Acredito, até porque já fiz isso, e imagino que você, também, se for um motorista brasileiro. E esse é o ponto. Só vemos o que é importante para nós. A faixa de pedestre representa o direito do mais frágil perante o mais forte. Ela é um símbolo das relações de poder. Um termômetro do quanto a lei, o direito, a gentileza se sobrepõem à força, em uma sociedade.
Fiz reportagens em 63 países. Devo ter andado -- literalmente, cruzando as faixas de pedestre -- por uns 70. Há muito tempo que comparo a atitude dos motoristas frente aos pedestres com os outros aspectos dos países: respeito à lei, democracia, tolerância, aceitação das diferenças.
Assim como o índice Big Mac da Economist mede o quanto uma moeda local está desvalorizada ou sobrevalorizada frente ao dólar, eu poderia criar um índice faixa de pedestre, para medir o quanto os valores democráticos estão enraizados em uma sociedade.
Na Alemanha, por exemplo, não é preciso faixa, embora haja muitas, claro: sobretudo nas cidades menores, muitos motoristas vêem o pedestre na beira da calçada, percebem que ele quer atravessar e param.
Observando isso nos países mais organizados, e o contrário nos mais toscos, sempre me perguntei: será que os brasileiros têm mais pressa, são mais ocupados do que os alemães, ingleses, franceses, japoneses? Óbvio que não. Eles também têm horários, e aliás são mais pontuais do que nós. Apenas já estão subliminarmente incluídas no cálculo do trajeto as paradas nas faixas de pedestre. Talvez eles saiam cinco minutos mais cedo. É um tempo investido no reconhecimento de que o mais forte deve proteger e não atropelar o mais frágil, para que todos vivamos melhor.
O que mais nossos olhos brasileiros não vêem?