Próximo de China e Venezuela, governo tem atritos com EUA

Queda no fluxo de auxílio internacional e tentativa de restabelecer Forças Armadas são questões críticas para presidente

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Por Renata Tranches
Atualização:

Novato na política, o presidente haitiano, Jovenel Moise, precisará usar agora sua habilidade comercial de homem de negócio para administrar as relações de seu país em um novo contexto internacional. Com o fim da missão da ONU no país, haverá também uma grande retirada, por parte de ONGs e recursos internacionais nos quais os governos haitianos vinham se apoiando havia anos. 

Ao mesmo tempo, um novo personagem entra em cena: a China, com a promessa de investimento de bilhões de dólares para os próximos anos. Essa nova conjuntura, segundo o diretor de pesquisa do Instituto Igarapé, Robert Muggah, significa uma reconfiguração nas relações internacionais do país, que se afasta da esfera americana e europeia e se aproxima da chinesa, há tempos aumentando sua influência na região. Pesa nesse contexto, ainda, a grave crise na Venezuela, de quem o Haiti recebeu ajuda ao longo dos últimos anos em petrodólares. 

Jovenel Moise, presidente do Haiti Foto: REUTERS/Andres Martinez Casares

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Analistas observam que com a ajuda financeira internacional veio também um sentimento de interferência externa na política local, algo que o presidente prometeu combater. Com um forte discurso nacionalista, Moise prometeu criar empregos, fortalecer a economia e restabelecer as Forças Armadas, desmontadas pelo ex-presidente Jean-Bertrand Aristide nos anos 90. 

Os investimentos estrangeiros da China, que segundo Muggah devem começar chegar entre o fim deste ano e o início do próximo e são estimados em US$ 30 bilhões, devem ajudar Moise a pôr em prática parte das promessas. Uma parcela significativa dos investimentos, como afirmou Muggah, deve ir para setores de infraestrutura e desenvolvimento. 

Um dos acordos foi assinado este mês entre a companhia haitiana Bati Ayiti e a Southwest Municipal Engineering and Design Research Institute of China, e prevê a construção de uma planta energética de 600 megawatts para fornecer energia à capital, Porto Príncipe, além da construção de uma nova sede para a prefeitura, mercados e apartamentos. 

O fornecimento de energia 24 horas por dia era uma das benfeitorias que os haitianos esperavam ver com a nova administração, cuja vitória eleitoral foi contestada por meses. No entanto, sete meses depois de Moise assumir o poder, ela está longe de ser realidade para a população. 

Militares. Uma das promessas, no entanto, avança. O restabelecimento das Forças Armadas no país não é algo novo e outros líderes haitianos prometeram fazê-lo, incluindo o padrinho político de Moise, o ex-presidente Michel Martelly. Agora, o plano começa a ganhar força, sob críticas internacionais.

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Em julho, foram abertas vagas para 500 recrutas e, segundo Muggah, outros 2 mil aguardam para ser avaliados. “Essa é uma questão muito politizada e divisora. Muitas pessoas não querem o retorno das Forças Armadas pelas memórias dos anos dos Duvaliers (o ditador François ‘Papa Doc’ e seu filho Jean-Claude, o ‘Baby Doc’). Mas certamente há algumas pessoas da elite e da direita, incluindo o presidente, que querem vê-las de volta”, afirma Muggah. A recriação do Exército é um tema que preocupa e desagrada à comunidade internacional que vinha fornecendo ajuda ao Haiti, como os EUA, por exemplo. 

Outra questão que é controvertida – e provoca irritação no governo haitiano – é a pressão imposta pelas Nações Unidas e pelos EUA com relação a Guy Philippe, senador eleito no Haiti.

Responsável por liderar as forças paramilitares contra o presidente Aristide em 2003, Philippe é considerado um narcotraficante internacional e foi detido em janeiro no Haiti – antes da posse de Moise. Ele foi enviado aos EUA, onde foi condenado a 9 anos de prisão por aceitar suborno para proteger traficantes de cocaína.

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