Reino Unido abre mão do mercado único europeu para concretizar Brexit

Europeus exigiam que britânicos desistissem de acesso privilegiado se não aceitassem livre movimento de pessoas, mercadorias, serviços e capitais; decisão de sair da UE será submetida ao Parlamento

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Por Jamil Chade , Correspondente e Genebra
Atualização:

Após sete meses de incertezas, o governo britânico anunciou ontem um plano detalhado para a saída do Reino Unido da União Europeia e confirmou que o acordo final do Brexit será submetido a votação no Parlamento. Os primeiros detalhes foram apresentados pela primeira-ministra, Theresa May. 

Ela afirmou que o Brexit significará de fato a saída do mercado comum europeu, mas vai propor um acordo que substitua os atuais entendimentos. 

A premiê britânica, Theresa May, afirmou que acordo final do Brexit será votado pelo Parlamento Foto: AFP PHOTO / POOL / Kirsty Wigglesworth

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“O que proponho não pode significar pertencer ao mercado único, que nos impediria de negociar nossos acordos comerciais”, explicou. Segundo ela, o Reino Unido não quer estar “meio dentro, meio fora” da UE. “Quero novos acordos comerciais não apenas com a UE, mas com velhos amigos e novos aliados”, disse. 

A declaração foi recebida pelos demais líderes europeus com um misto de alívio – por finalmente existir um plano – e críticas diante do que parece ser uma estratégia de Londres de manter certas vantagens do bloco europeu, sem ter de assumir compromissos em termos de imigração e soberania.

A partir de março, cerca de 700 dossiês terão de ser debatidos por diplomatas de Londres e Bruxelas e o processo pode durar dois anos para definir questões como comércio, armas nucleares, imigração, investimentos, bolsas de estudos, vistos de trabalho e centenas de outras regras que, em quase meio século, foram criadas de forma conjunta.

Desde junho de 2016, os europeus cobravam uma posição clara de Londres sobre a saída ou não do Reino Unido do bloco, depois do resultado do referendo. Os mercados também reagiram de forma positiva aos esclarecimentos e a libra esterlina se fortaleceu. May também prometeu que o Reino Unido passará a ser uma “nação comerciante global”, o que foi ironizado por europeus.

Seu discurso foi interpretado como um reconhecimento por parte dos britânicos de que não poderão recuperar o controle das fronteiras e, ao mesmo tempo, manter-se no mercado comum. Nos dias que se seguiram ao referendo britânico, a chanceler alemã, Angela Merkel, deixou claro que não aceitaria uma situação em que Londres poderia ter as vantagens do bloco, sem os compromissos. 

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Deixar o mercado único é pré-requisito para que Londres também possa cumprir a promessa de acabar com a livre circulação de pessoas e retomar o controle fronteiriço. A primeira-ministra britânica afirmou que quer um novo acordo alfandegário com o bloco europeu e também insistiu que o sucesso da UE é do interesse de seu país.

Na Organização Mundial do Comércio (OMC) e entre diplomatas britânicos, o temor é de que, se um novo acordo comercial entre o Reino Unido e Bruxelas não estiver concluído até abril de 2019, a UE poderá passar a tratar Londres como qualquer outro parceiro, com tarifas de importação que trariam bilhões de euros em perdas. 

May insistiu que não vai aceitar que Bruxelas ponha o Reino Unido em um “purgatório político permanente”. Mas negociadores europeus alertaram que, jamais em sua história, a UE conseguiu fechar acordos comerciais em dois anos. 

Parlamento. Outro anúncio de May foi de que o acordo final, em 2019, será submetido a votação nas duas Câmaras do Parlamento. Em novembro, a ideia de levar o processo ao Parlamento foi considerada uma manobra para tentar enterrar o Brexit. Mas, ontem, assessores de May insistiram que o acordo final será submetido à votação de uma maneira em que dificilmente haveria como derrubar o projeto, após dois anos de negociações.

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