Kerry corteja a Europa, seu antigo reduto

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Por ARSHAD MOHAMMED
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Em sua primeira viagem ao exterior como secretário de Estado norte-americano, John Kerry encantou os europeus com sua habilidade para idiomas, as lembranças sobre pedalar por Berlim Oriental quando tinha 12 anos e sua afeição óbvia pela França e a cozinha francesa. O que ficou menos claro é quanta influência o principal diplomata de Washington terá sobre a política externa norte-americana, e se o presidente dos EUA, Barack Obama, permitirá que ele mude alguma coisa importante. "Nós acabamos de terminar um daqueles maravilhosos almoços franceses que vêm atraindo americanos a Paris há séculos", disse Kerry, falando em francês e provocando gargalhadas no início de uma coletiva de imprensa em um salão decorado no Quai d'Orsay. Ainda em francês, ele acrescentou: "Agora vou falar em inglês, ou não poderei voltar para casa". Aristocrata e refinado, o ex-candidato presidencial discorreu com facilidade, e sem gafes, em inglês sobre questões de política externa, das ilhas Malvinas e o programa nuclear do Irã à guerra civil da Síria e a eleição da Itália. Embora a viagem tenha fornecido poucas pistas sobre a extensão da influência de Kerry sobre Obama, analistas observaram sua facilidade com as questões e seu coleguismo com autoridades estrangeiras devido aos 28 anos passados no Comitê de Relações Exteriores do Senado. "Ele é um peso-pesado da política. Conta que tenha sido um candidato presidencial. É claro que no fim é Obama quem decide a principal direção da política norte-americana -- mas foi sempre assim", disse Ruprecht Polenz, chefe do comitê exterior do Bundestag, à Reuters em Berlim. "Os EUA sempre foram uma potência do Atlântico e do Pacífico. Portanto, o medo de que possam se afastar da Europa era e é falso", acrescentou, dizendo ter se encontrado com Kerry diversas vezes na Conferência de Segurança de Munique, um evento anual. "Mas Kerry é alguém que tem um ouvido aberto em particular para os europeus". Saber falar francês foi uma desvantagem para Kerry durante a campanha presidencial de 2004, já que alimentou a imagem de um democrata elitista endinheirado, explorada por seu rival republicano, George W. Bush. Como diplomata, é uma vantagem óbvia. O ministro das Relações Exteriores da França, Laurent Fabius, para não ficar para trás, falou em inglês algumas vezes durante a coletiva de imprensa -- uma ação notável para um ministro francês em Paris. Em Londres, Kerry diplomaticamente evitou aborrecer as autoridades britânicas ao falar novamente sobre a política dos EUA com relação às ilhas Malvinas --chamadas de Falklands pelos britânicos-- e nada disse de importante em público sobre o papel da Grã-Bretanha na União Europeia. "Kerry é um estrategista e protagonista em política externa muito experiente e nada disso é surpresa ou novo para ele, e ele é bem conhecido das principais figuras e círculos de política externa na Europa", disse Stefan Halper, diretor de Estudos Americanos no Departamento de Política e Estudos Internacionais da Universidade de Cambridge. Na Alemanha na terça-feira, Kerry repetiu uma história frequentemente contada de quando viveu lá como o filho de 12 anos de um diplomata dos EUA. Ele usou seu passaporte diplomático para atravessar para Berlim Oriental em sua bicicleta, mas teve um profundo sentimento de mau presságio. "Eu meio que vazei de lá e fui correndo para casa e disse com orgulho aos meus pais o que tinha feito, e fui prontamente para o chão e tive meu passaporte tomado", disse ele, novamente arrancando risos. (Reportagem de Guy Faulconbridge em Londres; Alexandria Sage em Paris e Andreas Rinke em Berlim)

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