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Para Xi Jinping, protestos em Hong Kong são risco para o partido

Cada vez mais, Pequim se preocupa com os danos que as revoltas populares podem causar à imagem do governo

Por THE ECONOMIST
Atualização:

Os manifestantes de Hong Kong fingem que não estão procurando briga com o Partido Comunista da China. Em vez disso, dizem que seus objetivos estão alinhados com os dos chefes em Pequim: os dois lados querem a continuação da prosperidade de Hong Kong, 22 anos após a ex-colônia britânica se tornar um núcleo do livre mercado sob o slogan “um país, dois sistemas”.

Em vez de Pequim, os manifestantes preferem confrontar o governo de Hong Kong, acusando-o de não manter uma estrita separação do continente.

Manifestantes invadiram plenário do Lesgislativo de Hong Kong em protesto contra governo que consideram ser submisso a Pequim Foto: REUTERS/Tyrone Siu

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Os ativistas vêm se atendo à norma do “não cutuquem o dragão chinês” nos protestos, que agitam o centro de Hong Kong desde 9 de junho. Duas das manifestações envolveram mais de 1 milhão de pessoas exigindo a retirada de uma lei que permitiria extradições para a China continental.

Manifestantes desafiam as bastonadas e o gás lacrimogêneo da polícia para protestar contra a chefe do Executivo, Carrie Lam, acusando-a de os expor ao Judiciário chinês, no qual não confiam. Agitam bandeiras vermelho-sangue adornadas com imagens de algemas. Gritam insultos obscenos em cantonês contra Lam, contra os policiais e contra as mães dos policiais. Cartazes mostram Lam como o Gollum, o hobbit maligno. Mas slogans contra Xi Jinping, o líder chinês, têm sido raros. 

Durante um rápido café entre os protestos, Nathan Law, um dos líderes do movimento pró-democracia, admitiu que, quando os ativistas exigem um governo democrático, eleito livremente, estão logicamente desafiando Pequim. Mas, segundo Law, este não é o principal objetivo. “Todas as nossas exigências estão dirigidas ao governo de Hong Kong”, afirma. 

São tempos vertiginosos para ativistas como Law. Aos 25 anos, ele já foi eleito para o Conselho Legislativo de Hong Kong (apenas para ser expulso por recitar incorretamente seu juramento para o cargo) e cumpriu pena de prisão por participar dos protestos pró-democracia em 2014. 

Após Lam suspender a lei de extradição, alguns jornais do exterior consideraram seu recuo como um dos piores golpes políticos já sofridos por Xi. Mas os manifestantes, diz Law, querem que Lam revogue totalmente a lei. Eles pedem também que seja criada uma comissão para investigar o uso excessivo de força pela polícia e um acordo para que manifestantes não sejam processados por atacarem policiais. Apesar de suspender a lei, Lam até agora não a revogou. “Na verdade, ainda não conquistamos nada”, disse Law. 

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O ativista manda uma mensagem ao governo central: “Manter Hong Kong como uma cidade vibrante e competitiva é bom para todos”. Mas, no curto prazo, ele parece mais preocupado com a opinião local, escaldado por uma lição que aprendeu nos protestos de 2014, a de que é preciso manter o apoio do público. 

Assim, ele ressalta pequenos atos de contenção estabelecidos pelo movimento (que não tem liderança e é mobilizado digitalmente). Cita uma nova tática, a de cercar prédios públicos durante o dia, em lugar de bloquear ruas, para que os funcionários possam trabalhar, mas ir para casa mais cedo (para grande satisfação do funcionalismo).

Manifestantes também estão focados na política local. Wayne, um estudante de 20 anos que bloqueava escritórios de arrecadação de impostos, dá de ombros quanto às chances de o próprio Xi atender às reivindicações. “Ele é um rei”, resume. Suas queixas são contra funcionários de Hong Kong que não conseguiram manter a cidade a uma distância suficiente da China. Resmungando sobre “nosso dinheiro” usado para construir pontes e ferrovias, Wayne diz – erroneamente – que, sob a regra do “um país, dois sistemas”, que vigorará até 2047, Hong Kong “por enquanto não é China”. 

Tais conversas enfureceriam a maioria dos chineses do continente e irritam funcionários do governo central, que exercem um papel cada vez visível em Hong Kong. Regina Ip, uma destacada política pró-China, diz que “o território é infeliz”. Pela infelicidade ela culpa a má administração da economia, o que inclui uma crise habitacional e a falha em agarrar as oportunidades oferecidas por uma China em ascensão.

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Ip também acusa potências de se intrometerem. “Minha teoria da conspiração é que há pessoas tentando reproduzir um ‘4 de junho’ em Hong Kong”, diz ela, referindo-se à data do final sangrento das manifestações da Praça da Paz Celestial, em 1989. Para Ip, as autoridades centrais têm visão e pragmatismo, mas ela teme que o governo “enfraquecido” de Hong Kong vá agora se esconder para evitar promulgar leis que levem a discussões. 

Governos ocidentais enfrentam um dilema. Eles se sentem obrigados a criticar a lei de extradição em face dos protestos de empresários de Hong Kong. Mas, quando ativistas pró-democracia levam petições a consulados ocidentais em Hong Kong, como centenas fizeram em 26 de junho, a China usa isso para propaganda. 

O argumento mais forte do Ocidente é um apelo ao interesse da China. Líderes ocidentais pedem que Xi veja o que as estabanadas ações de seu partido podem causar a Hong Kong, um ativo valioso. No entanto, a cada ano são maiores as evidências de que Xi vê as coisas de outro modo. O que o preocupa são os danos que lugares problemáticos como Hong Kong podem causar ao Partido Comunista.

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Após protestos anteriores, o governo central ensaiou táticas de recuo. Permitiu a Hong Kong derrubar leis contenciosas, enquanto discretamente aumentava seu controle sobre o território. O Partido Comunista também reforçou o financiamento a candidatos legalistas para ocupar cargos públicos. E pediu a empresários apoio para planos governistas, fazendo com que líderes empresariais favoráveis comprassem espaço na mídia. Muitos esperam mais investidas do tipo, daí a cautela dos líderes pró-democracia. Eles podem temer um confronto com Xi. Ele, porém, não teme confrontá-los. / TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ © 2019 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM

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