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Obsessão pela paz

Por MAC MARGOLIS
Atualização:

Quando o presidente colombiano, Juan Manuel Santos, anunciou uma nova tentativa de negociar a paz com a guerrilha Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), boa parte dos compatriotas temia que a iniciativa não vingasse. Outros tantos temia o contrário.Lá se vão quase 29 meses, o acordo com as Farc ainda não saiu e a Colômbia, anfitriã da insurgência guerrilheira mais arrastada das Américas, continua rachada pelo meio. No entanto, Santos prossegue, obcecado pela aposta da paz, uma tentação que já derrubou meia dúzia de antecessores e quase lhe custou a reeleição. Na semana passada, Santos aumentou a aposta ao ordenar a suspensão, por 30 dias, dos bombardeios aos acampamentos dos rebeldes. Seu motivo: a negociação está avançando, rumo a sua "fase final", como ele mesmo declarou. É mais um salto no escuro para o jogador-chefe da América Latina, que se arrisca a ora faturar o Prêmio Nobel da Paz, ora uma menção honrosa no extenso rol dos Dom Quixotes dos Andes. Os céticos chiaram. Afinal, foi o próprio presidente que jurou, a caminho de Havana, que a missão de paz jamais o impediria de lutar contra os rebeldes. Mas há razões para o otimismo. Foram as próprias Farc, afinal, que anunciaram em dezembro um cessar-fogo unilateral. O atentado no dia 12 em Bogotá foi atribuído ao ELN, outro bando menor, que se encaixou mal e tardiamente na mesa de negociações de paz em Havana.No mais, as negociações que começaram no final de 2012 avançam, com entendimentos esboçados em três dos cinco pontos cardiais do pacto. As partes já concordaram em promover a reforma agrária, combater o narcotráfico e permitir aos ex-combatentes em dia com a justiça sua participação na vida democrática da Colômbia.Obstáculos permanecem. Não se sabe ainda como compensar as vítimas do conflito, que matou mais de 220 mil no último meio século, tampouco de que forma os rebeldes arrependidos devem pagar por seus crimes. E como fazer para garantir que todos os combatentes entreguem suas armas?As pendências provocam temores e ceticismo, mercadorias fartas na conflagrada nação andina que há mais de duas gerações desconhece a paz duradoura. A guerrilha refratária não é o único entrave de Santos. O acordo de paz, se vier, ainda terá de passar pelo crivo da sociedade colombiana, que se pronunciará em um referendo. É aí que mora o inimigo. Hoje 53% dos colombianos dizem acreditar na paz negociada. Já foi pior, mas a taxa de aprovação de Santos patina em sofríveis 43%, puxada pelo tombo da economia colombiana, na esteira do preço cadente do petróleo.Há ainda o fator Uribe. O ex-presidente Álvaro Uribe lustrou sua aura de caudilho valentão no combate sem trégua às Farc, a quem responsabiliza pela morte de seu pai, em 1983. Para executar a ofensiva, escalou um hábil e leal ministro da Defesa: Juan Manuel Santos.Proibido de concorrer a um terceiro mandato, Uribe patrocinou Santos, que ganhou a eleição de 2010 e, aproveitando o enfraquecimento da guerrilha, logo acenou para a mesa de paz. Uribe jamais o perdoou pela heresia e hoje atira sem piedade contra seu ex-protegido, da casamata da sua fiel base rural e com a metralhadora do Twitter, a 3.6 milhões de seguidores.Com o tempo, o plácido Santos comprou a briga e hoje os dois protagonizam uma guerrilha particular - um "espetáculo escandaloso", nas palavras de um conceituado articulista colombiano - que polariza a sociedade e envenena o enredo político.É uma pena. Foram os dois líderes que abriram a janela - Uribe pelas armas, Santos pela negociação - para o fim da mais ruinosa guerra do Hemisfério Ocidental. Mas, pela picuinha e ambição de cada um, ainda estão longe da paz colombiana. É COLABORADOR DA 'BLOOMBERG VIEW' E COLUNISTA DO 'ESTADO'

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