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Os Hermanos

Cleptocracia anabolizada: Vacas luxurientas e corrupção na Argentina

Por arielpalacios
Atualização:

Em 1910 o estadista francês Georges Clemenceau declarava sua perplexidade pelos níveis da corrupção em Buenos Aires: "a economia da Argentina só cresce porque de noite os políticos e empresários estão dormindo e não podem roubar. E enquanto isso, à noite o trigo cresce e a vacas fornicam com luxúria". Na foto acima, Clemenceau nos anos 20, aposentado.

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Nos quase quatro séculos que passaram após as atividades irregulares de Valdez a corrupção na Argentina continuou alastrando-se. Em 2002, um ano antes da chegada do casal Kirchner ao poder, a Argentina estava no posto número 70 do ranking de percepção da corrupção elaborado pela ONG Transparência Internacional. No ano passado a Argentina piorou sua posição no ranking, passando do posto número 102 que teve em 2012 para o 106.

Desta forma, a Argentina, que está no mesmo patamar da vizinha Bolívia (e equivalente aos africanos Gabão e Níger), somente é superada na América do Sul pelo Paraguai, que ostenta o lugar número 150 do ranking e da Venezuela, no posto 160. Há duas semanas a cúpula da Igreja Católica emitiu um comunicado no qual sustenta que a Argentina padece "o câncer social da corrupção".

O casal Kirchner, cuja fortuna oficial cresceu 4.567% entre 1995 (época na qual Nestor Kirchner era governador de Santa Cruz) e 2010 foi indiciado em dezenas de ocasiões nos tribunais. Mas, a maioria dos casos de corrupção que protagonizavam foi arquivada. Alguns dos processos, na província de Santa Cruz, feudo político dos Kirchners, estavam a cargo da promotora federal Natalia Mercado. Coincidentemente, ela é sobrinha direta de Néstor e Cristina Kirchner, filha da ministra da Ação Social, Alicia Kirchner.

Manuel Garrido, ex-promotor federal e ex-diretor do Departamento Anticorrupção, disse ao Estado que o recente relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento (OCDE) "questiona a Argentina pela conivência entre o poder e a Justiça no país. E esse é um dos fatores que explica a impunidade". Garrido foi diretor da Promotoria de Investigações Administrativas em 2003. Mas, renunciou poucos meses depois, quando o procurador-geral da República, Esteban Righi, restringiu suas investigações, que começavam a dar pistas sobre os primeiros escândalos do governo Kirchner.

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Nos últimos dois anos o governo foi abalado pelo crescimento dos escândalos de corrupção protagonizados pelo vice-presidente Amado Boudou, roqueiro nas horas vagas e colecionador de motos Harley Davidson. O vice foi convocado para inquérito nos tribunais por irregularidades com a gráfica Ciccone, terceirizada pelo governo para imprimir notas de pesos. O inquérito será no dia 15 de julho, após o encerramento das distrações que a Copa do Mundo pode suscitar.

A situação de Boudou, que também é suspeito de enriquecimento ilícito, agrava-se a cada dia. Diversos setores do kirchnerismo indicam que o vice, caso seja processado, deveria tomar uma licença do cargo, para não afetar a imagem do governo. Coincidentemente, Boudou ficou de fora do novo Conselho do Partido Justicialista (Peronista).

Há duas semanas, José Guillermo Capdevilla, uma das testemunhas do caso Ciccone, ex-assessor de Boudou quando este era ministro da Economia, abandonou o país às pressas, alegando que foi ameaçado de morte.

Enquanto isso, o governo conseguiu levar a julgamento por suposto mau desempenho de suas funções o promotor José Luis Campagnoli, que averiguava os nexos entre o casal Kirchner e o empresário Lázaro Báez, processado por suposta lavagem de dinheiro. O julgamento de Campagnoli, famoso por sua honestidade e vida austera, será durante os dias da Copa do Mundo.

Além dos próprios Kirchners, do vice Boudou, os escândalos de corrupção atingem ministros poderosos como Julio De Vido, do Planejamento Federal, alvo de uma reabertura de um processo sobre enriquecimento ilícito na semana passada.

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Diversas pesquisas indicam que os argentinos consideram que a corrupção está enraizada no país entre políticos, empresários, integrante das polícia, entre outros setores. Um levantamento elaborado pela consultoria Raúl G.Aragón & Associados sustentou em abril que 67,3% dos entrevistados acreditam que a corrupção é "inevitável" na Argentina. A pesquisa também indicou que apenas 1,4% não acreditam na existência de corrupção no governo Kirchner.

A imagem sobre os líderes da oposição também é negativa (mas favorecidos por exígua margem), pois apenas 2,5% dos entrevistados acreditam na ausência de corrupção nos grupos contrários à presidente Cristina.

A corrupção tem um marco na arquitetura portenha. Trata-se do colossal edifício que nos anos 40 albergou o antigo Ministério de Obras Públicas e que atualmente é a sede da pasta de Ação Social. O prédio ostenta em uma de suas esquinas o único 'monumento à propina' conhecido no planeta. É estátua de um homem que, com pouca sutileza, coloca os dedos abertos estratégicamente para o lado, na espera de uma "molhada de mão". O arquiteto colocou a estátua como recado futuro sobre as eventuais negociatas que seriam protagonizadas no edifício. O detalhe da mão passou desapercebido durante anos (foto de Ariel Palacios).

A CARA CLEPTOCRACIA - Daniel Santoro, jornalista que investigou escândalos de desvios de fundos do governo do ex-presidente Carlos Menem (1989-99), afirma que "a corrupção no período menemista foi por intermédio das privatizações ou concessões das empresas do Estado argentino. Eram as 'joias da vovó', mas com um governo de poucos ingressos e em uma época de vacas magras. No entanto, a corrupção do kirchnerismo foi a dos milionários contratos de obras públicas em uma época de vacas gordas".

"Infelizmente, a corrupção tornou-se um elemento a mais na política do governo", afirma o jornalista e escritor Luis Majul, autor de vários livros de investigação sobre a corrupção dos governos do ex-presidente Nestor Kirchner e a presidente Cristina Kirchner, entre os quais dois best-sellers: "O Dono" (sobre as supostas negociatas do ex-presidente Kirchner com empresários amigos) e "Ele e ela" (sobre a relação de poder entre os dois integrantes do casal presidencial).

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Segundo empresários e analistas que consultei, desde a volta da democracia, em 1983, a porcentagem das propinas exigidas pelos funcionários públicos cresceu sem parar, indo de uma faixa de 6% a 7% nos anos 80, para 10% nos anos 90 (esta porcentagem era ironicamente chamada de "Diego", em alusão à camisa número 10 de Maradona).

No entanto, desde 2003, ano da posse de Kirchner, a proporção continuou sua escalada.

Em 2009 a consultoria internacional KPMG emitiu um relatório no qual indicava que a porcentagem das propinas exigidas pelos funcionários públicos argentinos, segundo empresários entrevistados, havia subido de 15% em 2003 para 20% em 2009.

"De lá para cá, aumentou. Já passou dos 20%" afirma Majul. "Um alto empresário me contou que durante o menemismo a corrupção era de ladrões de galinheiro, Isto é, as penas ficavam de forma óbvia, coladas nas roupas dos ladrões. Mas, no governo Kirchner a corrupção ficou mais sofisticada, não somente com os pedidos de comissões, mas também com participação nos negócios", explica.

Os cinco dedos de Néstor Kirchner.

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BREVÍSSIMA (e botem breve nisso) ANTOLOGIA DOS PRINCIPAIS CASOS DE CORRUPÇÃO DA ERA KIRCHNER

Fundos de Santa Cruz (desde 2003): Nos anos 90 o então governador de Santa Cruz, Néstor Kirchner, enviou US$ 535 milhões dos fundos provinciais para o exterior. Com o dinheiro fora do país, a província salvou-se do "corralito" (confisco bancário) de 2001 e a crise financeira de 2002. Kirchner prometeu que, quando fosse eleito presidente, o dinheiro voltaria ao país. Ele tomou posse em 2003. Mas os fundos somente voltaram entre 2007 e 2009. A oposição afirma que existem um volume de US$ 500 milhões a US$ 1 bilhão em juros sobre os quais nada se fala e que não voltaram ao país.

Caso Skanska (2005): Escândalo que envolve empreiteiras argentinas e estrangeiras, entre elas a sueca Skanska, no superfaturamento das obras de dois mega-gasodutos no sul e norte da Argentina. O principal suspeito do affaire é o Ministro do Planejamento Julio De Vido. Os subornos teriam sido de pelo menos US$ 5 milhões.

Trem-bala (2006): A Oposição acusa os Kirchners de graves irregularidades no contrato que o governo assinou com a empresa francesa Alstom para a construção do controvertido trem-bala argentino. O governo dizia que o custo da obra seria de 2,5 bilhões de euros. Mas, a oposição afirmava que os contratos, da forma como foram elaborados, implicariam em um custo três vezes superior ao orçamento oficial. O projeto foi posteriormente suspenso.

"Caso da Mala" (2007): Suposto envio de fundos de Chávez para a campanha eleitoral de Cristina Kirchner em 2007 dentro de um avião da estatal venezuelana PDVSA. Existem pistas sobre o envio de pelo menos US$ 5 milhões. Parte do dinheiro foi encontrado pela polícia alfandegária no Aeroporto Jorge Newbery.

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Caso do Banheiro (2007): Felisa Miceli era ministra da Economia quando foi denunciada pelo encobrimento de uma operação financeira ilícita que veio à tona com a descoberta no armário de seu banheiro no ministério de uma sacola de papelão com 100 mil pesos e 31 mil dólares. Miceli nunca conseguiu dar uma explicação convincente sobre a origem desse dinheiro. Ela também foi considerada culpada da destruição de documentos públicos. Em 2013 foi condenada a quatro anos de prisão. No entanto, entrou com um recurso nos tribunais, de forma a permanecer em liberdade.

Enriquecimento ilícito (desde 2008): A oposição, advogados independentes e a mídia acusam os Kirchners de enriquecimento ilícito. Eles afirmam que o crescimento de mais de 1.000% do patrimônio presidencial desde 2003 não tem justificativas contábeis lógicas. A presidente Cristina argumenta que seu enriquecimento deve-se aos investimentos em imóveis o fato de ter sido "uma advogada de sucesso".

"Embaixada paralela" (2010): O ex-embaixador argentino em Caracas, Eduardo Sadous, denunciou na Justiça que integrantes do governo da Venezuela e da Argentina durante vários anos exigiram a empresários exportadores de ambos países o pagamento de propinas de 15% a 20% para não causar obstáculos em suas operações de comércio bilateral. Segundo o ex-embaixador as pessoas envolvidas na exigência da propina referiam-se a ela como um "pedágio".

Caso Ciccone (2011): A Companhia Sul-Americana de Valores, a ex-Ciccone, tornou-se o foco do escândalo em dezembro passado quando investigações jornalísticas, posteriormente aprofundadas pela Justiça, revelaram pistas que indicariam que o vice-presidente Amado Boudou teria favorecido amigos seus na compra da gráfica, que há poucos anos estava a ponto de falir. Depois, Boudou teria ajudado os amigos a obter o contrato de impressão de notas de 100 pesos. Boudou tornou-se suspeito de enriquecimento ilícito, lavagem de dinheiro e negociações incompatíveis com a figura de funcionário público.

O octogenário senador Carlos Menem, ex-presidente, é cumprimentado cálidamente em 2011 pelo líder do bloco kirchnerista no Senado, o kirchnerista Miguel Ángel Pichetto. Menem deixou de ser "arqui-inimigo" e transformou-se em enfático aliado do governo da presidente Cristina. Menem foi reeleito para o senado com respaldo dos kirchneristas da província de La Rioja. Nos últimos anos, em diversas ocasiões, Menem afirmou que a política da presidente Cristina "está mais do que certa". 

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MENEM E DE LA RÚA CONSEGUIRAM DRIBLAR PROBLEMAS NOS TRIBUNAIS

Dos presidentes eleitos desde a volta da democracia argentina, em 1983, somente Raúl Alfonsín (1983-89) não foi considerado suspeito de casos de corrupção. No entanto, seus sucessores Carlos Menem (1989-99), Fernando De la Rúa (1999-2001), Néstor Kirchner (2003-2007) e Cristina Kirchner foram denunciados por suspeitas de irregularidades, desvios de fundos, ações incompatíveis com o dever de funcionários públicos e enriquecimento ilícito.

Menem foi condenado em março passado a sete anos de prisão por associação ilícita no contrabando de armas à Croácia e Equador entre 1991 e 1994. No total foram 6.500 toneladas de canhões, fuzis, foguetes antitanques e munições, que enviadas em dez remessas, consistiram no maior contrabando de armas da História do país. O contrabando liderado por Menem provocou um prejuízo de mais de US$ 180 milhões ao Estado argentino.

Apesar da condenação o ex-presidente não iria à prisão de forma imediata, já que Menem, de 83 anos, é senador pela província de La Rioja e conta com imunidade parlamentar. Para ser preso, mesmo em prisão domiciliária (devido à sua idade), teria que ser removido de seu cargo pelo Senado, onde a oposição deseja sua prisão. Mas, a maioria kirchnerista não permitiria a suspensão da imunidade, já que Menem foi um aliado fiel da presidente Cristina desde 2009, favorecendo o governo nas votações.

De la Rúa foi ao bancos dos réus em 2011 pela investigação sobre o suposto pagamento de subornos a um grupo de senadores do Partido Justicialista (Peronista) no ano 2000 para conseguir a aprovação da lei de reforma trabalhista exigida pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). As denúncias indicavam um pagamento de US$ 5 milhões para aprovar a lei, rejeitada pelos sindicatos. O escândalo levou o então vice-presidente Carlos Alvarez à renúncia, indignado com a falta de esclarecimentos sobre o caso.

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A promotoria havia exigido seis anos de prisão para De la Rúa. Mas, no ano passado, o ex-presidente foi absolvido pelo tribunal.

Do lado esquerdo da foto acima, o vice-presidente Amado Boudou, suspeito de caso de corrupção envolvendo gráfica terceirizada para imprimir dinheiro. Boudou exibe passos de dança no palanque no dia da posse da presidente Cristina em 2010. Na época ainda era considerado o virtual herdeiro de Cristina. 

CORRUPÇÃO DA ERA KIRCHNER É MAIOR DO QUE NO MENEMISMO, AFIRMA JORNALISTA INVESTIGATIVO

Jorge Lanata, que nos anos 80 fundou o jornal "Página 12", tornou-se no último quarto de século em um dos emblemas do jornalismo investigativo argentino. Atualmente apresentador do programa de TV "Jornalismo para todos" nos quais disseca os casos de corrupção da classe política, Lanata transformou-se no pesadelo do governo da presidente Cristina Kirchner, que alterou as transmissões estatizadas dos jogos dominicais de futebol para o mesmo horário de seu programa. No entanto, os espectadores deram mais atenção às denúncias de corrupção do que aos gols, já que Lanata os superou em audiência. Há poucos dias lançou "10 K - A década roubada", que analisa os casos de corrupção do governo do casal Kirchner entre 2003 e 2013.

Estado - Existem diferenças no modus operandi da corrupção do governo Kirchner com outro período também marcado pelos escândalos do tipo, o do governo de Carlos Menem?

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Lanata - Os menemistas pediam diferentes graus de "coima" (propina), que iam desde a porcentagem internacional de 10% até o argentino 40%. No início dos anos 90, quando dirigia o jornal "Página 12" denunciamos as negociatas do gênero de Emir Yoma, cunhado de Menem. O caso veio à tona por causa de uma carta da embaixada dos Estados Unidos em Buenos Aires queixando-se não pela propina em si, mas pela elevada porcentagem da mesma. Os integrantes do governo Kirchner saíram desse esquema e optaram por uma via diferente: participam das empresas. Um dos casos emblemáticos é uma empresária que herda uma concessão de uma auto-estrada mas não sabia direito como funcionava o vínculo com o governo. Aí soube que todo mês teria que levar uma sacola de lixo, dessas usadas pelos condomínios, cheias de euros, que tinha que entregar. Um dia ela se cansou, vendeu tudo e foi embora para o Brasil. Os euros são os preferidos pelo kirchnerismo, pois contam com notas de 500 e são mais fáceis de transportar porque são muitos mais leves que os dólares. E, no fim das contas, isso também é uma questão de logística. A corrupção no kirchnerismo é mais estrutural. No menemismo a pessoa pagava a propina e estava tudo resolvido. No kirchnerismo a pessoa tem que pagar todos os meses. Não acho que Nestor Kirchner sentia-se um ladrão. Acho que ele sentia que estava conseguindo dinheiro para sua política. Juízes, empresários e políticos indicam que a corrupção agora é muitíssimo maior do que no governo Menem. No entanto, nunca ficou claro que porcentagem os kirchneristas co-participaram nessas empresas. Benito Mussolini e os fascistas também faziam algo parecido: "compravam" partes de empresas (ou sua totalidade) e com o dinheiro delas faziam política. Se algum dia fizerem um mega-tribunal da corrupção, talvez possamos saber algum volume aproximado de tudo o que foi roubado nesta década de governo Kirchner.

Estado - A fortuna do casal Kirchner cresceu 4.500% desde 1995...

Lanata - O incrível é que esse crescimento exponencial é oficial, pois é o cálculo em base à declaração juramentada de bens. Mas, mais incrível, é que os juízes tenham encerrado os processos na Justiça que investigavam o enriquecimento dessas pessoas, especialmente durante o período em que elas ocupavam cargos públicos. Cristina foi advogada durante poucos anos, pois depois entrou para a área pública. O caso é que os políticos argentinos sequer conseguem que suas declarações oficiais de bens pareçam sérias. Não é sequer uma questão de seus bens extraoficiais. Um ministro na Argentina não tem um salário para ter a propriedade de um apartamento de US$ 1 milhão, aviões, iates, automóveis de luxo, etc.

Estado - Seria muito improviso por parte do vice-presidente Amado Boudou armar um esquema de corrupção e deixar que seu suposto testa de ferro - a quem diz não conhecer - pague seu condomínio e TV a cabo?

Lanata - É que eles acreditam que estarão sempre no poder. Néstor Kirchner queria suceder-se ininterruptamente com Cristina. Todos os políticos acham que são imprescindíveis e que ficarão para sempre. Cristina não abandonará Boudou. Esse vice vai levar Cristina para baixo. Já é tarde para o governo livrar-se desse vice, que será processado. Ele não renunciará, embora terá muitas pressões para deixar o governo, inclusive por parte de setores kirchneristas que não simpatizam com ele.

Estado - Na hora de ir às urnas, em 2015, para definir qual será o próximo presidente, os argentinos levarão em conta os casos de corrupção? Ou pesará mais o ditado "rouba mas faz"?

Lanata - Destes anos ficará uma coisa boa: a revalorização das instituições. Isso é uma coisa à qual infelizmente os argentinos nunca se preocuparam. Acho que este governo mostrou, por tabela por seus atos, que é preciso que o país tenha juízes independentes. Nos últimos tempos houve uma mudança de paradigmas. As pessoas consideram que é a divisão dos poderes é importante.

Estado - Como é a corrupção no interior da Argentina?

Lanata - No interior, as coisas boas da democracia nos últimos 30 anos ainda não aconteceram lá. E ali há uma lógica mundial: quanto mais pobre é um estado ou município, mais corrupto. No interior há caudilhos que controlam tudo e impedem as denúncias sobre corrupção com ameaças físicas aos jornalistas independentes.

Estado -A corrupção é constante na sociedade argentina desde os tempos da colônia espanhola?

Lanata - Quando os primeiros 70 moradores desta cidade chegaram para fundá-la no século XVI, receberam parcelas de terra. Mas destes, os que ficaram, são somente a metade. Os outros, receberam os terrenos da coroa espanhola, de forma grátis, e logo os venderam! Fizeram negócio com isso. A idéia do abuso do Estado é constante. Começou com a venda dos cargos públicos, que consistia em fazer uma "doação" ao rei, comprando um cargo. Os contrabandistas, que realizavam a principal fonte de receitas da cidade de Buenos Aires, compravam esses cargos, para poder contrabandear tranqüilamente sem que ninguém os incomodasse.

Coima - Suborno preparado, organizado. "Propina", em espanhol, é usado para "gorjeta".

La Banelco - Alusão à "Banelco", marca de um cartão de débito bancário. Surgiu no ano 2000, quando o então ministro do Trabalho, Alberto Flamarique, teria afirmado que resolveria um impasse sobrea votação da polêmica Lei Trabalhista no Senado com "La Banelco". Ou seja, pagando aos senadores. O termo, usado de forma geral para o pagamento de subornos em empresas e governo, voltou a ser aplicado no caso da suposta compra de votos na Câmara de Deputados por parte do governo de Cristina Kirchner.

Diego - Alusão a "El Diez" (O Dez), apelido do ex-astro do futebol, Diego Armando Maradona. Mas, neste caso, o "Diego" refere-se ao 10% de alguma quantia em jogo. Uma espécie de dízimo periódico. A porcentagem ficou defasada.

Celular - Alusão ao prefixo "15" dos telefones celulares na Argentina, e por tabela, referência à comissão de 15% que diversos ministros cobrariam de empresários. Esta porcentagem também ficou defasada.

Sobre - "Sobre" é "envelope". Os subornos pequenos e cotidianos eram enviados em envelopes. Mas, nos últimos anos o nome permaneceu, embora sejam entregues em sacolas de lixo de 60 litros.

Bovino (não sabemos se luxuriento, na Exposição Rural de 1910) posa ao lado da infanta da Espanha, em visita a Buenos Aires.

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Em 2009 "Os Hermanos" recebeu o prêmio de melhor blog do Estadão (prêmio compartilhado com o blogueiro Gustavo Chacra). Em 2013 publicou "Os Argentinos", pela Editora Contexto, uma espécie de "manual" sobre a Argentina. Em 2014, em parceria com Guga Chacra, escreveu "Os Hermanos e Nós", livro sobre o futebol argentino e os mitos da "rivalidade" Brasil-Argentina.

 
 

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