OSLO - Em uma decisão que deixou muita gente surpresa, a União Europeia (UE) foi anunciada como a vencedora do Prêmio Nobel da Paz. Os mais surpresos com a premiação foram os próprios noruegueses. No país, que sedia anualmente o anúncio do prêmio, 80% da população rechaça a possibilidade de ingressar na UE.
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Os principais motivos da decisão em conceder o prêmio ao bloco foram suas conquistas históricas em termos de "reconciliação e paz, direitos humanos e democracia na Europa". "Desde o fim da Segunda Guerra Mundial, nunca mais França e Alemanha entraram em guerra", leu Thorbjorn Jagland, presidente do Comitê do Prêmio Nobel da Paz, na declaração oficial. A confirmação da inclusão da Croácia na União Europeia a partir de julho de 2013 e as negociações envolvendo o ingresso de Sérvia e Montenegro no bloco permearam o discurso: "Esse processo de paz, depois de passar pela queda do Muro de Berlim em 1989, está se expandindo aos Bálcãs", reforçou.
A crise econômica na Europa, tema recorrente na cobertura jornalísticas recente da região, foi citada apenas uma vez. "Estamos focando nas conquistas em termos de direitos humanos e democracia", declarou Jagland. Segundo ele, a questão financeira e o euro "não são nosso foco".
Jagland, 62 anos, já foi premiê (1996-1997) e chanceler (2000-2001) da Noruega. Em 2009, depois de quatro anos como presidente do Parlamento norueguês, passou a presidir o Comitê de Premiação do Nobel da Paz. Antigo defensor do projeto europeu e do ingresso da Noruega no bloco, Jagland escreveu em 1990 o livro "Meu sonho europeu". Ao ser questionado se seu sonho foi realizado com o Nobel da Paz ou se continua sendo apenas um sonho, respondeu: "É um processo contínuo. Precisamos continuar sonhando". Leia a seguir trechos da entrevista que ele concedeu nesta sexta ao Estado em Oslo.
Estado: O Brasil nunca foi agraciado com o Nobel da Paz, mas o prêmio se destina a reconhecer quem contribui com a paz no mundo. De que forma o senhor acha que esse prêmio vá impactar no Brasil?
Thorbjorn Jagland: Eu não sei, eu não sei. Acho que é importante entender o que está por trás do prêmio. Foram 60 anos de paz na Europa como jamais tivemos. Havia antes um processo de paz contínua, guerras entre países, França e Alemanha. Até há pouco mais de dez anos ainda tínhamos guerras nos Bálcãs.
Estado: Mas o senhor acha que o Brasil um dia terá um premiado?
Thorbjorn Jagland: Eu espero que sim, mas nós não distribuímos o prêmio por regiões geográficas.
Estado: Que repercussão o senhor espera para este anúncio?
Thorbjorn Jagland: Vai haver muito debate, em especial na Noruega. Muita gente vai gostar, alguns não vão gostar. Mas o importante é a mensagem de que a União Europeia não pode se desintegrar depois de todo esse histórico.
Estado: 80% dos noruegueses são contra a eventual entrada da Noruega na UE. O que isso tem a ver com o anúncio do prêmio aqui em Oslo?
Thorbjorn Jagland: Nada a ver. Nossa preocupação é com o processo de paz no continente.
Estado: Ter concedido o prêmio para a UE e não para uma pessoa que tenha contribuído para esse processo de paz não é resultado da falta de lideranças de destaque hoje no continente, especialmente nesse período de crise?
Thorbjorn Jagland: Nós já demos o Nobel da Paz duas vezes para a ONU, por exemplo. Não é novidade dar o prêmio para uma organização. Nós demos à União Europeia o prêmio porque seria difícil achar uma única pessoa responsável pelo que aconteceu e queremos valorizar as instituições.
Estado: Valorizar as instituições políticas em primeiro lugar, e a economia nesse caso ficaria em segundo plano?
Thorbjorn Jagland: Bem, a economia depende muito das instituições, e a União Europeia auxiliou muito, através das suas instituições, na integração econômica do continente.
Estado: Quem o Comitê vai convidar para receber o prêmio em dezembro aqui em Oslo? Será o presidente do Conselho Europeu, da Comissão Europeia, do Conselho de Ministros ou do Parlamento Europeu?
Thorbjorn Jagland: Nós demos o prêmio à União Europeia. A instituição terá de decidir quem vem buscar o prêmio.
Estado: O senhor escreveu o livro "Meu sonho europeu". O anúncio do Prêmio Nobel realiza seu sonho ou o senhor continua sonhando?
Thorbjorn Jagland: (Ri) É um processo contínuo. Precisamos continuar sonhando.
Estado: O senhor soube que o vencedor do prêmio foi vazado à imprensa 40 minutos antes do anúncio?
Thorbjorn Jagland: Soube.
Estado: A que se dá isso?
Thorbjorn Jagland: Todo o processo ocorre a portas fechadas, nessa sala (aponta ao redor e à mesa onde estamos sentados). Nada pode vazar.
Estado: Mas vazou.
Thorbjorn Jagland: Nas últimas horas o governo norueguês precisa ser informado, e aí o processo vai adquirindo um tamanho que não possui quando somos só nós do Comitê dentro da sala. Infelizmente às vezes acaba vazando.
Estado: E sempre quem vaza é a própria imprensa norueguesa...
Thorbjorn Jagland: (Faz que sim com a cabeça e encaminha-se para as fotos).