Julgamento de Duch chega à fase final

Acusação diz que chefe torturador do Khmer Vermelho finge arrependimento

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Por Efe
Atualização:

O julgamento por genocídio contra o diretor do centro de torturas do Khmer Vermelho, Kaing Guek Eav, conhecido como "Duch", entrou na fase final nesta segunda-feira, 23, com a conclusão da acusação de que ele finge arrependimento pelas atrocidades cometidas sob sua supervisão.

 

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A audiência foi monopolizada pela acusação, que insistiu em atribuir a Duch a máxima responsabilidade pelos fatos ocorridos no S-21, o centro de detenção do Camboja pelo qual passaram pelo menos 14 mil pessoas antes de serem executadas.

 

Karim Khan, advogado de 37 das 90 vítimas, pretendeu desmontar no transcurso da audiência, realizada no tribunal internacional, "as tentativas do acusado de minimizar seu papel e de negar sua autonomia no S-21".

 

Segundo o letrado, o julgamento permitiu demonstrar que Duch tinha autonomia na gestão do centro e que escolhia os métodos de tortura utilizados para extrair confissões dos detidos. "Diante dos senhores não há um Schindler", disse Khan, em referência a Oscar Schindler, o empresário alemão que salvou centenas de judeus durante a Alemanha nazista. "Duch era alguém plenamente dedicado a um trabalho, que não era só confinar presos no S-21, mas torturá-los e assassiná-los", disse o advogado aos juízes.

 

O letrado assegurou que Duch contribuiu para aumentar a paranoia que se transformou em um círculo vicioso no qual mais e mais gente era acusada e detida, e acrescentou que "o fez não para cumprir ordens, mas porque queria pertencer ao grupo no poder e tornar sua vida mais cômoda".

 

Khan pediu aos juízes que refletissem sobre a veracidade e a sinceridade do arrependimento mostrado por Duch durante o processo. "É verdadeiro? É falso? Ou é uma mistura dos dois?", se perguntou, apelando ao caso sul-africano no qual "a anistia se dava em troca da verdade, algo que aqui não se deu completamente".

 

Khan assegurou que "o sofrimento das vítimas não acabou no centro de torturas de Tuol Sleng, mas perdura até os dias de hoje" e concluiu pedindo aos juízes que façam justiça e declarem o acusado culpado de crimes de guerra, contra a humanidade, de tortura, e de assassinato premeditado.

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O advogado de outro grupo de vítimas, Pierre-Olivier Sur, insistiu nos mesmos argumentos e assegurou que "o perdão só pode vir após uma sincera e exaustiva confissão, e não dá a impressão de que a de Duch tenha sido de todo assim".

 

Sur recriminou Duch por ter sido "evasivo" ao responder sobre diversas formas de tortura e sobre a responsabilidade que ele mesmo poderia ter tido em sua aplicação. O letrado destacou que "o acusado deve ser julgado segundo seu papel (no S-21), ou seja, o de alguém que cometeu crimes contra a humanidade" e acrescentou que "a única maneira de evitar que a história se repita é castigando os crimes".

 

Duch, de 66 anos, admitiu desde os primeiros dias sua responsabilidade, expressou seu arrependimento e pediu perdão às vítimas. Ao longo do julgamento, o acusado reconheceu ter torturado pessoalmente vários dos reclusos e ter ordenado executar pessoas, entre elas, dezenas de bebês. "Estou contente de estar aqui e de que o julgamento esteja acontecendo, mas estou zangado com Duch porque é mau em suas respostas aos juízes", disse Choum Mey, um dos poucos sobreviventes do S-21.

 

Os advogados da acusação particular dedicaram a maior parte do tempo nomeando as vítimas uma a uma e explicando sua história pessoal, e também ressaltaram a necessidade de reparar os danos.

 

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"As vítimas necessitam uma reabilitação. É preciso justiça e que esta seja vista", disse a letrada Moch Sovannary, que pediu assistência médica e psicológica para os afetados. Duch é o ex-oficial de menor categoria do Khmer Vermelho que será julgado pelo tribunal internacional organizado pelas Nações Unidas e por Camboja após um longo e complicado processo de negociações, que começou em 1997.

 

Cerca de 1,7 milhão de pessoas morreram por causa da crise de fome, doenças e expurgos ordenadas pelo regime de Pol Pot durante o período que governou o país, de 1975 a 1979. Ainda devem ser julgados Khieu Samphan, ex-chefe do Estado; Nuon Chea, "irmão número dois" e ideólogo da organização; Ieng Sary, ex-ministro de Assuntos Exteriores; e sua esposa, Ieng Thirit, ex-titular de Assuntos Sociais.

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