A nação árabe com a maior proporção de cristãos é o Líbano, com cerca de 40% da população seguindo diferentes denominações cristãs, sendo a maioria deles maronita, seguido de minorias grego-ortodoxa, armênia, melquiata (grego-católica) e assíria. Já o Egito é o país da região com maior número absoluto de cristãos - 9 milhões ao todo, ou um em cada dez egípcios, sendo majoritariamente coptas.
Qual a diferença entre os cristãos do Egito e os do Líbano, Síria, Iraque e Palestina?
Há uma diferença histórica grande entre os cristãos do Egito e os cristãos do Líbano, da Síria (maioria grego-ortodoxa), do Iraque (maioria de caldeus) e da Palestina (maioria grego-ortodoxa) - os egípcios seguidores do cristianismo integram as camadas mais baixas da sociedade egípcia. Já os libaneses, sírios, iraquianos e palestinos eram ou ainda são da elite e da classe média.
Como forma de comparação, observe que o Líbano tem presidente, chefe das Forças Armadas, metade do Parlamento e metade dos ministros cristãos. No Iraque, até a invasão dos EUA, os cristãos integravam o alto escalão de Saddam Hussein, incluindo o número 2 do regime, Tariq Aziz. Na Palestina, sempre tiveram cristãos em posições importantes nos grupos seculares, como o Fatah e a FPLP. Na Síria, os cristãos ainda são protegidos por Assad.
Como está a situação dos cristãos no regime de Sissi, no Egito?
No Egito, com raras exceções como o ex-secretário-geral da ONU Boutros Boutros Ghali, os cristãos sempre ficaram em um segundo plano. A situação deles se acentuou nos últimos anos ditadura de Hosni Mubarak, piorando ainda mais durante o governo da Irmandade Muçulmana. Quando o general Sissi, assumiu o poder, ele, que é muçulmano, se comprometeu a combater a Irmandade Muçulmana e proteger os cristãos, tendo inclusive o apoio do Papa Copta.
Seu combate à Irmandade Muçulmana ultrapassou qualquer limite, com inúmeros massacres, inclusive um dos maiores em apenas um dia em toda a história do Oriente Médio. Ao mesmo tempo, o general Sissi não cumpriu a sua promessa de proteger os cristãos. Pior, estes, vistos como aliados de Sissi, também sofrem na outra ponta, ao serem alvejados por radicais salafistas ou organizações terroristas inspiradas pelo ISIS, também conhecido como Grupo Estado Islâmico ou Daesh.
Como foi o atentado contra a catedral no Cairo?
Neste domingo, durante uma missa na Catedral do Cairo, terroristas mataram 25 cristãos, sendo a maioria deles mulheres e crianças. Não foi o primeiro ataque a eles. A situação dos cristãos egípcios não para de se deteriorar. O regime de Sissi é um fracasso total política e economicamente.
O Ocidente foi ruim para os cristãos do Mundo Árabe?
Infelizmente, muitos governos do Ocidente não se importam com os cristãos do mundo árabe. E isso vale tanto para Barack Obama como para o futuro presidente Donald Trump, ou para o ex George W. Bush. Vamos começar por Bush. Este, ao derrubar Saddam, não tinha um plano de contingência para salvar os cristãos iraquianos, que sofreram represálias de sunitas radicais da Al Qaeda e de milícias xiitas por serem vistos como próximos de Saddam. Muitos cristãos foram salvos pelo regime de Bashar al Assad, que recebeu centenas de milhares deles, dando educação e saúde, além de liberdade para ir à Igreja.
Obama, por sua vez, ignorou os cristãos sírios, apoiando rebeldes radicais sunitas, equivocadamente chamados de "moderados", que destruíram vilas cristãs. Os cristãos sírios apenas conseguem se salvar graças ao regime de Assad, à Rússia, ao Irã e ao Hezbollah. Não é a toa que dificilmente você encontrará um cristão sírio que seja contra o regime sírio. Ao contrário, os cristãos sírios montam milícias pro-Assad.
No Líbano, os EUA não fizeram nada para defender os cristãos. Estes, que são fortes no país, tiveram de buscar uma aliança com os xiitas do Hezbollah para se protegerem dos radicais do ISIS e da Al Qaeda. O presidente do Líbano, Michel Aoun, é cristão e aliado do Hezbollah.
Trump, por sua vez, ainda não assumiu o poder. Mas faz elogios a Sissi, que claramente é um fracasso total na defesa dos cristãos e do povo egípcio como um todo.
Guga Chacra, blogueiro de política internacional do Estadão e comentarista do programa Globo News Em Pauta em Nova York, é mestre em Relações Internacionais pela Universidade Columbia. Já foi correspondente do jornal O Estado de S. Paulo no Oriente Médio e em NY. No passado, trabalhou como correspondente da Folha em Buenos Aires