Mianmar e Bangladesh terão dois anos para repatriar refugiados rohingyas

É a primeira vez que os dois países falam claramente de um calendário para o regresso dessa minoria muçulmana perseguida há anos nesse país do Sudeste Asiático majoritariamente budista

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Atualização:

NAYPYIDAW -Mianmar e Bangladesh chegaram a um acordo nesta terça-feira, 16,e fecharam um prazo de dois anos para solucionar o retorno dos mais de 650 mil rohingyas que abandonaram o território birmanês desde o final de agosto para fugir da repressão do Exército.

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O acordo foi firmado em Naypyidaw, a capital birmanesa, e trata "do documento que os refugiados terão de preencher", indicou o Ministério das Relações Exteriores de Bangladesh. Segundo a nota do Ministério, o acordo aponta que o processo "se completará, preferencialmente, em dois anos desde o início da repatriação".

Depois dos ataques do fim de agosto contra postos da polícia de Mianmar, o Exército lançou uma operação de repressão contra aldeiasrohingyas, marcandoo início de um imenso êxodo de mais de 640 mil pessoas desta minoria muçulmana para Bangladesh. A ONU denunciou uma limpeza étnica e o Alto Comissariado para os Direitos Humanos falou de genocídio Foto: AFP PHOTO / K M ASAD

É a primeira vez que os dois países falam claramente de um calendário para o regresso dessa minoria muçulmana perseguida há anos nesse país do Sudeste Asiático majoritariamente budista. Mianmar e Bangladesh iniciaram há semanas o debate sobre a questão dos refugiados.

Bangladesh pressionava o governo de Aung San Suu Kyi para que lançasse o processo de retorno dessa comunidade. Segundo o comunicado do Ministério das Relações Exteriores de Bangladesh, foram construídos cinco acampamentos no estado de Rakhain, no oeste de Mianmar, onde vivia a maioria dos rohingyas.

O país acolhe quase um milhão de rohingyas em sua fronteira sudeste, onde está o que é considerado hoje em dia o maior acampamento de refugiados do mundo.

"Nos próximos dias, os refugiados poderão começar a ser registrados. O processo poderá começar", disse à AFP o embaixador de Bangladesh em Mianmar, Mohamad Sufiur Rahman, embora tenha descartado que os primeiros retornos aconteçam já no final de janeiro, como se havia anunciado. "É impossível", afirmou.

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Várias organizações sociais questionam se, traumatizados pelos abusos que dizem ter vivido, os rohingyas vão querer voltar para Mianmar. 

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Discriminação 

A violência no oeste de Mianmar começou no final de agosto de 2017 com ataques a postos policiais por parte da rebelião do Exército da Salvação dos Rohinygas de Arakan (ARSA). O grupo denuncia os maus-tratos a esta minoria. Para a ONU, essa população muçulmana foi vítima de uma "limpeza étnica".

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Pressionada pela comunidade internacional, Mianmar prometeu repatriar os refugiados, se conseguirem provar que já residiam em território birmanês. A maioria dos refugiados consultados pela AFP nos acampamentos de Bangladesh confirma que não deseja voltar para Mianmar, onde seus povoados foram incendiados, e suas terras, confiscadas.

Em um recente relatório, a Anistia Internacional afirmou que o oeste de Mianmar era "uma prisão a céu aberto" para os rohingyas vítimas de apartheid. Maior minoria apátrida desde que foi retirada deles a nacionalidade birmanesa em 1982 durante o regime militar, os rohingyas são vítimas de discriminação.

Não têm documentos de identidade e não podem viajar, ou se casar, sem autorização. Não têm acesso ao mercado de trabalho, ou aos serviços públicos, como escolas e hospitais.Estão isolados do mundo exterior e a repressão se acentuou desde 2012, ano em que a violência intercomunitária deixou mais de 200 mortos - em sua maioria muçulmanos.

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Há meses, os militares negam seu envolvimento na violência contra os rohingyas. Na semana passada, porém, o Exército birmanês admitiu que uma investigação interna revelou que membros das forças de segurança cometeram abusos e ajudaram a matar dez rohingyas considerados suspeitos. Seus corpos foram enterrados em uma vala comum.

O fato de os militares terem reconhecido pela primeira vez a matança de rohingyas foi considerado um passo positivo para Aung San Suu Kyi. "No final, o respeito das leis em um país é a responsabilidade desse país. É um sinal positivo de que tomamos medidas para sermos responsáveis", declarou a líder birmanesa, muito criticada por países ocidentais por seu silêncio sobre a crise dos rohingyas. /AFP

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