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Os Hermanos

Cleptocracia: Governo Kirchner teria sofisticado o sistema de corrupção argentino

 

Por arielpalacios
Atualização:

Georges "O Tigre" Clemenceau ficou impressionado com a capacidade de roubo dos políticos argentinos há um século. Cem anos depois, a moda continua.

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"A economia da Argentina só cresce porque de noite os políticos e empresários estão dormindo e não podem roubar. E enquanto isso, à noite o trigo cresce e a vacas fornicam com luxúria". A sarcástica frase, pronunciada pelo estadista francês Georges Clemenceau, após sua visita à Buenos Aires em 1910, é recordada com frequência mais de um século depois na Argentina pelos analistas políticos que avaliam o impacto da elevada corrupção que existe atualmente no país. "Infelizmente, a corrupção tornou-se um elemento a mais na política do governo", afirma ao Estado o jornalista e escritor Luis Majul, autor de vários livros de investigação sobre a corrupção dos governos do ex-presidente Nestor Kirchner e a presidente Cristina Kirchner, entre os quais dois best-sellers: "O Dono" (sobre as supostas negociatas do ex-presidente Kirchner com empresários amigos) e "Ele e ela" (sobre a relação de poder entre os dois integrantes do casal presidencial).

Segundo empresários e analistas consultados pelo Estado, desde a volta da democracia, em 1983, a porcentagem das propinas exigidas pelos funcionários públicos cresceu sem parar, indo de uma faixa de 6% a 7% nos anos 80, para 10% nos anos 90 (esta porcentagem era ironicamente chamada de "Diego", em alusão à camisa número 10 de Maradona). No entanto, desde 2003, ano da posse de Kirchner, a proporção continuou sua escalada. Em 2009 a consultoria internacional KPMG emitiu um relatório no qual indicava que a porcentagem das propinas exigidas pelos funcionários públicos argentinos, segundo empresários entrevistados, havia subido de 15% em 2003 para 20% em 2009.

"De lá para cá, aumentou. Já passou dos 20%" afirma Majul. "Um alto empresário me contou que durante o menemismo a corrupção era de ladrões de galinheiro, Isto é, as penas ficavam de forma óbvia, coladas nas roupas dos ladrões. Mas, no governo Kirchner a corrupção ficou mais sofisticada, não somente com os pedidos de comissões, mas também com participação nos negócios", explica.

Daniel Santoro, jornalista que investigou escândalos de desvios de fundos do governo do ex-presidente Carlos Menem (1989-99), afirma que "a corrupção no período menemista foi por intermédio das privatizações ou concessões das empresas do Estado argentino. Eram as 'joias da vovó', mas com um governo de poucos ingressos e em uma época de vacas magras. No entanto, a corrupção do kirchnerismo foi a dos milionários contratos de obras públicas em uma época de vacas gordas".

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Manuel Garrido, ex-promotor federal e ex-diretor do Departamento Anticorrupção, tornou-se em 2003 diretor da Promotoria de Investigações Administrativas. Mas, renunciou poucos meses depois, quando o procurador-geral da República, Esteban Righi, restringiu suas investigações, que começavam a dar pistas sobre os primeiros escândalos do governo Kirchner. Garrido disse ao Estado que "a impunidade continua, pois atualmente ninguém investiga a corrupção na Argentina".

ESCÂNDALOS - Mais de uma centena de funcionários do governo de Néstor Kirchner e de Cristina Kirchner foram indiciados na Justiça por supostos envolvimentos em casos de corrupção nos últimos oito anos. No entanto, em diversos casos o governo conseguiu blindar-se das investigações feitas pela Justiça.

Esse é o caso do processo sobre enriquecimento ilícito dos Kirchners na província de Santa Cruz, que investiga irregularidades na compra de um terreno na cidade de El Calafate em 2006. O terreno foi vendido aos Kirchners pela prefeitura, comandada por um aliado do casal - por US$ 34 mil. O mesmo terreno foi revendido em 2008 por US$ 1,65 milhão.

Mas, a investigação sobre o caso está praticamente paralisada, já que ficou nas mãos da sobrinha do casal Kirchner, a promotora Natalia Mercado, filha de Alicia Kirchner, ministra da Ação Social, irmã do ex-presidente Néstor Kirchner.

A oposição também pede uma investigação sobre o crescimento exponencial da fortuna da presidente Cristina e de seu marido, falecido em outubro passado, já que o patrimîonio do casal aumentou 928,84% desde 2003. Os bens oficiais dos Kirchners, em um período de sete anos, passaram dos 6,851 milhões de pesos (US$ 1,647 milhão) para 70,49 milhões de pesos (US$ 16,945 milhões).

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O deputado Miguel Bonasso, um ex-kirchnerista desencantado com o casal presidencial, os acusa de corrupção: "nem o narcotráfico tem esses níveis de enriquecimento súbito".

Dólares foram aplicação preferida do casal Kirchner durante anos. Ilustração do cartunista argentino "El Niño Rodríguez". Site do cartunista: http://www.elninorodriguez.com/ 

FORTUNA DOS KIRCHNERS AUMENTOU QUASE 930% DESDE POSSE EM 2003

A fortuna da presidente Cristina Kirchner e de seu marido e ex-presidente Nestor Kirchner, falecido em outubro passado, aumentou 928,84% desde que o casal chegou ao poder em maio de 2003.

Os bens oficiais dos Kirchners, em um período de sete anos, passaram dos 6,851 milhões de pesos (US$ 1,647 milhão) para 70,49 milhões de pesos (US$ 16,945 milhões). Isso é o que indica a declaração de bens apresentada em agosto - depois de dois meses de atraso - pela presidente Cristina Kirchner ao Departamento Anticorrupção, organismo federal cuja missão oficial é a de fiscalizar os funcionários públicos.

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Somente entre 2009 e 2010 o aumento dos bens dos Kirchners foi de 27%, proporção que indica que seu lucro triplicou a inflação admitida pelo governo nesse período (de 8,9%).

Segundo as explicações oficiais, o patrimônio dos Kirchners - concentrado na área financeira e hoteleira - aumentou principalmente devido às dezoito aplicações bancárias do casal e à valorização das ações das três sociedades que controlam hotéis na Patagônia.

No entanto, o caso do Hotel Los Sauces, na cidade turística de El Calafate, despertou suspeitas, já que a parte dos títulos dessa empresa que está nas mãos de Cristina exibe metade do valor das ações que estão a nome de Kirchner. Os integrantes do casal possuíam 45% das ações do hotel cada um.

Os representantes da oposição também indicam que é "suspeito" o crescimento da riqueza familiar, já que os afazeres governamentais da costumeiramente agitada Argentina não permitem tempo de sobra para ocupar-se com os investimentos pessoais.

O desaquecimento da economia argentina em 2008, em meio ao conflito ruralista, e a crise de 2009 não abalaram a capacidade de poupança e investimento do casal Kirchner. Entre esses dois anos sua fortuna aumentou 158%, fato que despertou as suspeitas de enriquecimento ilícito.

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A última declaração de bens do casal indicava que a fortuna dos Kirchners originava-se pelas operações de compra, venda e aluguéis de imóveis, além de investimentos em hotelaria na Patagônia. Além disso, apesar da defesa enfática do "nacionalismo popular", o casal presidencial tinha a maior parte de suas aplicações financeiras em dólares, e não em pesos, a moeda nacional. Em 2008, 62% das aplicações do casal estavam na moeda do "Império", denominação aplicada pelos militantes kirchneristas aos Estados Unidos.

Cornucópia, o símbolo clássico da abundância e da riqueza.

ALGUNS CASOS DE CORRUPÇÃO DO GOVERNO KIRCHNER

Fundos de Santa Cruz (desde 2003): Nos anos 90 o então governador de Santa Cruz, Néstor Kirchner, enviou US$ 500 milhões para o exterior. Com o dinheiro fora do país, a província salvou-se do "corralito" (confisco bancário) de 2001 e a crise financeira de 2002. Kirchner prometeu que, quando fosse eleito presidente, o dinheiro voltaria ao país. Kirchner tomou posse em 2003. Entre 2007 e 2009 os fundos voltaram. Mas, a oposição afirma que existem outros US$ 500 milhões em juros sobre os quais nada se fala e que não voltaram ao país.

Caso Skanska (2005): Escândalo que envolve empreiteiras argentinas e estrangeiras, entre elas a sueca Skanska, no superfaturamento das obras de dois mega-gasodutos no sul e norte da Argentina. O principal suspeito do affaire é o Ministro do Planejamento Julio De Vido. As denúncias indicam subornos pelo valor de US$ 5 milhões.

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Trem-bala (2006): A Oposição acusa os Kirchners de graves irregularidades no contrato que o governo assinou com a empresa francesa Alstom para a construção do controvertido trem-bala argentino. O governo diz que o custo da obra seria de 2,5 bilhões de euros. Mas, a Oposição afirma que os contratos, da forma como foram elaborados, implicam em um custo três vezes superior ao orçamento oficial. O projeto está temporariamente suspenso.

"Valijagate" (Maleta-gate) ou o "Caso da Mala" (2007): Suposto envio de fundos de Chávez para a campanha eleitoral de Cristina Kirchner em 2007. Existem pistas sobre o envio de pelo menos US$ 5 milhões.

Banheiro-gate (2008): Posse irregular de pelo menos US$ 60 mil por parte da então Ministra da Economia Felisa Miceli. A ministra, sem encontrar justificativas para a posse desse dinheiro, encontrado em uma sacola de pale en seu banheiro, teve que renunciar.

Enriquecimento ilícito (desde 2008): A oposição, advogados independentes e a mídia acusam os Kirchners de enriquecimento ilícito. Eles afirmam que o crescimento exponencial do patrimônio presidencial desde 2003 não tem justificativas contábeis lógicas. Os Kirchners argumentavam que seu enriquecimento devia-se aos investimentos em imóveis.

"Embaixada paralela" (2010): O ex-embaixador argentino em Caracas, Eduardo Sadous, denunciou na Justiça que integrantes do governo da Venezuela e da Argentina durante vários anos exigiram a empresários exportadores de ambos países o pagamento de propinas de 15% a 20% para não causar obstáculos em suas operações de comércio bilateral. Segundo o embaixador, as pessoas envolvidas na exigência da propina referiam-se a ela como um "pedágio".

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SUBORNOS TÊM VOCABULÁRIO ESPECIAL NA ARGENTINA

Coima - Suborno preparado, organizado. "Propina", em espanhol, é usado para "gorjeta".

La Banelco - Alusão à "Banelco", marca de um cartão de débito bancário. Surgiu no ano 2000, quando o então ministro do Trabalho do presidente Fernando De la Rúa, Alberto Flamarique, do partido Frepaso, teria afirmado que resolveria um impasse sobre a votação da polêmica Lei Trabalhista no Senado com "La Banelco". Ou seja, pagando aos senadores. O termo, usado de forma geral para o pagamento de subornos em empresas e governo, voltou a ser aplicado nos últimos anos no caso da suposta compra de votos na Câmarade Deputados por parte do governo de Cristina Kirchner.

Diego - Alusão a "El Diez" (O Dez), apelido do ex-astro do futebol, Diego Armando Maradona. Mas, neste caso, o "Diego" referia-se nos anos 90 e início deste século aos 10% de alguma quantia em jogo. Uma espécie de dízimo periódico. Ficou defasado pelo aumento na porcentagem das coimas nos anos posteriores.

Celular - Alusão ao prefixo "15" dos telefones celulares na Argentina, e por tabela, referência à comissão de 15% que diversos ministros cobravam de empresários em meados da década. O ministro de Obras e Planejamento Federal, Julio De Vido, homem que está como casal Kirchnerdesde que Nestor Kirchner foi prefeito de Rio Gallegosem 1987, era chamado de "ministro celular". Nos últimos anos este apelido também ficou defasado pelo aumento da porcentagem das coimas.

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E neste outro link, a mesma canção, mas entoada pela genial Billie Holiday. Aqui.

Duke Ellington, o "duque" do jazz.

 

Em 2009 "Os Hermanos" recebeu o prêmio de melhor blog do Estadão (prêmio compartilhado com o blogueiro Gustavo Chacra).

 
 

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