O ministro britânico para o Brexit, David Davis, anunciou nesta terça-feira que o governo da premiê Theresa May prepara uma proposta à União Europeia para pagar pelo acesso ao mercado único após o desligamento do Reino Unido do bloco. O acordo enterra a ideia de uma ruptura brusca entre os dois lados e valeria por um “período de transição”, que permitiria a Londres abrir negociações para tratados bilaterais de livre-comércio.
O documento com a proposta britânica foi apresentado ontem por Davis, primeiro em entrevista às redes ITV e BBC e, a seguir, em trechos de um documento que consolida a proposta a Bruxelas. A oferta prevê a criação de uma “união aduaneira temporária”, a partir de março 2019, imediatamente após a conclusão do Brexit. Assim, as empresas britânicas e europeias garantiriam a manutenção de seus laços. O Reino Unido vende € 230 bilhões à União Europeia, enquanto o continente vende € 290 bilhões à ilha.
“Nosso objetivo é garantir as trocas comerciais com o menor impacto possível com a UE e ter a possibilidade de forjar acordos comerciais em todo o mundo”, diz o documento. O acordo temporário com Bruxelas permitiria a Londres ganhar “o tempo necessário para colocar em prática os futuros acordos aduaneiros”. Na prática, o texto enterra de vez a ideia do “Brexit duro”, desejado por May até as eleições legislativas de junho, que resultaram em uma vitória amarga, sem maioria para o Partido Conservador.
Segundo Davis, o Reino Unido deixaria o bloco e o Espaço Econômico Europeu, mas assinaria um acordo idêntico ao atual no período de “pós-Brexit”, mantendo quase a mesma relação econômica hoje existente.
Questionado sobre como o governo de May convenceria a União Europeia a aceitar esse arranjo – contrário à atual posição de Bruxelas –, Davis deu a entender que seria necessário pagar pelo acesso ao livre-comércio, mas não no atual volume transferido de Londres a Bruxelas.
“O que acontecerá no período transitório terá de ser negociado. Mas o objetivo é acabar com o pagamento anual de quase ¤ 11 bilhões”, disse, referindo-se à contribuição britânica ao orçamento do bloco.
Interromper as remessas de dinheiro de Londres para Bruxelas era um dos objetivos do divórcio e a disposição de pagar pela manutenção das trocas comerciais mostra a dificuldade do governo de encontrar soluções para o impasse político e econômico.
A proposta foi criticada pela oposição. Chris Leslie, deputado do Partido Trabalhista e membro do centro de estudos Open Britain – que defende a permanência na UE –, definiu a oferta como uma fantasia. “É fantasia imaginar que nós poderemos ter trocas comerciais o mais livres possíveis e sem conflito com nosso principal parceiro quando o governo está determinado a retirar o Reino Unido da união aduaneira”, disse.
Em Bruxelas, o negociador europeu para o Brexit, Michel Barnier, foi lacônico sobre as pretensões de Londres. Sem responder se a proposta seria debatida , Barnier exortou o governo de May a avançar nos temas que estão na mesa de negociações neste momento: os direitos de cidadãos britânicos e europeus, a conta do divórcio – Londres já começa a aceitar que o custo do Brexit será de no mínimo € 40 bilhões – e a questão da fronteira entre a Irlanda do Norte e a Irlanda. Entre analistas britânicos e europeus, cresce a convicção de que Londres não tem uma estratégia clara para as negociações.