A polícia argentina impediu ontem o kirchnerista Martín Sabbatella de voltar ao prédio da instituição em que ele comandava a aplicação da Lei de Mídia até o presidente Mauricio Macri acabar com o organismo, por decreto, há duas semanas.
Sabbatella levava duas liminares que na segunda-feira suspenderam o efeito de três decretos presidenciais usados para extinguir a Autoridade Federal de Serviços de Comunicação Audiovisual (Afsca) e deixá-lo sem emprego.
O kirchnerista controlava a aplicação da lei cujo ponto mais controvertido determinava o desmembramento do Grupo Clarín, maior empresa de comunicação do país.
Em entrevista coletiva, Macri afirmou de manhã que o governo havia recorrido à Justiça e as liminares dos juízes Ivan Garbarino e Martina Forns já estavam sem efeito. “Neste momento, as decisões não têm aplicação”, disse.
Em frente à sede da antiga Afsca, no centro de Buenos Aires, Sabbatella acusou a polícia de descumprir as decisões judiciais ao barrá-lo. “Dizem que estão cumprindo ordens. Isso é um atropelo das instituições, da divisão de poderes. Mesmo que tenha havido uma apelação do governo, seria necessário uma decisão para as liminares perderem o efeito. Brincam com a decisão dos juízes”, protestou, prometendo denunciar à Justiça o fato.
Proteção. Policiais que cercam o edifício desde a intervenção ordenada por Macri há duas semanas alegaram que obedeciam ordem de Agustín Garzón, nomeado temporariamente por Macri para promover auditorias e demitir funcionários em cargos de confiança.
Sabbatella tinha mandato até 2017 à frente da Afsca. Diante da resistência do militante kirchnerista em abandonar o posto, Macri fundiu a instituição a outro órgão do setor e criou o Ente Nacional de Comunicação (Enecom).
Além de desempregar Sabbatella, a manobra tirou vigência de partes da Lei de Mídia, aprovada pelo Congresso em 2009 e considerada constitucional pela Justiça em 2013.
O governo diz que Sabbatella usava a legislação para beneficiar meios de comunicação alinhados ao kirchnerismo e perseguir outros como o Clarín, sob o argumento de combater monopólios no setor. O conglomerado chegou a apresentar um plano de adaptação à lei, vendendo empresas voluntariamente, recusado pelo kirchnerismo sob alegação de que a venda de algumas áreas seria cruzada.
Com a vitória de Macri na eleição de novembro, a empresa, que garantia a manutenção de sua estrutura com ações de efeito provisório obtidas na Justiça, deixou de correr risco de divisão. Sabbatella tem convocado atos contra Macri para defender a aplicação da norma.
Os juízes federais que concederam as liminares na segunda-feira são ligados ao kirchnerismo. Eles aceitaram recursos apresentados por uma associação de consumidores e uma organização de comunicação popular. Ambos argumentaram que Macri avançou sobre atribuições do Legislativo.
O uso de decretos pelo presidente durante o recesso do Parlamento, que volta à atividade em 1.º de março, é alvo de críticas mesmo de aliados. Sua medida mais contestada foi a nomeação provisória de dois juízes para a Corte Suprema.
A posse de ambos foi adiada em razão da repercussão negativa. O procedimento tradicional é que as indicações passem pelo crivo do Senado, o que deve ocorrer em março.