O presidente francês, François Hollande, descobriu há duas semanas uma nova maneira de governar. Ele toma a palavras em todas as ocasiões e seu discurso é sempre o mesmo: “Está melhor!”, ele diz sorrindo, às vezes com a variante: “Agora está melhor”. Parece um desses bichinhos mecânicos que as crianças adoram, que falam sempre a mesma frase e nunca conseguimos parar porque seu mecanismo encrencou.
O que torna divertido, ou antes, desesperador este exercício, é o fato de que Hollande distribui seu otimismo em doses generosas em meio a uma paisagem devastada. As greves espalharam-se sucessivamente nas ferrovias, na aviação comercial, no metrô, mas “a coisa está melhor!” A popularidade de Hollande mereceria ontem uma medalha de ouro: as pesquisas mostraram que16% do eleitorado se diz favorável a ele, e 83% hostil. “Está tudo bem!”
Desde a segunda-feira, e a noite de terça, “está tudo ainda melhor!” As refinarias de petróleo estão bloqueadas em grande parte do território. Nos postos, as bombas estão secas e milhares de automóveis fazem fila por horas para mendigar algumas gotas de combustível. Uma verdadeira trombose.
Por que este país está paralisado, amargurado, violento, descontente, desalentado? O pretexto é uma lei do trabalho que não agrada aos assalariados porque veem nela a mão dos patrões e do capital. Absurdo. Além disso, esta lei foi tão enfraquecida e diluída que se tornou uma casca vazia. E é em razão deste vazio que assalariados e governantes estão pondo o país de pernas pro ar.
Ao redor deste vazio toda a França está pegando fogo. Nunca a nação esteve tão dividida. E como existem situações semelhantes em outros países europeus, as pessoas se perguntam se estas fronteiras internas, estas fraturas que a esquartejam, não seriam uma nova síndrome desta nossa época insensata e trágica, e não apenas na França.
Na segunda-feira, por exemplo, assistimos ao nascimento de uma Áustria desconhecida. Os dois partidos do governo (a esquerda e a direita) que se sucedem desde sempre, gentilmente, nos assuntos políticos, foram corroídos. Desapareceram. Nunca mais voltarão a existir. O que vemos aparecer é um país desconhecido, rasgado em dois campos até agora desconhecidos: a ultradireita fascistoide e os ecologistas. O pior é que ambos têm exatamente a mesma força: 50% contra 50%, o que faz prever um duelo até o último sangue.
O modelo francês é mais refinado. Há sempre dois antagonistas, a direita e a esquerda. Mas cada um dos dois dividiu-se por sua vez em duas partes. De fato, a França se encontra fracionada em quatro exércitos inimigos: a direita morna de Nicolás Sarkozy contra a direita combativa de Marine Le Pen. O mesmo ocorre na esquerda: de um lado, os socialistas flexíveis de Hollande, do outro, a ultra esquerda constituída por comunistas e socialistas inflexíveis e sempre irritados (Mélenchon, etc.).
Outra diferença em relação à Áustria é que, enquanto ali os dois inimigos têm um peso rigorosa e dramaticamente igual, na França o campo da direita é mais numeroso do que o da esquerda. Entretanto, é preciso dizer que François Hollande não perdeu tempo. Quando foi eleito presidente, em 2012, seu partido, o socialista, reunia 48% dos cidadãos. Em quatro anos de poder fraco, falastrão e desastrado, ele reduziu os socialistas a 36% do eleitorado. O que confere um sentido irônico ao seu refrão: “A coisa está melhor!”/ TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA É CORRESPONDENTE EM PARIS