ameaçaram proibir as importações de frutos do mar se a Tailândia não erradicar a escravidão. E sanções poderão ser decretadas se a Tailândia obtiver mais uma condenação no relatório anual do governo americano sobre os esforços realizados para pôr fim ao tráfico de pessoas.

Esperando uma ação mais enérgica do governo tailandês, algumas redes de traficantes já começaram a confinar os imigrantes nos navios distantes da costa. Mas a viagem fica ainda mais traiçoeira, especialmente porque o número de refugiados disparou. De acordo com as Nações Unidas, 25 mil pessoas partiram da Baía de Bengala entre janeiro e março, quase o dobro do registrado nos dois anos anteriores.

Em parte, o aumento se deve ao fato de a situação dos rohingya ter piorado. Além disso, mais famílias decidiram se reunir com os homens que já foram para a Malásia. Um terço dos migrantes têm menos de 18 anos e há uma mulher em cada grupo de sete ilegais. Os barcos estão cada vez mais abarrotados, cada um deles normalmente transportando mais de 400 pessoas. Segundo as Nações Unidas, 300 refugiados morreram na travessia pelo mar nos primeiros três meses do ano.

De acordo com a polícia tailandesa, foram encontrados pelo menos 7 campos de tráfico abandonados e resgatados mais de 300 migrantes. A maior preocupação é com aqueles que ainda estão no mar. Logo depois de aportarem na Indonésia outros mil refugiados viajando em pequenos barcos de pesca, aportaram na ilha malaia de Langkawi. Mas, no dia 14, as autoridades malaias obrigaram outro barco a fazer meia volta e avisaram que impedirão os imigrantes de descerem do navio. No dia 12, a Marinha indonésia escoltou um navio transportando 500 migrantes de volta para águas internacionais, oferecendo antes combustível e suprimentos.

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Ninguém quer dar abrigo aos recém-chegados, mas o problema dos rohingya é particularmente complicado, pois Mianmar rejeita recebê-los de volta. Tailândia, Indonésia e Malásia não assinaram a convenção das Nações Unidas sobre refugiados. Ninguém está preocupado com esses migrantes.

A repressão reduziu o número de barcos partindo de Bangladesh e Mianmar, pelo menos no momento. Mas os complexos problemas sociais e econômicos (e no caso dos rohingya, a violência) que levam os migrantes a fugir ainda persistem - juntamente com a onipresente corrupção que incentiva os traficantes de pessoas.

Apesar de todo o alarde de uma maior integração entre os países do Sudeste Asiático, a resposta à crise é fragmentada. Agora, a Tailândia pelo menos convocou uma reunião de cúpula internacional para discutir uma abordagem regional para coibir o tráfico humano, marcada para o dia 29. Para alguns que estão neste momento à deriva no mar, será tarde demais.

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© 2015 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. TRADUZIDO POR TEREZINHA MARTINO, PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM

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