Cláudia TrevisanCORRESPONDENTE / WASHINGTON
Com a ajuda do próprio rival republicano, Donald Trump, Hillary Clinton conseguiu recolocar o tratamento dado pelo candidato às mulheres no centro da disputa pela Casa Branca. O ataque da democrata foi personificado na ex-miss Universo Alicia Machado, criticada pelo bilionário por estar acima do peso em 1996, quando ele organizava o concurso de beleza.
"Ele chamou essa mulher de Miss Porca. Depois, ele a chamou de Miss Faxineira, porque ela é latina", disse Hillary na noite de segunda-feira, na parte final do primeiro debate a reunir os dois candidatos à presidência dos EUA.
Na manhã desta terça-feira, o republicano retomou o assunto em entrevista à rede de TV Fox News: "Ela foi a pior que nós já tivemos, a pior, absolutamente a pior, ela era impossível", declarou, em referência a Alicia. "Ela ganhou uma enorme quantidade de peso e isso foi um problema real", declarou o candidato, criticado com frequência por julgar as mulheres com base em sua aparência.
Em desvantagem entre o eleitorado feminino, o republicano chegou ao debate com o desafio de encontrar o tom correto para tratar sua opositora, a primeira mulher a disputar a presidência dos EUA por um grande partido. Trump deixou de lado o "Hillary trapaceira" e se dirigiu à democrata como "secretária Clinton", mas caiu na armadilha da referência à ex-miss Universo.
Depois de sua declaração à Fox News, "Alicia Machado" e "Miss Universo" estavam entre os principais temas comentados no Twitter. Venezuelana, a ex-miss obteve cidadania americana para poder votar em Hillary e nesta terça-feira participou de uma conferência telefônica organizada pela campanha da candidata democrata, durante a qual criticou o republicano.
Casos. Pouco após o concurso de beleza, há 20 anos, Trump chamou a imprensa para acompanhar Alicia em uma academia de ginástica. "Aqui está alguém que come muito", declarou o bilionário, que detinha os direitos do Miss Universo. A venezuelana diz que sofreu distúrbios alimentares e tentou durante anos superar o dano psicológico provocado pelo comportamento do bilionário.
Além do potencial impacto no eleitorado feminino, o ataque a Alicia pode ter eco entre os hispânicos, um dos grupos que Hillary precisa mobilizar para vencer as eleições de novembro. Nesta teça-feira, a campanha democrata divulgou vídeo no qual Alicia narra sua experiência com Trump em espanhol, com legendas em inglês. "Eu tinha muito medo dele", afirma a venezuelana. "Ele gritava comigo o tempo todo. Ele me dizia 'está feia' ou 'está gorda'."
Hillary deixou o ataque do tratamento de Trump às mulheres para o fim do debate, quando o moderador Lester Holt questionou o republicano sobre o comentário de que a adversária não tinha "aparência presidencial". A democrata aproveitou a brecha: "Este é um homem que chamou mulheres de porcas, desleixadas e cachorras, e disse que a gravidez é um inconveniente para os patrões", afirmou a democrata.
Trump mostrou-se surpreso com os ataques e afirmou que eles eram injustos e distantes da realidade. Mas sua resposta veio com uma ameaça velada. O bilionário disse que pretendia dizer coisas "extremamente rudes" para Hillary e sua família, mas mudou de ideia. "Eu não pude fazer isso. É inapropriado", observou o candidato.
Em maio, Trump acusou o ex-presidente Bill Clinton de estupro e em vários momentos da campanha disse que sua adversária foi uma "facilitadora" dos casos extraconjugais do marido. Antes do debate, ele insinuou no Twitter que convidaria Gennifer Flowers, ex-amante de Clinton, para assistir ao evento na primeira fila. Seus assessores disseram que era ironia.