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A volta das queimadas

Por Afra Balazina
Atualização:

Em julho as queimadas começam a preocupar e, a partir de agosto, fica tudo ainda mais crítico. No ano passado o País todo sofreu com os incêndios, e muitos parques e florestas foram afetados.

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Conversei com o pesquisador brasileiro Luiz Aragão, que está na Universidade de Exeter, sobre o assunto. Ele atua num projeto para avaliar os impactos das queimadas de 2010 na Amazônia.

O trabalho é financiado pelo Conselho de Pesquisa Ambiental da Inglaterra em colaboração com a Universidade de Lancaster, a Universidade Federal do Acre, Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o Instituto Centro de Vida (ICV) e a agência espacial americana (Nasa). 

O desmatamento no ano passado foi o menor na história. Mas as houve muita queimada. Isso significa que a redução do desmate não é necessariamente acompanhada pela redução dos incêndios?

Isso. O desmatamento tem grande influência no padrão das queimadas na Amazônia, mas principalmente em anos de secas extremas, mesmo com redução de desmatamento se verifica um aumento de queimadas. Em 2010, publicamos um artigo na revista Science que mostrou que recentemente (aproximadamente nos últimos 10 anos), para grande parte da Amazônia tem ocorrido um aumento de queimadas mesmo em áreas com diminuição de desmatamento. Associamos isso a uma combinação de fatores relacionados à degradação florestal no entorno de áreas desmatadas. Essa degradação florestal gera áreas mais vulneráveis a ocorrência de queimadas. Em outra publicação na revista Science demonstramos quantitativamente que existe uma alta probabilidade (77% de chance) de que essas queimadas não são provenientes somente de queimadas relacionadas à abertura de novas áreas e manejo de áreas já desmatadas. Parece que esse aumento da degradação está beneficiando o escape do fogo para áreas adjacentes às áreas desmatadas e incrementando o número de queimadas.

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Que dados demonstram que a redução do desmatamento não é acompanhada pela diminuição dos incêndios?

Para 2010 observamos um decréscimo de 65% nas taxas de desmatamento (em relação a 2005). Contudo, este desmatamento não foi acompanhado com a mesma magnitude pelas queimadas. Em 2010 (40.892 focos detectados) houve uma redução de apenas 25% no numero total de focos de calor detectados pelo sensor MODIS em relação a 2005 (56.948 focos detectados). O mais interessante é que houve um aumento de 109% no número de focos detectados por km2 desmatado em 2010 em relação a 2005. Apesar de um decréscimo do número absoluto de focos, os dados indicam que cada vez mais o impacto das queimadas para cada km2 de floresta desmatada é maior.

As mudanças climáticas afetam esse cenário?

O mais perigoso é que os modelos climáticos indicam que a Amazônia pode ficar mais seca no futuro e, portanto, podemos esperar que o impacto de queimadas se intensifique e provavelmente se torne relativamente mais importante que o impacto direto de desmatamento nas emissões de CO2 da Amazônia num futuro próximo. Em 2010 também observamos um incremento muito grande de queimadas no bioma cerrado - foram 37.978 focos detectados em 2010 contra 20.643 detectados em 2005. Portanto, as queimadas no cerrado tiveram uma contribuição extremamente relevante para o número recorde de queimadas na Amazônia Legal em 2010.

Qual é, em geral, o prejuízo das queimadas para a floresta? Quanto tempo ela pode levar para se recuperar?

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Os prejuízos são grandes. Primeiro, existe uma perda elevada dos estoques de carbono da biomassa florestal. Esta perda de estoque de carbono pode chegar a aproximadamente 0,22 Pg C (1 Pg = 1 bilhão de toneladas) para a Amazônia como um todo. Este valor esta na mesma ordem de magnitude das emissões atuais por desmatamento. Além do carbono, outros impactos podem ser observados, como a perda direta de biodiversidade e prejuízo socioeconômicos. Em relação à biodiversidade, a queimada causa alta mortalidade de espécies arbóreas características de florestas maduras, que levam centenas de anos para se estabelecer. Essas espécies são substituídas por espécies pioneiras, colonizadoras, que dominam a área e diminuem a diversidade. Em relação à economia, dois pontos são relevantes: essas queimadas podem afetar áreas agrícolas de colonos na Amazônia, quando o fogo escapa de uma área para outra. Essas pessoas podem perder seus cultivos de subsistência. Além disso, muitas pessoas vivem de recursos não madeireiros extraídos das florestas, e o fogo pode danificar e matar espécies de interesse para essas pessoas, como a seringa, que é muito utilizada para extração de borracha no Acre.

 

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