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Centros eleitorais abrem para a primeira eleição legislativa no Líbano em nove anos

Instabilidade na região gerada pela guerra na Síria motivou ampliações do mandato no Parlamento libanês em 2013, 2014 e 2017

Atualização:

BEIRUTE - Os centros eleitorais no Líbano abriram neste domingo, 6, suas portas para que os cidadãos possam votar na eleição parlamentar, a primeira em nove anos. Cerca de 3,5 milhões de libaneses foram convocados às urnas desde as 7h (horário local, 1h em Brasília) até as 19h (13h) para escolher 128 deputados entre os 700 candidatos sob uma nova lei eleitoral, aprovada em 2017, que estabelece um sistema proporcional, mas mantém a divisão do eleitorado em função da sua religião.

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Estas eleições acontecem depois de três ampliações do mandato no Parlamento, em 2013, 2014 e 2017, amparado pela instabilidade política gerada pela guerra na vizinha Síria.

Libaneses esperam na fila para votar na primeira eleição legislativa do país em nove anos. Foto: Wael Hamzeh/EFE/EPA

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No colégio misto de Ras Beirute, uma zona com população muçulmana e cristã no oeste de Beirute, os eleitores só começaram a chegar 20 minutos depois da abertura das portas. Os membros das mesas eleitorais chegaram cedo para assumir seus postos e foram os primeiros a votar.

Uma deles, Mariam, de 40 anos, disse à Agência Efe que votou no partido Corrente do Futuro, do atual primeiro-ministro, Saad Hariri, embora não tenha dito por quê.

Uma vez seladas as urnas, começará o apuração que, segundo o previsto, deve terminar antes da madrugada de segunda-feira. Os analistas não esperam grandes mudanças na configuração do Parlamento, hoje controlado pelo grupo xiita Hezbollah; o sunita Corrente do Futuro e o cristão Corrente Patriótica Livre, do presidente Michel Aoun, as três principais forças deste sistema que divide cotas entre as diferentes confissões religiosas.

Pela primeira vez, este pleito acontece sob o sistema proporcional e com voto preferencial sob a supervisão, entre outros, da União Europeia (UE).

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Desaparecidos. O Comitê de Parentes de Desaparecidos e Sequestrados durante a Guerra Civil Libanesa (1975-1990) luta para que suas reivindicações sejam finalmente consideradas nas eleições legislativas deste domingo. O número estimado de sequestrados ou desaparecidos durante o conflito na Líbia é de 17 mil, sendo que milhares seguem em paradeiro desconhecido. Por isso, o comitê criou uma "lista eleitoral" simbólica na qual aparecem os sumidos, como uma forma de honrar sua memória e reivindicar o direito à justiça.

A presidente do órgão, Wadad Halwani, disse à Agência Efe que essa lista é a única das 77 que concorrem no pleito que inclui "candidatos" desaparecidos, procedentes de todas as comunidades religiosas que convivem no Líbano e de todas as regiões do país, ainda que na realidade não possa ser escolhida. "Só votaremos naqueles candidatos que se comprometeram, por escrito, a aprovar no parlamento o projeto de lei que elaboramos em 2001 e que segue nas gavetas desta instituição", disse Halwani, em referência a uma proposta que está sendo estudada por uma comissão parlamentar.

Os familiares dos desaparecidos, assim como ONGs e outras vozes, pedem que se recolham e conservem amostras de DNA, que se forme um órgão oficial de investigação, além de declarar o dia 13 de abril como dia nacional em memória destas vítimas, já que foi nesta data que o conflito começou em 1975.

"Não queremos saber quem desapareceu com eles, mas sim que os libaneses reflitam sobre a guerra e aprendam as lições para que o conflito nunca se repita", explicou Halwani. "Os políticos atuam como se nada tivesse acontecido e como se não se importassem com uma nova guerra", denunciou.

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No caso de Halwani, seu marido desapareceu em 1982 e ela assegura que sua dor continua até hoje, ainda que tenha aceitado a ideia de que provavelmente ele esteja morto. "Acredito que esteja morto. Se não o mataram, é certo que não conseguiu sobreviver (...), mas existem mães que não pensam igual e criam expectativas de que poderão voltar a ver seus filhos", acrescentou.

Abir Halaui, outra ativista que luta pelos desaparecidos, assegura que "a maioria (dos libaneses) busca esquecer o que aconteceu, não pensar nisso e seguir em frente", mas para ela "a guerra nunca acabará enquanto não se descobrir o que houve com essas pessoas".

"Existem 17 mil desaparecidos e os familiares têm o direito de saber o que ocorreu com eles", frisou.

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Por isso, o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) também está no Líbano apoiando a causa e exige há anos das autoridades locais respostas e a aprovação da lei específica sobre o assunto. Antes das eleições, o CICV intensificou a campanha na qual apoia o direito das famílias de saber o destino de seus entes queridos e divulgou um vídeo no qual é possível ver parentes votando nos desaparecidos e introduzindo fotos deles nas urnas, em vez das cédulas eleitorais.

Além disso, a organização humanitária lembra que os ausentes não poderão votar hoje, publicando fotos antigas com nome, como e quando desapareceram, muitos deles há mais de 30 e até 40 anos.

Uma candidata que concorre por Beirute na lista cidadã Kuluna Watani (Todos pela pátria, em português), Laury Haytayan, declarou à Efe que para ela "é muito importante o tema dos desaparecidos, pois continua sendo uma ferida aberta da guerra, que não acabou".

"Agora não existem combates e nem violência, mas nada foi feito para terminar com algumas questões pendentes, falar das consequências do conflito armado e fazer justiça", finalizou.

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