Reação de Trump a um revés cria incerteza nos EUA

Especialistas apontam possível recusa em aceitar resultado como risco à democracia

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Por Redação Internacional
Atualização:

Cláudia TrevisanEnviada Especial / Nova York

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Donald Trump poderá jogar os EUA em um período de incerteza política caso perca a eleição de hoje por uma pequena margem e se recuse a reconhecer o resultado das urnas, avaliaram analistas ouvidos pelo Estado. O candidato disseminou nas últimas semanas a ideia de que a votação pode ser fraudada e se recusou a dizer no último debate presidencial se aceitaria uma eventual derrota.

"Se o resultado for por uma diferença pequena, creio que teremos um período de grande tensão nos Estados Unidos", disse Richard Hasen, especialista em legislação eleitoral da Universidade da Califórnia em Irvine. "Mas não acredito que a diferença será pequena."

Donald Trump segura máscara em evento em Sarasota Fairgrounds, Flórida. Foto: Loren Elliott/The Tampa Bay Times via AP

Os EUA não possuem uma Justiça Eleitoral que proclama o resultado final da votação. A oficialização do vencedor ocorre quando o Congresso conta os votos do Colégio Eleitoral, no dia 6 de janeiro. "No sistema americano, é muito importante que o candidato derrotado reconheça a derrota. Se isso não ocorrer, poderemos ter dois meses de incerteza", disse Clifford Young, diretor do instituto de pesquisas Ipsos. "Nunca vimos um candidato falar abertamente que talvez não aceite o resultado das urnas."

A eleição presidencial do ano 2000 ficou indefinida por mais de um mês, mas o impasse não decorreu da recusa do derrotado em reconhecer o resultado. A diferença de votos entre os candidatos foi mínima e levou a uma recontagem obrigatória de votos na Flórida, Estado que acabou definindo a disputa.

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Apesar de ter tido 500 mil votos a mais que George W. Bush na eleição popular nacional, o democrata Al Gore reconheceu sua derrota no Colégio Eleitoral no dia 13 de dezembro, em uma disputa que acabou decidida por uma diferença de 537 votos na Flórida.

"Entre todas as coisas que Trump disse, a mais perigosa delas é a de que ele pode não reconhecer o resultado da eleição", opinou a cientista política Christina Greer, professor da Universidade Fordham. Segundo ela, a admissão da derrota é um elemento essencial do processo de transição pacífica de poder nos EUA.

Em segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto, Trump tem disseminado a ideia de que o sistema eleitoral dos EUA é sujeito a fraudes, o que justificaria sua rejeição de uma eventual derrota. A insinuação contraria estudos que apontam para a virtual inexistência de irregularidades no pleito e foi contestada por integrantes de seu partido.

Mas a retórica de Trump encontrou eco em seus seguidores, muitos do quais decidiram atuar como fiscais de votação. Isso provocou o temor de intimidação de eleitores. "Estou preocupado com a atuação de indivíduos que escutam as insinuações de Trump e decidem agir por conta própria", afirmou Hasen. Segundo ele, não houve na história moderna dos EUA uma ameaça de intimidação como a representada por seguidores do bilionário.

Na sexta-feira, uma eleitora da Virgínia foi parada em frente a um local de votação por um homem armado usando uma camiseta da campanha de Trump. Erica Cotti disse em entrevista ao Huffington Post que o simpatizante do republicano perguntou se ela votaria na "Hillary trapaceira" - a expressão com a qual Trump se refere à adversária. "Estava com meu filho e me senti intimidada", disse Cotti.

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Em 31 Estados americanos, entre os quais a Virgínia, os cidadãos podem portar arma de maneira ostensiva sem uma licença especial. "O problema é quando um homem ou uma mulher com uma arma pergunta em quem você vai votar ou fica no seu caminho quando você se dirige ao local de votação", observou Greer.

Pesquisa do New York Times divulgada na semana passada mostrou que apenas 19% dos eleitores de Trump acreditam que seus votos serão contados de maneira apropriada. Entre os seguidores de Hillary, o porcentual é de 71%. Fraudes ocorrem com frequência nas eleições americanas na avaliação de 42% dos entrevistados que votarão no bilionário. Apenas 7% dos democratas têm a mesma opinião. As divergências se refletem na reação que os dois grupos terão em relação ao resultado do pleito: 86% dos que apoiam Hillary disseram que reconhecerão a decisão das urnas. Entre eleitores de Trump, o porcentual é de 63%.

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