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De Beirute a Nova York

Refugiados palestinos lutam por mais direitos no Líbano

Por gustavochacra
Atualização:

segue reportagem minha publicada hoje no Estado. Em negrito, trecho que acabou não sendo publicado, mas, como acho importante, coloco aqui

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Gustavo Chacra, BEIRUTE

Os 400 mil refugiados palestinos que vivem espalhados por campos no Líbano não têm a menor perspectiva de voltar para a terra que consideram pátria - há mais de 60 anos reconhecida como Israel pela ONU. Esses cidadãos de segunda classe no território libanês, onde a maioria nasceu, vivem sem poder ter casa própria e impedidos de exercer 20 profissões - até 2005, eram 70 -, num mundo a parte do restante da sociedade.

Os campos no Líbano são controlados por diferentes facções palestinas, que vão do Hamas ao Fatah, passando por grupos que se enfraqueceram ao longo do tempo como a Frente Popular de Libertação da Palestina. Aos poucos, especialmente nos localizados em Trípoli, no norte, e Sidon, no sul, cresce o número de grupos radicais islâmicas inspirados na Al-Qaeda.

Segundo relatório da Anistia Internacional, os campos "têm sérios problemas como superocupação, pobreza e desemprego". Equivalente a cerca de 10% do total da população libanesa, os palestinos que residem no Líbano são "os refugiados que há mais tempo vivem no limbo", diz a organização.

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Os palestinos vieram para o Líbano há 60 anos, durante a guerra de1948, quando foi criado o Estado de Israel. Na história palestina, o episódio é chamado de Nakba (catástrofe). A causa da saída do povo provoca divergências. Entre os árabes, a teoria que sempre prevaleceu foi a de que eles foram expulsos.

Já entre os israelenses, o motivo foi a decisão de governos árabes de pedir para que eles se retirassem. Segundo essa visão, os palestinos deixaram suas casas por livre e espontânea vontade. Independentemente de quem estiver correto, hoje, na sociedade israelense, são raríssimos os defensores do direito de retorno dos palestinos, pois Israel não teria como incorporar essa população sem perder seu caráter judaico.

Um grupo de historiadores revisionistas que vasculhou os arquivos israelenses apresentou, nas últimos décadas, documentos que indicam que Israel expulsou a maior parte dos palestinos. Outros foram obrigados a sair em conseqüência da guerra. Alguns deles são respeitados em Israel, como Benny Morris, outros são alvos de enormes criticas, como Ilan Pape. Todos concordam, porém, que nenhum país árabe abriu os arquivos como os israelenses, o que os impede de pesquisar o outro lado.

DIREITO DE RETORNO

No Líbano, os palestinos tampouco têm a possibilidade de serem integrados à sociedade. Primeiro, por causa da ação da Organização de Libertação da Palestina (OLP) durante o período em que ocuparam Beirute até serem expulsos em 1982, quando travaram batalhas na guerra civil. Além disso, por serem sunitas, os palestinos desequilibrariam a balança sectária no país que divide os poderes entre as diferentes religiões. Hoje, nem as lideranças sunitas defendem conceder a nacionalidade aos palestinos.

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Eles também não querem ser libaneses. Em visita ao campo de Mar Elias, o menor de Beirute, a reportagem do Estado conversou com palestinos e observou que eles têm dois objetivos - manter o sonho de retornar um dia ao que eles consideram sua pátria e ter todos os direitos de trabalho e residência no Líbano, mas não a nacionalidade.

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"O direito de retorno é nosso principal objetivo. Ensinamos às crianças a nossa história, nossa geografia e o nosso direito de voltar para a Palestina. Esse sentimento nunca vai acabar", afirmou o refugiado que se identificou como Abu Khaled, de 56 anos. Seus pais viviam em Jaffa, na época o principal porto palestino e hoje uma região de Tel-Aviv. Ele acrescentou que seu sonho é o de uma Palestina com cristãos, muçulmanos e judeus - mas somente os que são originalmente da região.

Em meio a mapas e figuras de líderes palestinos e carregando armas, Samer Abu Rashid, de 34 anos, e Dib Wehbe, de 26, integrantes da Frente Democrática para a Libertação da Palestina, dizem não querer a nacionalidade libanesa, pois isso implicaria abdicar da palestina. "Mas somos seres humanos e gostaríamos de ter os mesmos direitos de trabalho que os outros libaneses", disse Wehbe. "Ainda que tivéssemos dinheiro, não poderíamos ter uma casa fora do campo", acrescentou Rashid. Os dois nasceram em Mar Elias e nunca saíram do Líbano. Vivem com identidades concedidas pela ONU.

Nascida em Acre (Israel) em maio de 1948, o mês da independência de Israel, a vendedora de verduras Umm Ali (mãe de Ali), diz que as raízes dela "sempre estarão na Palestina". Para ela, os libaneses têm medo de conceder os direitos para os palestinos, temendo que eles queiram a cidadania.

Ibrahim Khadur, de 47 anos, que vive em Sabra, mas tem uma banca de frutas no campo de Mar Elias, diz aceitar qualquer coisa que oferecerem a ele. Lembra ainda que sua mãe, que conseguiu um passaporte americano graças ao genro, visitou a casa da família em Jaffa.

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"Hoje uma família judia vive lá. Eles trataram a minha mãe muito bem. Convidaram-na para entrar e tinham guardado todos os pertences da nossa família em um quarto", afirmou. Uma de suas freguesas, Nawal Freijeh, entrou na conversa e disse que "Al-Quds (como os palestinos denominam Jerusalém) nunca sairá do coração dos palestinos". Mas acrescentou que querem uma solução no Líbano, pois, segundo ela, os refugiados têm consciência de que a probabilidade de retorno atualmente é quase inexistente.

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