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Um desafio à cadeia semanal de Cristina Kirchner

Radialista que já ouvia piadas por ter programa cortado por transmissões - 27 no ano - se rebela

Por Rodrigo Cavalheiro , CORRESPONDENTE e BUENOS AIRES
Atualização:

Na noite de quarta-feira, quando a presidente Cristina Kirchner entrou em cadeia nacional pela 27.ª vez em 27 semanas para anunciar obras e elogiar candidatos governistas, o radialista Pablo Rossi disse a si mesmo: "hoje não". Cansado de ouvir piadas dos companheiros da Cadena3, emissora de Córdoba, de que o verdadeiro objetivo presidencial era tirá-lo do ar Rossi, ele surpreendeu ao vivo: "Advertimos que no instante que começar a cadeia nacional, continuaremos nossa programação habitual pela internet e pelos aplicativos para celular." Seu programa Enfoques vai ao ar das 19 horas às 20 horas, bem no horário em que a presidente gosta de falar.

"Estão me ligando até de rádios do governo, do exterior. Acho que houve repercussão positiva, pois todo mundo já está cheio do uso vulgarizado da rede nacional. Não sou um herói", disse Rossi ao Estado.

O aviso de que há uma transmissão obrigatória às vezes ocorre minutos antes da interrupção da programação. Na de quarta-feira, Cristina inaugurou obras educacionais e criticou quem insinuou que ela buscaria uma candidatura para ter proteção contra investigações na Justiça. "Digam 'me enganei, sorry'", provocou. Ela deixa o poder em 10 de dezembro, após oito anos de governo.

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Uma de suas principais bandeiras foi a Lei de Mídia, aprovada em 2013. Além de pretender desmembrar grandes meios de comunicação - o governo mantém uma disputa judicial com o Grupo Clarín, que se sustenta em liminares - a legislação autoriza o uso da rede nacional "em situações graves, excepcionais ou de transcendência institucional". Este ano, Cristina a usou para inaugurar uma fábrica de cosméticos, da qual ganhou uma cesta de produtos capilares e celebrou uma nova unidade de produção de refrigerantes, com a ressalva de que em nenhum país se consome tanto essa iguaria - 137 litros por habitante.

A decisão de usar uma brecha na Lei de Mídia contra sua criadora foi da direção da rádio, tomada pouco antes de o programa entrar no ar. Uma vez que a norma fala de transmissão obrigatória em "cadeia de rádio e TV", mas não menciona internet, a empresa julgou estar fora de perigo. "O que não é proibido é permitido", sustenta Rossi.

A representante da Fundação LED (Liberdade de Expressão + Democracia), Silvana Giudici, ex-deputada da oposição, afirmou que não se surpreenderá se o kirchnerismo tentar regular a web, caso a iniciativa seja copiada por TVs e rádios. A Cadena3 estima atingir meio milhão de ouvintes e os vinha estimulando a baixar o aplicativo. "Funcionou também comercialmente. O futuro do rádio também está na web", pondera Rossi.

A iniciativa teve repercussão em meios tradicionais, que perdem em publicidade - cada discurso tem em média 38 minutos, mas há registro de duas horas. Houve também uma onda de apoio espontânea no Twitter, com mensagens na hashtag #bastadecadena. Outros subiam montagem de fotos contra o hábito presidencial. Numa delas, Os Simpsons aparecem desmaiados diante da TV.

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