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ONU investiga ação do Brasil no Haiti

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Por Marcelo de Moraes
Atualização:

ENVIADO ESPECIAL / PORTO PRÍNCIPE

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A ONU abriu uma investigação para determinar se houve "uso excessivo da força" por parte de uma patrulha brasileira que, na segunda-feira, depois de ter sido apedrejada por universitários, no centro de Porto Príncipe, lançou bombas de gás lacrimogêneo e efetuou disparos com balas de borracha e munição real dentro da Faculdade de Etnologia da Universidade do Haiti.

O episódio - considerado "grave" por David Wimhurst, porta-voz do representante da ONU no Haiti, Edmond Mulet - fez crescer a animosidade dos milhares de manifestantes que, ao longo da semana, marcharam pedindo a renúncia do presidente René Préval e a saída das tropas da Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti (Minustah), lideradas pelo general brasileiro Paul Cruz.

O Estado encontrou no local da ação diversas bombas de gás já deflagradas e um buraco na fachada da faculdade, que, segundo os estudantes, foi provocado por um disparo de fuzil. O Exército diz ter feito apenas "um disparo de advertência para o alto, como prevê a regra de engajamento da ONU", mas Wimhurst disse que "foram três tiros, dois para o alto e um para frente".

Uma menina de 9 anos, que vive em um campo de refugiados na frente da faculdade, estava com uma sutura recente no rosto. De acordo com sua família, o ferimento é resultado de estilhaços de uma das bombas lançadas pela patrulha. Os estudantes dizem ainda que foram agredidos com cassetetes e tiveram seus pertences pessoais confiscados, o que os militares negam.

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As fotos tiradas no local foram mostradas ao comandante do Batalhão Brasileiro 1 (Brabatt 1), coronel Rêgo Barros, que reconheceu as bombas de gás lacrimogêneo, mas disse duvidar que uma delas possa ter-se fragmentado, lançando o pedaço de metal que supostamente rasgou o rosto da menina. Já Wimhurst disse que os médicos que atenderam a garota acreditam que o ferimento possa ter sido provocado por uma das balas de borracha.

"Eles invadiram a faculdade lançando bombas, batendo nos meus amigos e atirando. Um dos tiros pegou bem ali", disse Jean Louis Bérnard, apontando para o buraco ao lado de uma das janelas. "Eles tinham uma lista com os nomes de vários estudantes. Meteram a cabeça de alguns na privada e depois saíram levando um preso (Matthiew Frantz Junior, de 25 anos, já liberado)".

A denúncia interferiu no clima da tropa brasileira, habituada a elogios públicos feitos a sua atuação no Haiti desde 2004. "Os brasileiros são soldados excepcionais e fazem um trabalho admirável, realmente incomparável", disse o americano Kevin Kennedy, chefe-adjunto do representante especial do secretário-geral da ONU no Haiti.

Em entrevista ao Estado, dois dias após o incidente, Préval elogiou o apoio dos militares brasileiros na pacificação e na reconstrução do país. "Eles nos acompanham desde o início, ajudaram nas eleições, no terremoto, no combate à guerrilha urbana e na profissionalização da nossa força policial. Sou eternamente grato." Na mesma semana, as tropas brasileiras anunciaram que uma apuração interna - prévia à investigação da ONU - concluiu que não houve excesso.

"Rechaço com veemência essas denúncias. Se isso tudo tivesse acontecido, nos afetaria tremendamente", disse o coronel Rêgo Barros, responsável pelo Brabatt 1. "Disparamos, sim, e a norma nos dá permissão em casos como esse, quando há risco para a tropa ou para terceiros. Também podemos entrar na universidade fazendo o uso escalonado da força. Foi usado material não letal. Fomos corretos."

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Wimhurst, porém, disse não acreditar que o aluno detido "tenha sido tratado como um anjo". O Exército assegura que foi feito exame de corpo de delito no estudante antes de entregá-lo à Polícia Nacional Haitiana (PNH).

Para o porta-voz da Minustah, a conclusão prévia é a de que "os militares brasileiros não deveriam ter entrado na faculdade". Wimhurst disse também que, no início da apuração, os militares disseram que não tinham jogado bombas, mas depois descobriu-se que 32 foram lançadas.

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