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Tabaré Vázquez herda pendências da popular era Mujica

Presidente que toma posse no Uruguai deve controlar gastos das empresas públicas e realizar reformas em áreas como educação

Por Renata Tranches
Atualização:

Cinco anos depois de passar o cargo para José “Pepe” Mujica, Tabaré Vázquez receberá das mãos dele, neste domingo, 1º, a presidência do Uruguai. Ao suceder um governo marcado pela alta aceitação popular, com uma economia em crescimento e taxas de desemprego em níveis historicamente baixos, o novo presidente herda também pendências. 

Com um estilo diferente de governar, Tabaré não deverá fazer mudanças drásticas nas políticas de seu predecessor, mas, segundo especialistas consultados pelo Estado, ajustes devem ser feitos em setores que têm provocado descontentamento. 

Retorno. Tabaré Vasquez cumprimenta partidário da Frente Ampla na despedida de Mujica: presidente volta ao poder Foto: AFP PHOTO / PABLO PORCIUNCULA

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Em primeiro lugar, apontam, está a educação. “Há muita insatisfação pelo pouco que se tem feito (na área)”, destaca o cientista político Daniel Chasquetti, do Instituto de Ciência Política da Universidade da República, de Montevidéu. Segundo o analista, o novo presidente tem pensado em uma reforma que teria como foco primordial a área do ensino médio. 

O setor, de uma maneira em geral, sofreu com a falta de progresso nos últimos anos, como reiterou o professor uruguaio Francisco Panizza, especialista em América Latina da britânica London School of Economics. 

Deverá haver mudança também na política internacional, que ganhou destaque com Mujica. Em geral, segundo Chasquetti, a agenda de Tabaré será “mais comercial” e “tentará contar mais com o respaldo da oposição” uruguaia. 

Nesse sentido, segundo Panizza, a tendência será fortalecer as já boas relações com o Brasil e com os EUA, além de dar uma importância maior aos tratados de livre comércio em andamento, como o que se negocia há anos entre o Mercosul e a União Europeia. 

Com a Argentina, os analistas não veem mudança a curto prazo e as relações devem continuar complicadas política e economicamente enquanto Cristina Kirchner for a presidente. Em sua última semana como presidente, Mujica criticou a Casa Rosada por não “acompanhar a integração regional”. 

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O fato de a presidente não ir à posse no país vizinho, segundo o professor Panizza, é muito significativo. Chasquetti destacou que ela enviou como representante seu vice, Amado Boudou, enquanto os principais países da região terão seus presidentes na cerimônia deste domingo. 

A escolha não foi por acaso, na avaliação do cientista político, e é também um sintoma da relação bilateral. Há duas semanas, um juiz uruguaio concedeu uma ordem de detenção e extradição para o suposto “testa de ferro” de Boudou, Alejandro Vandenbroele, investigado na Argentina em um caso de lavagem de dinheiro. No dia 20, ele foi preso pela Interpol na Província de Mendoza. 

Outra grande expectativa com o governo Tabaré está na comercialização legalizada de maconha no país, aprovada por Mujica e esperada para começar até abril. 

Desde que foi eleito, Tabaré prometeu não reverter a política, mas adiantou que faria algumas emendas. Segundo Chasquetti, o novo presidente não quer que ela seja vendida nas farmácias e, por isso, ele poderá fazer mudanças nos decretos regulatórios. 

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Segundo o jornal uruguaio El País, o Estado ainda não selecionou as empresas que farão o cultivo da maconha. Como consequência, o plantio nem começou, o que naturalmente deve atrasar as vendas. De uma forma em geral, diz o jornal, os aspectos centrais da lei que legalizou o mercado da maconha no país - uma iniciativa que chamou a atenção do mundo - ainda não foram iniciados. 

Ajustes econômicos. A economia uruguaia também deverá entrar em uma nova fase sob a presidência de Tabaré - de ajustes. “Umas das áreas mais críticas no governo Mujica tem a ver com a falta de controle nos gastos de investimentos das empresas públicas, que contribuíram para um déficit fiscal elevado”, criticou Panizza. 

Mujica, que assumiu, em 2010, com um déficit público de 1,7% do PIB, deixa o cargo com essa taxa em 3,5%. 

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“Se o crescimento for menor, a festa será modesta”, alertou Chasquetti, acrescentando que o cenário poderá causar insatisfação em certos setores sociais. Há dez anos no poder, a Frente Ampla - coalizão que governa o Uruguai - não poderá se arriscar em 2020, quando enfrentará uma eleição mais complexa. 

“Suas três figuras principais estarão muito velhas e será tempo de renovações profundas”, afirma o cientista político. 

“A diferença das eleições anteriores, nas quais os candidatos faziam a diferença, é que, na próxima, as conquistas ou fracassos do governo serão muito mais importantes.”

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