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De Beirute a Nova York

Rainha Rania luta contra islamofobia enquanto seu país tem preconceito contra sulamericanos

Um amigo meu iraniano disse certa vez que me invejava. "Toda vez que você diz ser do Brasil, as pessoas sorriem. Imagine ter que responder que é do Irã?". Realmente, concordo com ele. Ser brasileiro abre portas. Em quase todos os países por onde passei, sempre vi uma feição de entusiasmo ao checarem o meu passaporte. Claro, houve o episódio israelense. Mas, naquele caso, o problema era a quantidade vistos árabes e meus avós serem libaneses.

Por gustavochacra
Atualização:

Hoje, em Amã, imaginei que seria tão simples entrar quanto foi no Egito ou na Turquia. Desembarquei, troquei dinheiro pela valorizada moeda jordaniana e fui para o balcão onde se compra o visto. Americanos, suíços, japoneses e ingleses estavam na minha frente. Todos davam o passaporte, o dinheiro do pagamento, um homem recebia e o outro, do lado, já servia como imigração. Fiz o mesmo. Dei meu passaporte. Mas ele travou. O homem conversava ao telefone dizendo que estava com um passaporte brasileiro nas mãos. Estranhei. As pessoas atrás de mim na fila continuavam pegando o visto em menos de 30 segundos. E eu há quinze minutos ali, aguardando. Reclamei. O homem disse para eu esperar. Até que chegou um cidadão de bigodinho e me pediu para acompanhá-lo. Queria me revistar e interrogar.

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Jordaniano - De onde você vem?Eu - Do Cairo.Jordaniano - É a primeira vez na Jordânia?Eu - TerceiraJordaniano - Quantos dias você vai ficar?Eu - Poucos, menos de uma semana. Mas qual o problema comigo? Por que todos os turistas passaram diretamente e eu estou sendo interrogado? É por que sou jornalista? (nota - ele tem como saber isso porque está escrito no meu visto sírio a palavra sahaf, que quer dizer jornalista em árabe)Jordaniano - O problema é que você vem da América do Sul. Fazemos o mesmo com quem é do México, Venezuela, Argentina e Brasil.Eu - O México não é na América do Sul. Mas qual o problema dos nossos países?Jordaniano - Vocês podem ser traficantes de droga, de cocaínaEu - Você está insinuando que apenas pelo fato de eu ser brasileiro há a suspeita de que seja traficante? Isso é preconceito.Jordaniano - São ordens e tenho que respeitá-las.Eu - Mas você não pensou que a Jordânia está agindo da mesma forma que os países que barram árabes por causa do estereótipo de terrorista? Vocês estão fazendo a mesma coisa. Isso é racismo. Uma vergonha.Jordaniano - Não sei o que fazem nos outros países. Aqui, nós revistamos pessoas que chegam da América do Sul.Eu - Eu não vim da América do Sul. Estava no Egito.Jordaniano - Mas estava antes.Eu - Antes do Egito eu estava na Turquia. E antes Nova York, Tel Aviv, Gaza.Jordaniano - Você é brasileiro. Prendemos todas as semanas várias pessoas do seu país que chegam aqui com droga.Eu - Isso não é verdade. Nunca escutei histórias a respeito. Podem haver casos isolados. Mas duvido que seja tão comum.Jordaniano - AcrediteEu - Acho lamentável a sua rainha ir ao YouTube tentar defender os muçulmanos, buscando corretamente eliminar a imagem de terrorista atrelada a esta religião, enquanto o país governado pelo marido dela age com preconceito. Ela reclama do tratamento que os muçulmanos recebem no Ocidente, mas o rei Abdullah trata os sulamericanos desta forma aqui na Jordânia. Você barraria o Ronaldo, o Kaká?Jordaniano - Se viessem da América do Sul, eles também seriam revistados.Eu - Isso é preconceito

Terminou a revista, ele pediu desculpas e não parava de dizer que eu era bem vindo à Jordânia. Quem sabe, se meu passaporte fosse britânico. Claro, não descarto a possibilidade de terem me revistado e interrogado porque sou jovem ou jornalista. O problema é que o oficial jordaniano deixou claro que o motivo não era a minha idade ou profissão, mas a minha nacionalidade.

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