gustavochacra
22 de setembro de 2016 | 17h17
O cessar-fogo na Síria não durou muito tempo, conforme era esperado e o regime de Assad, com apoio russo, lançou ofensiva contra a parte leste de Aleppo – o governo controla e sempre controlou a oeste. A guerra civil ainda está longe de terminar, embora a pior parte talvez tenha ficado para trás. Para haver uma conclusão, no entanto, um dos lados tem de vencer ou ocorrer um desgaste total das forças envolvidos internamente e, no caso sírio, externamente. Isso ainda não ocorreu e deve demorar anos para ocorrer.
É importante frisar que o interesse das partes envolvidas envolve derrotar o adversário. Abaixo, os objetivos de cada um dos envolvidos
Assad
Bashar al Assad, por exemplo, não é contra a “paz”. Apenas quer garantir que, quando houver a paz, ele esteja no poder solidamente em Damasco como estava em 2010. Ou, pelo menos, que tenha sob seu controle a maior parte da Síria. Por este motivo, Assad lançou a ofensiva hoje contra a parte leste de Aleppo. Quer controlar a cidade toda, assim como já controla a maior parte de todas as outras grandes cidades sírias. Ficaria uma “Colômbia” dos anos 1990.
Rebeldes
Os opositores só querem a paz quando eles estiverem no poder. Ou, pelo menos, em um momento em que Assad não esteja mais no poder em Damasco e eles controlem a maior parte do território sírio. Isso, claro, sem levar em conta que são dezenas de grupos opositores com agendas completamente diferentes entre si. E noto não haver “rebeldes moderados”. Todos são radicais, embora nem todos sejam ligados à Al Qaeda na Síria. Esta organização é a principal força rebelde e hoje responde pelo nome “Frente de Conquista do Levante”, depois de anos como “Frente Nusrah”. Mas, neste momento, não há possibilidade visível de derrotar Assad. O objetivo passar a ser não perder, até mudar o cenário externo
Curdos
Os curdos querem autonomia na área fronteiriça com a Turquia. Não interessa para eles quem estará no poder em Damasco ou em Aleppo. Não são regiões curdas. E usarão os americanos ao máximo para atingir este objetivo.
ISIS
E tem o ISIS, também conhecido como Grupo Estado Islâmico ou Daesh, que, neste momento, tenta apenas salvar o que restou do “califado” distorcido que construiu no Iraque e na Síria, ao mesmo tempo que inspira o terrorismo pelo mundo.
Rússia
As forças externas, por sua vez, também adotam diferentes agendas. A Rússia, Irã e Hezbollah compartilham dos ideais de Assad, embora de forma diferente. A Rússia, por exemplo, quer continuar tendo a Síria como cliente. Neste momento, Assad é sua melhor opção. Caso surgisse outra alternativa pró-Rússia, aceitariam. Não deve surgir no médio prazo. Seguirão com Assad portanto
Irã e Hezbollah
O Irã e o Hezbollah se importam mais com Damasco e toda a região de fronteira com o Líbano. Não há o menor interesse deles nas áreas curdas. Mesmo Aleppo tem pouca relevância. E, até agora, tem obtido bons resultados. Não há incentivos para mudarem sua política
EUA
Os EUA, na verdade, estão apenas preocupados em derrotar o ISIS e tem obtido sucesso neste objetivo. Retoricamente, dizem ser contra Assad. Mas, assim como Israel, no fundo prefere a permanência do líder sírio. Este cenário pode terminar em uma presidência de Hillary, que tolera menos Assad. Trump não sabe direito qual a sua política para a Síria
Turquia
A Turquia não quer o estabelecimento de uma região autônoma curda na sua fronteira e deve entrar em atrito cada vez maior com os EUA nesta questão. Os curdos sírios do YPG são alidos dos curdos turcos do PKK, que é uma organização terrorista. E o governo de Erdogan tampouco suporta o ISIS e Assad.
Arábia Saudita
A Arábia Saudita não quer a permanência de Assad no poder porque isso significaria o fortalecimento do Irã, seu maior inimigo, tanto na Síria quanto no Líbano.
União Europeia
Quer uma conclusão para o conflito, com a eliminação do ISIS, independentemente de Assad ficar ou não no perder. Assim, esperam reduzir o número de refugiados
Conclusão
Nenhum lado venceu a guerra e não há desgaste das forças envolvidas. Logo, a guerra civil ainda demorará para terminar
Guga Chacra, blogueiro de política internacional do Estadão e comentarista do programa Globo News Em Pauta em Nova York, é mestre em Relações Internacionais pela Universidade Columbia. Já foi correspondente do jornal O Estado de S. Paulo no Oriente Médio e em NY. No passado, trabalhou como correspondente da Folha em Buenos Aires
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