Bom, talvez porque as vítimas sejam muçulmanas. Afinal, os mortos eram muçulmanos que estavam rezando em uma mesquita em Quebec. O terrorista se chama Alexandre Bissonnetti. Tem 27 anos. É conhecido em fóruns nacionalistas canadenses. Também costuma atacar nas redes sociais pessoas que discordem de seus posicionamentos políticos contra o islamismo. É um árduo defensor de Marine Le Pen, a candidata ultra-nacionalista a presidente da França. E também do presidente Donald Trump - que fique claro, nem o presidente americano nem a líder francesa pregam ataques a muçulmanos, mas alguns (uma minoria) de seus seguidores, sim.
O mundo não se divide entre "muçulmanos" e "Ocidente". Primeiro porque as maiores vítimas do terrorismo cometido pelo ISIS (Grupo Estado Islâmico ou Daesh) e a Al Qaeda são os próprios muçulmanos. Em segundo lugar porque quem mais combate o terrorismo cometido pelo ISIS e a Al Qaeda também são os próprios muçulmanos - os soldados iraquianos e sírios e os guerreiros peshmerga curdos são quase na sua totalidade muçulmanos. Em terceiro lugar, porque há pessoas más em todos os países e de todas as religiões.
No islamismo, estas pessoas más de fato ganharam espaço nas últimas décadas - não havia problema de terrorismo jihadista nos anos 1970 (o terrorismo palestino na época era nacionalista e incluía também cristãos). Este mesmo fenômeno de pessoas más ganharem espaço também ocorre, em uma escala menor, no Ocidente e também em lugares como o Brasil. O ataque à mesquita do Canadá é apenas mais um resultado disso. O Egito era muito mais tolerante em 1970 do que hoje. O Irã, também. Iraque, Síria, Yemen. Pode colocar na lista. Mas estas sociedades viram o crescimento de radicais.
Guga Chacra, blogueiro de política internacional do Estadão e comentarista do programa Globo News Em Pauta em Nova York, é mestre em Relações Internacionais pela Universidade Columbia. Já foi correspondente do jornal O Estado de S. Paulo no Oriente Médio e em NY. No passado, trabalhou como correspondente da Folha em Buenos Aires