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Todos os caminhos levam a Berlim

Merkel em Washington e a alfinetada previsível de Trump

©DPA

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Por Fátima Lacerda
Atualização:

Que o atual morador da Casa Branca, até agora, brilhou por cumprir aquilo que prometeu durante a campanha eleitoral, o mundo tem constatando da forma mais dolorosa possível.  O jornal espanhol El País, classificou a primeira coletiva de Trump como "um roteiro para um filme de Máfia".

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Promessas que nos remetiam a filmes de terror e insuportável  suspense viraram realidade: o ódio pelos muçulmanos atingiu até a Fábrica dos Sonhos, de Hollywood, evitando que um dirertor iraniano fosse ter seu reconhecimento merecido no tapete vermelho mais cobiçado da Sétima Arte.

Ao invés de brilhar em Hollywood, Asghar Farhadi enviou dos compatriotas residentes nos EUA para receber o prêmio. Mesmo que o decreto tivesse sido revogadopelo Supremo, o diretor demonstrou não concordar com o ódio sendo instigado pela anterior proibição de visto para pessoas do Irã, Iraque, Somália, Síria, Sudão e Iémen. Farhadi não quis compactuar com a dialética do ódio.

Briefing

Para segunda-feira (13) foi agendado o Briefing que informaria jornalistas sobre a agenda da chanceler em Washington. Até esse momento e no final do dia, a viagem ainda estava agendada para o dia 15. Somente no final da noite, foi divulgado o adiamento devido a condições climáticas na costa do leste. Uma pergunta que não quer calar: a Alemanha tem um fetiche com previsão de tempo que os meteorologistas gozam da importância de um bloco separado e exibido logo depois dos principais noticiários. Ninguém dos assessores e consultores de Merkel pensou em dar uma olhadinha na previsão do tempo? Wheater Brodcast, Hello???

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Presentes no Briefing no prédio onde ocorrem as coletivas concernentes ao governo e ao parlamento, estavam

Dr. Christoph Heusgen, conselheiro de Merkel em assuntos de Política Externa

Lars-Hendrik Röller, conselheiro em assuntos de economia

Steffen Seibert, porta-voz da chanceler e ex-âncora da TV Aberta, ZDF

De praxe, Seibert se comportou como se estivesse de corpo presente, mas sua mente em algum lugar incerto e não sabido.

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Repetidas perguntas

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

Insistentemente os jornalistas perguntavam sobre aspectos concretos da agenda. Sem sucesso. Nesse Briefing, assim como uma semana antes em encontro de Dr. Heusgen com correspondentes estrangeiros radicados em Berlim, ficou bem claro que faltava um planejamento concreto para o encontro dos dois chefes de estado que nem valeu a pena a ida à Chancelaria Federal numa janela temporária de 60 minutos.

Não importa se, durante o Briefing, a pergunta vinha da jornalista da Reuters, do jornal "Politico" de Bruxelas ou da correspondente do NYT em Berlim, com sua excelente pronúncia mas uma gramática bem confusa. Ninguém consiga uma resposta concreta simplesmente porque essa concreticidade não existia. Com uma exceção: o aspecto econômico.

Mesmo que os conselheiros e assessores mais estreitos da chanceler foquem na "necessidade de se conhecer", "de se visto ao vivo", "de conversar diretamente ao invés de através da mídia", uma única coisa ficou clara no Briefing de segunda-feira: o foco principal da viagem é de âmbito econômico. Simples assim.

Os chefões dos Global Players BMW (Harald Krüger) , Siemens (Joe Kaeser) e o chefão do Grupo Schaeffler-Gruppe, Klaus Rosenfeld, acompanharam Merkel em sua primeira visita aos EUA. A fabricante de pneus, Continental, também pertence ao Grupo Schaeffler, do qual o proprietário, Georg Schaeffler é considerado o alemão mais rico do país com fortuna avaliada em 19 bilhões de euros.

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Segundo fontes veiculadas pela revista Der Spiegel, a ideia da chanceler em levar na bagagem os magnatas da economia era para agradar "o lado empresário de Trump". Krüger, Kaeser e Rosenfeld também foram para Washington com a tarefa ajudar na memória fraca do presidente, relembrando quantas vagas de trabalho as empresas alemães (Siemens e BMW), que mantém fábricas nos EUA, criam e a injeção econômica o isso significa para a economia americana. Só a Siemens contabiliza 50.000 empregados nas fábricas nos EUA, que são responsáveis por 21% dos lucros da Multinacional.

Sem rodeios

Não "somente" durante o Briefing como durante as poucas horas de estada da chanceler em Washington: a visita foi, extritamente de caráter financeiro. Mesmo porque todos, os assessores, conselheiros e jornalistas sabiam que a ida de Merkel seria arriscar uma roleta russa. As diversas repetições nas respostas de Heusgen, no Briefing, deixaram bem claro isso. Em alemão, tem um ditado que prescreve bem isso: "Ele tinha gasto todo o seu latim" (em tradução livre). Heusgen tentou se safar com repetidas frases "é um primeiro encontro para se conhecer" ou "eu já falei sobre isso", "repetindo..." .Quanto mais os jornalistas insistiam, mais baixa e insegura a sua voz ficava, no repetir da mesma frase, deixando cristalino que nem mesmo ele acreditava no que dizia. 

Ao ser perguntado se a delegação alemã teria que conversar com a "segunda fila" (membros do alto escalão do governo, mas que não necessariamente ficam frente aos holofotes) em aluaão ao fato que Trump não é intelectualmente muito esclarecido (para dizer ao mínimo) a resposta de Heusgen foi diplomática, porém nada convincente: "Num governo você precisa consultar todos. A primeira e a segunda fila", disse abaixando a cabeça com a esperança de que não viria nenhuma pergunta a mais sobre isso. Em momentos antes, Heusgen se mostrava inseguro com perguntas sobre encontros de membros do governo Merkel com protagonistas do Serviço Secreto: "Temos que aguardar a estabilização no preenchimento dos cargos".  Já que os dois primeiros meses mostraram que Trump contrata com a mesma rapidez que "desova" membros do seu governo na calada da noite, mais um motivo para esperar a poeira abaixar em Washington.

Jogo aberto no estacionamento de bicicletas

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Depois do final do Briefing e quando a maioria de jornalistas já havia ido embora, avistei Dr. Heusgen abrindo o cadeado de sua bicicleta logo depois que o porta-voz Seibert foi levado embora por um mercedes com motorista. Nesse momento, conversava com meu colega holandês, do The Telegraph de Amsterdã. "Vamos lá, falar com ele", disse eu sem pestanejar. Chegamos lá, já havia um outro jornalista holandês, um do Egito, o Rob e eu. São nessas conversas informais é que se consegue informações consistentes ou aquelas de coxia, mesmo que não explícitas. Bem mais relaxado e solícito, Heusgen tomou bastante tempo respondendo perguntas e nos deixou perceber que esta viagem, realmente era um mergulho no escuro, mas claro que um conselheiro de uma chanceler da importância de Merkel, precisa manter a postura, mesmo quando isso é no estacionamento de bicicletas. 

Perguntei ao conselheiro da chanceler se Merkel levaria um pedacinho do Muro de Berlim, para assim, diplomaticamente, alertar Trump sobre seu projeto-vitrine. Ele reagiiu com um ar solícito e de surpresa como se não houvesse pensado nenhuma só vez nessa opção, mas teria gostado dela. "A agenda prevê encontros com membros da oposição?", pergunta que foi motivo para a correspondente do NYT, que nesse meio tempo havia sacado a "reunião" e se juntado a ela, achasse graça. Heusgen olhou pra ela com fisionmia séria e, voltando para o restante do grupo, respondeu: "Vamos sim. Haverá encontros de membros da delegação alemã com senadores dos democratas". Instigada pelo aspecto prematuro da visita oficial, somente depois de 2 meses de Trump como morador da Casa Branca, arrisquei a pergunta: "Sobre quais critérios foi escolhida a data da visita da chanceler?". Tentando dissimular o verdadeiro motivo, Heusgen respondeu: "Quando o presidente americano convida, ele oferece algumas datas e não se pode negar todas elas", enquanto abria um sorriso.

Tirando os noves fora: A visita não foi devidamente preparada, mas um produto de um laissez-faire de um imprevisível. Quem se coloca no terreno de pessoas imprevisíveis, não sobra nenhuma outra alternativa a não ser, dar a cara pra bater.

Economia primeiro

A visita foi para garantir contratos econômicos e com o pretexto de conversar pessoalmente, já que neste ano haverão várias oportunidades, entre elas, o G20 em Julho próximo na cidade de Hamburgo, onde Merkel e Trump irão se encontrar, foi um pretexto bem-vindo, para justificar a visita Blitz, no meio de março antes do governo Trump completar dois meses.

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Ainda naquela segunda-feira, depois da saída de Heusgen com a bicicleta, eu me mostrava estarrecida com essa irresponsabilidade político-diplomática em colocar a chanceler numa roleta russa sem qualquer roteiro. Dito e feito. Frente às câmeras do mundo todo, Trump fingiu não ouvir a pergunta da chanceler sobre o aperto de mãos exigido pelos fotógrafos. Merkel não deveria nem poderia ter passado por isso, mesmo porque, era totalmente previsível que Trump não iria fazer barraco e nem iniciar uma DR, mas que também não deixaria barato. Depois de tantas ofensas de âmbito político e pessoal à chanceler antes e depois de ser eleito, Trump precisava manter a credibilidade com seu eleitorado e ignorar a pergunta da chanceler sobre o "aperto de mãos".

Só a delegação alemã que fez vista grossa, em prol de contratos milionários entre os dois países no setor da economia, em detrimento à imagem da chanceler, frente às cameras de todo o mundo.