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Rota para a Jihad: dos bairros nobres do Cairo às decapitações no EI

Como um jovem egípcio de classe alta se tornou combatente do grupo extremista que tomou um terço do Iraque e da Síria

Por MAHMOUD MOURAD
Atualização:
O Egito está ciente dos riscos de civis viajarem em razão de causas jihadistas e, depois, voltarem Foto: AP

Depois de deixar sua vida de classe alta no Cairo para combater com o grupo militante Estado Islâmico na Síria e no Iraque, Yunes diz que aprendeu a trabalhar como atirador, a usar artilharia pesada e decapitar prisioneiros usando a técnica adequada.

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Um ano depois, ele nutre o tipo de ambição que pode criar um pesadelo de para as autoridades de segiurança egípcias: voltar para casa e içar a bandeira negra do EI no Egito enquanto seus camaradas tomam grandes porções do Iraque e da Síria.

Eventualmente, diz Yunes, ele e outros combatentes egípcios no EI pretendem derrubar o governo apoiado pelos EUA e estender o califado à maior nação árabe. "Não vamos conseguir mudar a situação no Egito de dentro, mas o Egito pode ser aberto do exterior", disse Yunes, que pediu para seu sobrenome ser preservado, em uma entrevista conduzida por meio do Facebook.

A agência Reuters encontrou Yunes por meio de apoiadores do EI em redes sociais. Outro combatente do EI identificou-o como um militante no grupo. Indicadores de localização no seu perfil colocam-no na Síria.

O Egito está ciente dos riscos de civis viajarem em razão de causas jihadistas e, depois, voltarem. Egípcios que combateram as tropas de ocupação soviéticas no Afeganistão nos anos 80 eventualmente assumiram a guerra santa em casa, treinando sua mira em forças de segurança egípcias e planejando ataques à bomba.

As chances de os militantes do Estado Islâmico estabelecerem um califado no Egito são mínimas: o governo acabou com todos os grupos que se atreveram a tentar.

Mas o retorno de combatentes com experiência no Iraque e na Síria podem certamente trazer mais violência e complicar esforços para estabilizar um país que sofre com agitação política, com dois presidentes derrubados desde 2011.

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Fontes de segurança egípcias dizem que eles estão monitorando de perto os confrontos no exterior e têm uma lista de nomes em aeroportos para prendê-los ao chegarem.

JIHAD

Yunes era um estudante de 22 anos no centro de estudos islâmicos de mil anos no Cairo quando ele decidiu aderir ao mais perigoso grupo militante do mundo.

Como o líder da Al-Qaeda, Ayman al-Zawahiri, ex-médico, ele vem de uma família rica de Maadi, um subúrbio de alto padrão no Cairo. Ele aprendeu sobre o Islã muito jovem com a mãe, mas compartilhava interesses de qualquer outro jovem egípcio: o amor pelo futebol e artes marciais como o Kung Fu.

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Yunes participou dos protestos que acabaram com 30 anos de governo de mão-de-ferro do presidente Hosni Mubarak em 2011. Mas ele também rejeitou a Irmandade Muçulmana, grupo islâmico que subiu ao poder após Mubarak. Ele chama Mohamed Morsi, líder da Irmandade que se tornou presidente até ser derrubado pelo Exército no ano passado, um apóstata por optar por conceitos como eleições em vez do domínio radical islâmico.

O homem que derrubou Morsi, o então comandante das Forças Armadas Abdel Fattah al-Sissi, agora presidente do Egito, era "ainda mais blasfemo", segundo Yunes. Sissi prometeu acabar com os militares, incluindo os inspirados pelo EI.

Forças de segurança do governo mataram centenas de partidários da Irmandade Muçulmana nas ruas do Cairo depois que Morsi foi derrubado no ano passado. Mas Yunes disse que derramamento de sangue não foi um fator determinante na sua decisão de abraçar a causa do EI. Sua motivação era muito mais profunda - um desejo candente de derrubar tiranos árabes como Mubarak, Morsi e Sissi, além de criar um califado.

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Yunes foi atraído à Síria porque o país tornou-se abrigo para militantes de todas as partes do mundo com o objetivo final de remover de seus países natais a "abominação dos tiranos".

Juntar-se ao EI não foi algo simples e direto. Um membro do EI precisou indicar Yunes depois de ele comprovar suas capacidades em outro grupo militante na Síria, onde ele chegou da Turquia. "O EI não é como outras facções. Não aceita ninguém até conseguir aval de um membro do grupo", disse ele.

Eventualmente, ele foi treinado por um comandante egípcio. Yunes tornou-se um atirador, aprendeu como usar armamentos pesados em um campo de treinamento na Síria e combateu em grande batalhas no vizinho Iraque, disse ele.

Entre as habilidades que ele aprendeu estava a técnica correta para decapitações. Ele disse que levou a cabo esse tipo de execução, mas não disse quem eram as vítimas ou quantas ele matou. Aqueles que foram mortos mereceram o seu destino porque participaram da matança de muçulmanos, disse ele.

O EI divulgou um vídeo na terça-feira que mostrava a decapitação do jornalista americano Steven Sotloff. O carrasco parecia ser o mesmo homem com sotaque britânico que apareceu no vídeo do dia 19 da execução de outro jornalista americano, James Foley.

O EI surgiu de um ramo iraquiano da Al-Qaeda. Mas diferentemente de sua organização-mãe, especializada em táticas de ataque e fuga rápida, além de ataques suicidas, desenvolveu-se em uma organização militar que conquista terras para ampliar o seu autoproclamado califado.

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