LONDRES - Os deputados britânicos aprovaram nesta quarta-feira, 4, uma lei que obriga o governo a pedir um novo adiamento do Brexit, previsto para 31 de outubro, se um acordo não for alcançado com Bruxelas nas próximas semanas. Logo após a votação, o primeiro-ministro, Boris Johnson, propôs a antecipação das eleições para 15 de outubro, mas sofreu outra derrota – a terceira em suas três primeiras votações em plenário.
Enfraquecido pela perda da maioria parlamentar, na terça-feira, e pela imposição de um novo adiamento do Brexit, que, segundo ele, tira a força do governo para renegociar um tratado com a União Europeia, Johnson tentou hoje uma última cartada: antecipar as eleições. “O país deve decidir se é o líder da oposição ou se sou eu quem vai a Bruxelas tentar obter um acordo”, disse o premiê, em referência ao opositor trabalhista Jeremy Corbyn.
A manobra de Johnson precisava do apoio de dois terços da Câmara – 427 votos de um total de 650 (na realidade, um pouco menos de dois terços, já que os deputados nacionalistas irlandeses do Sinn Fein se recusam a sentar-se no Parlamento britânico). A moção do premiê, porém, teve apenas 298 votos favoráveis. “A oferta de novas eleições agora é como a bruxa má oferecer uma maçã para a Branca de Neve”, disse Corbyn. “O que ele (Johnson) está oferecendo é o veneno de um Brexit sem acordo.”
Os partidos de oposição e adversários do primeiro-ministro afirmaram que até seriam capazes de apoiar a antecipação das eleições, desde que antes o Parlamento assegure que o Reino Unido não deixará a UE sem um acordo comercial.
Diante das seguidas derrotas, cabe agora ao premiê decidir o que fazer. Entre as opções, ele pode cumprir a determinação do Parlamento e pedir a Bruxelas um novo adiamento, o que ele já rejeitou fazer, ou renunciar e forçar novas eleições – possibilidade que também já foi descartada por ele.
Na terça-feira, 3, os deputados decidiram abrir o debate sobre o projeto por 328 a 301. Os parlamentares tomaram o controle do cronograma do Brexit, após Johnson ter perdido a maioria na Casa, quando um parlamentar deixou o Partido Conservador e aderiu ao Partido Liberal-Democrata, de oposição.
As rusgas com o Parlamento se agravaram quando o premiê estendeu o período de recesso parlamentar, medida que iria dar a ele autonomia no andamento da saída do Reino Unido da União Europeia.
Em meio à confusão, os 21 dissidentes do Partido Conservador foram imediatamente expulsos da bancada parlamentar por Johnson. Entre os expulsos, estão Nicholas Soames, neto de Winston Churchill, ídolo de Johnson, e o ex-ministro das Finanças Philip Hammond.
Medidas de Johnson favorecem Brexit sem acordo
O atual prazo para o Brexit acaba em 31 de outubro. Desde que Johnson assumiu o cargo, em substituição a Theresa May, ele adotou duas medidas que, segundo analistas, tendem a facilitar uma ruptura unilateral com Bruxelas.
A primeira foi a ampliação do recesso do Parlamento. A segunda é a ameaça de antecipar eleições. Ambas dificultariam o debate parlamentar para a aprovação de um acordo.
Johnson é defensor de uma ruptura radical com a UE e um crítico do acordo negociado por May com Bruxelas. Os britânicos decidiram sair da UE com 52% dos votos na consulta popular realizada em junho de 2016.
Impasse sobre acordo dificulta o Brexit
Inicialmente previsto para ser concluído em março passado, o Brexit foi adiado duas vezes diante da rejeição do Parlamento ao Tratado de Retirada negociado por May.
Johnson chegou ao poder em 24 de julho, com a garantia de que vai tirar o país da UE em 31 de outubro - com, ou sem, acordo.
Qual o problema do Brexit sem acordo?
Deputados de todos espectros políticos temem as consequências de uma saída radical do bloco, que ameaça deixar o Reino Unido com escassez de alimentos, medicamentos e produtos importados, ao mesmo tempo em que faria a economia britânica perder bilhões de dólares em exportações.
A associação britânica de supermercados alertou hoje para a escassez de comida e aumento de preços caso o Reino Unido deixe a União Europeia sem acordo.
Segundo estimativas de agências do governo, do Banco da Inglaterra, do FMI e de empresas de consultoria, o PIB do Reino Unido será 3,9% menor, em 2034, em relação ao que seria se não houvesse Brexit. Em janeiro, um relatório da consultoria Ernst & Young revelou que bancos e firmas de investimento moveram US$ 1 trilhão do Reino Unido para a UE. / REUTERS e AFP