O Hezbollah nasceu nos anos 1980 no sul do Líbano por três principais motivos - a ocupação israelense do território, a Revolução Islâmica do Irã e a marginalização dos xiitas na sociedade libanesa. Ao longo dos anos 1990 e da década passada, sempre teve como objetivo lutar contra Israel e, por este motivo, desfrutava de enorme popularidade nas ruas árabes.
A retirada israelense em 2000 e, acima de tudo, a sensação devitória (no mundo árabe) na Guerra de 2006 deixaram o Hezbollah com uma aura de verdadeira resistência no mundo árabe. Dentro do Líbano, a aliança com cristãos fortaleceu a imagem da organização, embora os embates contra os sunitas libaneses tenham se acentuado.
A eclosão da Guerra da Síria alterou o cenário. O Hezbollah, neste caso, ficou ao lado do regime de Bashar al Assad, e não dos supostamente reprimidos. Sua imagem no mundo árabe sunita despencou, embora sua popularidade entre xiitas, cristãos e alauítas não tenha sido afetada.
Conforme expliquei aqui outro dia, existem três eixos no Oriente Médio. O primeiro é Israel, que eu chamo de "Tel Aviv". O segundo, formado por Irã, regime de Assad na Síria, governo iraquiano, cristãos árabes, xiitas e alauítas seria o "Teerã". O terceiro, de viés sunita, conta com a oposição síria, países do Golfo, Irmandade Muçulmana e sunitas árabes, seria o eixo Riad - que fique claro, há divisões nestes três grupos.
O Hezbollah possuía apoio pois lutava a favor do eixo Teerã contra o eixo Tel Aviv. Na época, o eixo Riad, embora rival do eixo Teerã, ainda o preferia quando o adversário era Tel Aviv.
Agora a guerra civil da Síria é abertamente entre o eixo Teerã versus o eixo Riad. O Hezbollah não mudou de grupo. Apenas se concentrou em outro adversário por motivos táticos pois seu inimigo principal ainda é Israel. Seu objetivo final ainda é vencer os israelenses, mesmo que isso dure décadas. Sem o apoio do regime de Assad, esta metafica bem mais complicada.
A batalha de Qusayr, na qual o Hezbollah está envolvido diretamente, tem mais um dado importante - esta cidade fica próxima da fronteira com o Líbano. No lado libanês, são vilas de maioria xiita, ligadas ao Hezbollah, incluindo a importante cidade de Hermel. O norte do vale do Beqaa sempre foi ligado à organização, que agora decidiu cruzar a fronteira - do outro lado, também há concentrações de xiitas.
Guga Chacra, comentarista de política internacional do Estadão e do programa Globo News Em Pauta em Nova York, é mestre em Relações Internacionais pela Universidade Columbia. Já foi correspondente do jornal O Estado de S. Paulo no Oriente Médio e em NY. No passado, trabalhou como correspondente da Folha em Buenos Aires