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Todos os caminhos levam a Berlim

Berlim: Futebol, Religião e o perfeito cabo eleitoral para Merkel

Nesses dias, a cidade mais ateia da Europa vive dias intensos: no âmbito futebolístico, no religioso e político. E como não poderia ser diferente, em Berlim tudo se mistura com a maior naturalidade de uma convivência pacífica. 

Por Fátima Lacerda
Atualização:

Durante o feriadão quando se comemora, paralelamente, o Dia dos Pais que tem o ritual de grupos homens (os que se tornaram pais ou não) se encontrando nos bares ou Biergarten para beber o dia todo e fazê-lo sem medo de ser feliz, como também a ascensão de Cristo, acontece o encontro bienal da Igreja Protestante, nesse ano, com especial foco temático já que se comemoram os 500 anos da tese de Martinho Lutero (1483-1546), principal mentor e desencadeador da Reforma Protestante. O monge enviou suas teses para o então arcebispo da cidade de Mainz, vizinha de Frankfurt, e como seguro morreu de velho, fixou em Wittemberge 95 teses na porta da igreja de Todos os Santos criando o, provavelmente, o primeiro outdoor da história da humanidade .O Kirchentag acontece, paralelamente, em Berlim e Wittemberg que está localizada no leste do país. Em comemoração à data significativa, o sêlo com o mentor da Reforma está sendo lançado no Brasil e na Alemanha.

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Parar o megaevento, a organização juntamente com a chanceler Merkel teve a ideia de dar um Up no encontro e convidar o ex-presidente Obama para retornar a Berlim. Sua visita na capital, ainda como comandante da Air Force 1, foi em novembro de 2016

Goiabada com queijo

A vinda de Obama depois de 3 meses de ostracismo, fotos de férias na costa do Havaí e algumas entrevistas na sequência daria um UP no evento. Merkel e Obama em frente ao Portão de Brandemburgo falando de humanidade, discursando sobre a "importância as artes" no melhor marketing midiático e um daqueles de alta atratividade onde todos saem ganhando e tudo se desdobra em "imprensa positiva", como diz o jargão: os organizadores do Kirchentag, Obama, que volta para os holofotes em grande estilo com sua amiga do peito e Merkel, que se candidata pela quarta vez ao cargo de chanceler em eleições agendadas para setembro próximo e que já mostrou que não dorme no ponto.

Uma mão lava a outra

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Em sua visita em novembro de 2016, a imprensa europeia se via na expectativa se Merkel iria, mais uma vez, pagar pra ver, algo que depois do resultado do BREXIT, depois da perda de forca política de aliados no âmbito europeu (Hollande, Renzi), mas especialmente depois da eleição de Donald Trump para ocupar a Casa Branca, tomara importância no âmbito mór de dramaticidade. Merkel constava como a defensora do que sobrou do "mundo livre ocidental".

Durante a coletiva conjunta com Obama frente à imprensa de todo o mundo naquela tarde de um novembro sombrio, o então presidente foi indagado por um jornalista se ele achava que Merkel deveria continuar: "Se eu morasse aqui, eu votaria nela". Ao lado, Merkel, normalmente muito reservada e econômica em qualquer tipo de reação, mostrava dificuldades em esconder a satisfação ao ouvir tal feedback positivo e de origem tão nobre. 

Três dias depois que Obama havia deixado Berlim, Merkel anunciou querer pagar pra ver mais uma vez e isso, apesar de, na época, sinais de esgotamento físico e diminuição de suporte dentro do próprio partido se fazerem visíveis, mas como prescreve um ditado popular: "Isso é neve do dia anterior", o que se equivale ao que dizia minha avó:"Águas passadas" hoje substituido pela expressão, "Vida que segue!".

Astúcia merkeliana e um timing perfeito

Na manhã de quinta-feira (25) Merkel e Obama conversaram sobre o lema "Arquitetar democracias". Na roda, alguns representantes internacionais incluindo uma cantora afrodescendente. No final do discurso do ex-presidente sobre "a necessidade das artes" em criar uma sociedade mais humana e depois de, claro, ter mencionado o Martin Luther Jr.. Merkel, ciente do momento propício, se virou para a cantora afrodescendente e disse: "Você, por exemplo, é cantora, algo que eu nunca conseguiria ser", arrancando risadas da plateia familiarizada com a língua Martinho Lutero, de Schiller e Goethe. "É bacana que Deus nos fez tão diversos. Um canta outro faz política", disse Merkel. Quando ela exibe algum sinal de humanidade, seja um sorriso, uma palavra e, para quem já teve a sorte de presenciá-la contando uma anedota até parece que o mundo ainda é um lugar seguro e a absoluta convicção do gênio da Sétima Arte e neurótico mais famoso de Nova Iorque, Woody Allen, que em voz estarrecida e consternado não cansa de afirmar que "Vivemos num caos permanente!!!" parece desaparecer, nem que seja somente por um segundo. O que Merkel almejava no Tete-a-Tete com Obama é coerente até o último gesto. Obama, o ganhador do Prêmio Nobel da Paz, o cara solícito e simpático e a chanceler desfilando no "sinteco internacional" entre Obama e Trump, Berlim e Bruxelas. Os alemães precisam desso sentimento, mesmo muito subjetivo concernente à insana dinâmica de fatos, agora diários, de segurança que Merkel é um alicerce que saberá defender os interesses do país e, para os mais ingênuos, defendê-lo de todos os males, como se isso fosse possível. Desse sentimento depende a vitória da chanceler em setembro próximo.

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Depois de um café da manhã em conjunto com Merkel e a conversa sobre "um mundo melhor", Obama embarcou para Baden-Baden onde recebe o "Premio da Mídia" concedido pela empresa de estatística de mercado "Media Control". O discurso para o ex-PopStar da Casa Branca será feito pelo também ex-presidente alemão, Joachim Gauck.

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A chanceler teve que sair às pressas de Berlim em direção a Bruxelas onde encontra o atual habitante da Casa Branca, Donald Trump. Decerto que essa dinâmica de uma agenda inusitada servirá de trunfo para Merkel perante aos eleitores do tipo, veja: quando se trata de sentimentos nobres como compaixão, solidariedade e religião, é com Obama, quando de negócios, é preciso ser feito o necessário.

Futebol é religião!

Pra arrematar o superferiadão, o outro lado da moeda é a partida da Final valendo a Taça da Federação Alemã de Futebol, a chamada DFB Pokal no Estádio Olímpico, partida com ingressos de valores salgados que vão de 395 (aprox. 1454,00 reais) a 1.600 euros (5.891 reais).

No gramado, disputando a partida estarão o Borussia Dortmund e o Eintracht Frankfurt. O Borussia adentra solos berlinenses como super favorito e já escrevendo história do futebol mesmo antes do juiz apitar o jogo: numa competição com mais de 60 anos de existência, é o Borussia que bate o recorde de alcançar a prestigiosa final em Berlim pela quarta vez consecutiva. Não fossem o arranca-rabo entre o atual técnico, Thomas Tuchel e a diretoria do clube, o cosmos amarelo-e-preto estaria perfeito. Os ingressos para a partida estão esgotados. O clube de Dortmund alugou um galpão chamado Arena onde possibilitará um Public Viewing que de público só tem mesmo o nome. Os ingressos para assistir ao jogo no telão acompanhado de aficionados pelo clube que vem de todas as partes da Europa para Berlim custam, no mínimo 60 euros (220,00 reais).

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Enquanto alguns marcam presença frente ao Portão de Brandemburgo os fanáticos torcedores do Borussia e do Frankfurt irão tomar Berlim na sexta (26) e no sábado (27), dia do jogo. Para o espetáculo futebolístico religioso, São Pedro promete 28 graus na capital alemã onde torcedores irão extrapolar sua religiosidade pelo time de Dortmund. Na sexta-feira, Emma, a mascote do time já estará distribuindo autógrafos e Selfies num dos maiores shoppings da capital.

Agora resta é rezar

Para o adversário de Merkel, o social-democrata Martin Schulz a corrida ficou mais difícil depois dessa cartada astuta da chanceler.

Vai ser difícil conseguir um empate no jogo na corrida pelo cargo de Chefe de Governo depois desse golaço de Merkel que nasce das cinzas e ratifica um outro ditado que prescreve: "Quem é tido como morto, vive mais tempo".

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