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De Beirute a Nova York

Por que Trump é diferente de Bolsonaro?

Jair Bolsonaro não é o Donald Trump do Brasil. São duas figuras distintas em contextos completamente diferentes. Há, claro, similaridades em alguns discursos especialmente em relação à tortura e aos imigrantes, buscando ser "politicamente incorretos". Mas, mesmo nestas questões, as posições se dão dentro de cenários que possuem pouco em comum.

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Por gustavochacra
Atualização:

Trump nunca foi político. Na verdade, nasceu rico e soube usar a herança do pai para se tornar bilionário. Desde muito jovem era uma celebridade de Nova York. Todos o conheciam. Estava sempre na TV e nas capas de revista dando a sua opinião sobre os mais variados assuntos. Foi um doador de campanha, inclusive de Bill e Hillary Clinton. No passado, era mais de esquerda, apoiando o Partido Democrata. E, para completar, comandou um bem sucedido programa de televisão.

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Já Bolsonaro é um militar da reserva de classe média com pouca experiência na iniciativa privada. É um político de carreira. Nunca foi uma celebridade no sentido pleno da palavra. Não saia com várias mulheres. É pouco viajado e, de forma alguma, possui o perfil playboy de Trump. Tampouco possui amigos na elite de São Paulo e do Rio como Trump possui na de Nova York e Los Angeles.

Trump pode disputar a Presidência pelo Partido Republicano, um dos dois gigantes da política americana, com uma máquina poderosíssima. Ser o candidato republicano já o coloca automaticamente muito perto da Presidência, ainda que não seja o favorito diante de Hillary Clinton. Os republicanos controlam o Senado, a Câmara dos Deputados e maior parte dos governos estaduais.

Bolsonaro integra um partido minúsculo, desconhecido da maior parte da população brasileira e que está longe de conseguir ser majoritário na Câmara ou no Senado. Para completar, o Brasil tem um sistema multipartidário, enquanto os EUA são bipartidários - sim, existem partidos menores, mas sem representação.

Economicamente, Trump é abertamente protecionista, contra o livre mercado. Bolsonaro diz ter passado a defender o liberalismo econômico, sendo o oposto de Trump. Ao mesmo tempo e antagonicamente, defende o estatizante regime militar brasileiro. Trump é totalmente contra estatais. Debater política externa tem pouca relevância diante da diferença de pesos diplomáticos dos dois países.

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Trump, embora diga ser contra o casamento entre pessoas do mesmo sexo, tem muitos amigos homossexuais e evita entrar em atrito com gays. Bolsonaro é acusado de criticar pessoas pelo simples fato de elas serem gays. Trump tem posições classificadas como islamofóbicas, como a absurda proposta de barrar muçulmanos nos EUA, o que incluiria o presidente da Indonésia, Zidane, Malala e o Nobel de Literatura Orhan Pamuk. Bolsonaro não se aprofunda neste tema.

No caso das armas, são contextos diferentes. Ambos defendem o porte de armas, mas Trump o faz dentro de uma nação com a tradição da segunda emenda da Constituição que garante a posse de armamentos. Bolsonaro fala dentro de um país onde não esta tradição não existe e o debate possui outros contornos.

Trump diz ser contra o direito ao aborto, embora tenha sido a favor no passado e muitos dizem que ele mudou de opinião por motivos eleitorais. E o aborto é legalizado nos EUA há quatro décadas. Bolsonaro sempre foi contra e o Brasil proíbe o aborto. Trump nunca foi religioso. Bolsonaro integra um partido religioso. Trump diz não acreditar nas mudanças climáticas, batendo de frente com a ciência. Bolsonaro não se aprofunda no tema. Trump defende a tortura para combater o terrorismo. Bolsonaro defendeu um torturador do regime militar.

Trump se opõe a um governo sem praticamente nenhum escândalo, que cortou a taxa de desemprego pela metade, crescendo bem e mantendo a inflação sob controle abaixo de 2%. Bolsonaro se opõe a um governo envolvido em um mega escândalo de corrupção e com a economia na sua maior recessão em décadas.

Trump classificou imigrantes sem documentos do México como estupradores e criminosos. Bolsonaro classificou imigrantes no Brasil como escória. Mas, neste caso, há diferenças. Trump consideraria Bolsonaro mais um "mexicano", pois este é um termo genérico para quem vem do sul do Rio Grande (fronteira dos EUA com o México). Veria Bolsonaro como um "marrom", não como um "branco". Bolsonaro, por sua vez, se vê como branco, embora nos EUA ele não tenha esta classificação.

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Guga Chacra, blogueiro de política internacional do Estadão e comentarista do programa Globo News Em Pauta em Nova York, é mestre em Relações Internacionais pela Universidade Columbia. Já foi correspondente do jornal O Estado de S. Paulo no Oriente Médio e em NY. No passado, trabalhou como correspondente da Folha em Buenos Aires

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